17/05/2023
Por Pedro Câmara Junior **
Tem sido comum o comentário entre empresários, a respeito da insegurança oriunda de decisões judiciais, que modificaram entendimentos até então consolidados sobre padrões tributários.
Somente neste ano, podemos citar três casos concretos, que permitiram essa reflexão:
01) A definição do Supremo Tribunal Federal – STF sobre os efeitos da coisa julgada tributária;
02) O entendimento do STF sobre o aumento das alíquotas de PIS e COFINS aplicáveis às
receitas financeiras, ocorrido entre o final e o início dos mandatos do Executivo federal; e
03) A tributação de incentivos fiscais estaduais pelo IRPJ e pela CSLL, por decisão definitiva do Superior Tribunal de Justiça – STJ.
Em todos os casos citados, as respectivas Cortes flexibilizaram suas próprias decisões para acatar teses que favoreceram a Fazenda Pública Federal, em detrimento dos contribuintes, alcançando montas bilionárias que deverão ingressar nos cofres públicos, a partir de fiscalizações e cobranças administrativas e/ou judiciais.
Para se compreender a evolução rápida que tais julgamentos alcançam, bastou o STJ firmar o entendimento sobre a tributação dos incentivos estaduais (exemplo 03, acima), para que a Receita Federal do Brasil, através de mensagens eletrônicas aos grandes contribuintes (E-CAC), sugerisse a revisão dos lançamentos que englobam tais incentivos, bem como a apuração e o recolhimento da diferença devida, sob pena do contribuinte sofrer, em sequência, uma fiscalização com este teor (ao passar por uma fiscalização, qualquer iniciativa da empresa perde a espontaneidade e a submete aos encargos e penalidades que a Lei estabelece).
Essa sugestão/ cobrança somente é possível porque, quando o STF julga temas incluídos na rubrica “repercussão geral”, e o STJ define teses qualificadas como “recursos repetitivos” (como foi o caso), todos os processos judiciais e administrativos (federais) em curso, que alcancem os mesmos temas, deverão seguir a orientação das mencionadas Cortes.
No passado, grande parte dos resultados judiciais, de ordem tributária, foram a favor dos contribuintes.
Basta citar a “Tese do Século”, por meio da qual o STF decidiu que o ICMS destacado em Nota Fiscal não compõe a base de cálculo das contribuições do PIS e da COFINS, criando um contingenciamento multibilionário ao Executivo Federal (isto é, permitindo que contribuintes, de todo o Brasil, buscassem a recuperação do que pagaram a maior, com base no julgamento conferido).
Qual seria, então, o motivo para o Judiciário mudar seus posicionamentos e passar a proteger mais a Fazenda Federal?
Todas as teses tributárias, reconhecidas pelo Judiciário, foram legítimas, afastando ilegalidades observadas nos textos legais ou em normativas administrativas.
Ocorre que, no Direito, temos o que se chama de “dialética”, termo que alcança as noções de debate, diálogo e discussão, empregados com a finalidade de ser alcançada uma conclusão. Ou seja, o confronto entre pontos de vista, solucionado com a formação da maioria de adeptos sobre uma tese. Isso é da essência do Direito e até mesmo da democracia. Estranho seria se não fosse.
Mas assim como as religiões, o Direito é conduzido por homens (na noção de seres humanos imperfeitos), influenciados não apenas por suas crenças estabelecidas, como pela conveniência do momento.
As Cortes Judiciais Superiores são órgãos políticos, formadas por indicados políticos, que podem usar do pragmatismo a respeito daquilo que melhor atender às necessidades de quem comanda o país.
Então, corremos o risco de só prevalecer a conveniência pública entre os Poderes?
De tempos em tempos, é possível que essa resposta seja positiva.
Na atualidade, temos um governo federal que não esconde sua necessidade arrecadatória, seja pelo alegado déficit de receitas, seja pelas políticas públicas que pretende implementar, demandando novos recursos.
Estaria, então, o Judiciário contribuindo aos intentos do Executivo, compensando-lhe, inclusive, de todos os ônus criados com teses que favoreceram os contribuintes?
Sim, é possível.
O fato é que não se pode abdicar do Direito. Ao sinal de ilegalidades ou abusos que compreendam a arrecadação dos entes federativos, é necessário movimentar as discussões sobre os respectivos temas, como alerta de que a sociedade clama pelo exercício efetivo das funções do Poder Judiciário, o que remonta ao verdadeiro senso de justiça, à fundamentação condizente com os preceitos legais, bem como à compreensão do quanto é difícil ser empresário nesse país.
Não há fim à função do advogado tributarista, tampouco à resistência que o mesmo deve exercer diante dos excessos do Poder Público. Talvez tenhamos que nos adaptar às condições do momento, sendo também pragmáticos, recomendando em demasia aos clientes que a segurança jurídica parta de suas próprias atitudes, a exemplo da garantia financeira dos valores envolvidos em cada processo (depósitos judiciais).
Nem todos os empresários conseguirão, acabando por sucumbir à mão pesada do Leão, optando por parcelamentos ou programas de recuperação fiscal.
Mas àqueles que tiverem a condição de resistir, cabe-nos convencê-los de que o poder é passageiro, assim como os cargos políticos e os efeitos (inclusive nefastos) que deles derivam.
** Pedro Câmara Junior – Graduado em Direito pela Universidade Federal do Amazonas – UFAM; pós-graduado em Direito Civil também pela UFAM; pós-graduado em Direito Tributário pela Fundação Getúlio Vargas; Aluno do MBA da Fundação Dom Cabral, Campus Aloysio Faria (Nova Lima – MG); pós-graduado em Inovação pela NOVA School of Business and Economics (Portugal); Certificado pelo Instituto Brasileiro de Governança Corporativa – IBGC no curso de Formação de Conselheiros de Administração de empresas. Advogado atuante nas áreas de Direito Societário, Tributário e Administrativo