18/09/2018
Notícia publicada pelo portal D24AM
O último sábado (15) marcou dez anos de um momento crucial
para a economia global: a quebra do banco Lehman Brothers, considerada
o início social
da crise originada na farra de nanciamentos
imobiliários
nos EUA, que, num efeito dominó, derrubou mercados de todo o mundo.
Por aqui, o tsunami foi apelidado de ‘marolinha’ pelo governo da época,
após medidas de estímulo terem amenizado a recessão. No entanto, uma
década mais tarde, enquanto o mundo surfa uma onda positiva, o Brasil
ainda luta para se livrar de uma das maiores crises de sua história. E a
gênese dessa troca de papéis pode estar precisamente no remédio
aplicado pelo País em 2008.
O problema, segundo economistas ouvidos pelo Estado, reside menos nas
medidas tomadas há dez anos – liberação de dinheiro de bancos públicos,
cortes de impostos e incentivo ao consumo -, mas na insistência em aplicar
o mesmo remédio sempre que a economia deu sinais de desaquecimento
desde então. “Quando o Brasil voltou a apresentar problemas, no início do
governo Dilma Rousse,
a equipe econômica dobrou a aposta. E repetiu o
que foi feito em 2008 e 2009, mas numa situação fiscal
totalmente
diferente”, diz Samuel Pessôa, economista do Ibre/FGV.
Em outras palavras: a política econômica virou um ‘samba de uma nota só’,
levada no batuque da intervenção estatal. A crise de 2008 ajudou a
justificar
essa fórmula de expansão, pois vários mercados maduros, EUA à
frente, endureceram a regulação e injetaram dinheiro na economia,
lembra o economista-chefe do Itaú Unibanco, Mário Mesquita. “A crise de
2008 foi, de certa forma, equivalente à queda do Muro de Berlim. Se a
queda do muro provou que o socialismo real tinha falido, a crise financeira
validou, para pessoas de um certo viés ideológico, que o neoliberalismo
teria falido”, compara.
A turbulência no mundo desenvolvido foi o pretexto para pôr em prática
uma posição que era latente no governo Lula desde 2006 – como indicou a
escolha de Guido Mantega para substituir Antonio Palocci no Ministério da
Fazenda. Do ponto de vista intelectual, a disposição do PT em fazer do
Estado o motor central da economia e o fato de a crise ter sido originada
na frouxa regulação bancária lá fora juntaram a “fome com a vontade
comer”, na visão de Simão Silber, professor da FEA/USP.
O governo, porém, não comprou sozinho a tese de que a intervenção era
necessária, arma
Sérgio Lazzarini, professor do Insper e autor do livro
Capitalismo de Laços. “Virou uma cartilha de ação estatal, de apoio e de
promoção”, lembra. “Na época eu lembro de conversar com empresários
que diziam: ‘É isso mesmo, esse é o nosso modelo’. E perguntavam: ‘você quer ser igual aos Estados Unidos’?”. As informações são do jornal O
Estado de S. Paulo.
Aposta
A longa aposta do Brasil na intervenção estatal para fomentar o
crescimento foi a opção oposta à adotada por nações desenvolvidas. Os
EUA, por exemplo, injetaram bilhões em bancos e empresas combalidas,
incluindo a montadora GM, mas os subsídios foram retirados aos poucos.
Para economistas, os números brasileiros mostram que a estratégia local
foi equivocada. A retração da economia em 2015 e 2016 foi tão forte que o
efeito no Produto Interno Bruto (PIB) per capita só deve ser compensado
em 2023, nas contas do economista Simão Silber, da FEA/USP.
O economista Samuel Pessôa, do Ibre/FGV, diz que, após a euforia da alta
de 7,5% do PIB em 2010, que pôs o Brasil como exemplo de prosperidade
na capa da revista The Economist, a desaceleração que começou em 2011
foi vista como um mal a ser combatido com todas as armas: “Reproduziu se,
então, o diagnóstico (para os problemas da economia), apesar de o
remédio já ter sido exagerado mesmo em 2009”, diz Pessôa. Para definir
a
insistência no receituário, Silber recorre a um conceito atribuído a Albert
Einstein: “Loucura é continuar fazendo a mesma coisa e esperar resultados
diferentes”.
No governo Dilma, o encadeamento das decisões do governo se encaixa
em um padrão que o economista-chefe do Itaú Unibanco, Mário Mesquita,
classica
de moto perpetuo. Silber diz que essa narrativa começa a ficar
mais clara a partir de agosto de 2011, quando há uma ‘limpeza’ no Banco
Central que abre caminho para uma série de intervenções do governo.
A partir daí, foram várias as medidas contraditórias, aponta Pessôa: queda
de juros em cenário de inação
em alta, congelamento de preços do
petróleo e corte nas tarifas de energia elétrica por canetada, ampliação das
desonerações a setores específicos
e do papel do Banco Nacional do
Desenvolvimento Econômico Social (BNDES) no financiamento
a grandes
empresas. “Até se insistiu na criação da indústria naval, que é algo caro e já
tinha dado errado nos anos 1950, com JK, e nos anos 1970, com (Ernesto)
Geisel”, diz o professor do Ibre/FGV.
À medida que o governo ampliou gastos, a situação scal
se deteriorava e
a economia reagiu muito pouco. Um ‘motim’ entre os funcionários do
Tesouro Nacional, noticiado pelo Estado à época, denunciou a prática das
pedaladas fiscais
– que consistia no adiamento de pagamentos que o
governo deveria fazer a bancos e também a órgãos como o INSS.
Futuro depende de medidas austeras, dizem analistas
Apesar dos efeitos catastróficos
para a economia – que se reetiram
no
maior período de retração econômica do País em 120 anos -, os
economistas concordam que o atual debate eleitoral não reete
uma
consolidação em direção a medidas mais austeras na economia, com corte
de gastos e reformas.
A explicação para essa resistência pode ser histórica, na opinião de
Mesquita, do Itaú Unibanco, pois o brasileiro está acostumado a ver o
governo como provedor. “A ideologia (da intervenção) não é nova. Começa
na década de 1930 do século passado, com (Getúlio) Vargas, continua com
Juscelino Kubitschek e com os militares”, disse o economista. “A ideia de
crescimento liderado pelo Estado têm seus adeptos à esquerda e à direita
do espectro político”.
Silber, da USP, alerta, no entanto, que a mudança na trajetória dos gastos
públicos é urgente. O direcionamento que foi apenas esboçado pela
administração Michel Temer, segundo ele, precisa ser implementado – e
rapidamente – pelo próximo governo.
Agoniada economia mundial teve início ainda em 2007
2007-março
Temor em relação ao subprime, setor do mercado hipotecário destinado
aos mutuários com histórico de calotes, faz o índice Dow Jones cair 2%, no
dia 13.
Agosto
Com a crise no mercado imobiliário dos Estados Unidos, o banco Lehman
Brothers fecha a divisão de hipotecas de alto risco.
Dezembro
O presidente George W. Bush anuncia o plano federal com medidas para
amenizar a crise.
2008 – janeiro
Todos os planos hipotecários do Lehman Brothers são suspensos.
Março
O Bear Steams é comprado pelo JP Morgan, com a ajuda do governo
americano.
Maio
Corte de 5% do pessoal do Lehman.
Junho
O banco divulga prejuízo de US$ 3 bilhões, referente ao segundo trimestre
scal
e informa que vai levantar US$ 6 bilhões em capital.
Setembro – dia 2
Rumores de negociações para compra de 25% do Lehman pelo banco
coreano KDB.
Setembro – dia 7
O Tesouro dos EUA anunciou a intervenção federal em duas das maiores
empresas do setor hipotecário local (Freddie Mac e Fannie Mac).
Setembro – dia 12
Início de reunião para tentar salvar o Lehman.
Setembro – dia 14
Banco pede concordata. O Merril Lynch aceitou a oferta de compra do
Bank Of America de, aproximadamente, US$ 50 milhões.
Setembro – dia 15
Pedido de concordata do Lehman provocou estragos nos mercados com quedas nas bolsas. O FED injetou mais US$ 50 bilhões no mercado para tentar ameniza o pânico geral.