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Coluna do CIEAM

O ministro e os alertas do desenvolvimento

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26/11/2014 16:49

A nomeação do senador Armando Monteiro foi saudada efusivamente por lideranças locais, que resgataram sua trajetória de empreendedor e dirigente da entidade maior do setor produtivo, a Confederação Nacional da Agricultura, e suas pontuais manifestações em defesa da Zona Franca de Manaus. É esperado, portanto, que os atores locais tenham mais facilidade e liberdade em debater os gargalos e descasos crônicos do modelo, o esvaziamento da Suframa, a questão do plano de cargos e salários dos servidores, e outras dificuldades conjunturais e estruturais da Zona Franca + 50 anos. É provável que haja mais espaço na agenda da prosa, entretanto, a rigor, não é a falta de prosa a raiz ou a essência dos impasses da economia local/regional. É preciso, tudo indica, deixar bem claro para onde queremos e podemos ir, quais os embaraços dessa empreitada e de que armas dispomos para levar a batalha ao êxito. Caso contrário, corremos o risco de transferir aos outros a solução de nossos enigmas e esperar deles a bússola que vai nortear o rumo de novas trilhas. Nessa sabatina, que já sabemos de cor e salteado, sem medo de errar, iremos a lugar algum. Em sua obra clássica e referencial, “A Grande Crise”, o historiógrafo Antônio Loureiro reporta as lições da adversidade representada pelas causas do debacle da economia gomífera, ao descrever os segmentos que se beneficiaram historicamente com a comercialização da borracha, sem qualquer empenho em planejar suas aplicações e desdobramentos por parte do aparelho estatal, que arrecadava 25% de impostos. Quanto aos exportadores, que compravam a borracha dos aviadores (os intermediários) para revendê-la no mercado exterior; e os intermediários, especuladores das bolsas de Nova York e Londres, foram outros os resultados. Esses lucros reverteram em benefício de outras regiões brasileiras, ampararam a produção cafeeira do Sudeste e serviram para desenvolver as empresas de plantação asiática. Nesse contexto, é injusto e insensato crucificar o mercenário inglês Henry Wickham, pelo sequestro das sementes, razão formal e aparente da decadência do Ciclo da Borracha e da consequente crise em que entraram os Estados da região. Wickham foi uma nuvem passageira que, entretanto, serviu para camuflar a inépcia dos gestores do esplendor. Deu no que deu.

A indústria do conhecimento


É importante destacar que, além da hevea brasiliensis, os viajantes europeus e suas expedições ditas científicas levaram cacau, milho, batata, tabaco, abacaxi, caju, goiaba, maracujá, mandioca, macaxeira, açaí, guaraná, pupunha, além de quinino, cinchona, ipeca, jaborandi, capim-santo... Muitas dessas espécies voltaram em forma de alimentos e medicamentos beneficiados, com agregação de valor, pela indústria estrangeira. E a dedução destes fatos não poderia ser mais eloquente. Quem mais plantou mais colheu na semeadura da inovação, da qualificação tecnológica, da profissionalização de pessoas e processos, na industrialização do conhecimento e da visão de longo prazo. Por outro lado, importamos para a Amazônia brasileira e países da América tropical, grande variedade de produtos da Ásia e da África, tais como manga, jaca, café, arroz, cana-de-açúcar, banana, entre outros, geradores de economia em escala e commodities lucrativas do agronegócio. O que importa, nessa reciprocidade de biodiversidade, é identificar quem fez o dever de casa e agregou inovação e valor a esses produtos, o investimento em inovação e desenvolvimento, que este ou aquele país ou cultura aplicou em cada um desses itens do bioma natural. É importante revisitar alguns lugares comuns da história da agro e da bioindústria para trazer à luz acertos e negligências, atitudes proativas ou condutas de indiferença e omissão. É neste contexto que fica mais coerente e procedente refletir a economia do látex e a história do desenvolvimento da Amazônia.

Lógica da alienação


É preciso, pois, desfocar a questão que acompanha apogeu e decadência nos diversos ciclos econômicos, desde as ervas do sertão ao modelo vigente da economia regional representado pela Zona Franca de Manaus, segundo a qual o herói ou o vilão desta tragédia são os outros. Chegou a hora de perguntar, no estreito limite do quintal de nossa individualidade, por que protelamos a curiosidade fecunda acerca das causas estruturais e dos fatores explicativos de nossos fracassos. Não soa ridículo, por exemplo, seguir esperando que um burocrata da Casa Civil do governo federal transforme em édito real a definição do modelo de gestão do Centro de Biotecnologia da Amazônia? Ninguém aqui está propondo o paradigma da invasão, tão em voga para ocupar o espaço que os invasores justificam como seus, na lógica natural da propriedade pré-capitalista. A lógica da dominação federal, fator de oportunismo e controle estratégico e da hegemonia política que a questão esconde, é, sejamos francos, credenciada e referenciada pela inércia dos atores locais. Ou seja, o silêncio obsequioso, a começar pelos efetivos patrocinadores da iniciativa, as empresas que recolheram as taxas da Suframa, autoriza essa anomia ou anomalia institucionalizada. Ou damos um passo à frente na direção de transformar esse ciclo de ovo depois a galinha e depois o ovo, eternamente, num omelete de virada, ou, como disse um leitor atento dessa novela, passamos, doravante, a motivos de piada pelo reconhecimento público da insignificância dessa ladainha.

Matrizes esquecidas


Nunes Pereira (1892-1985) cafuzo, descendente de índios, negros e brancos, era um visionário maranhense que viveu maior parte de sua vida no Amazonas. Além de poeta e escritor, era um veterinário que estudou a fauna amazônica como poucos. Sua obra mais conhecida, Moronguetá - um Decameron indígena – é um conjunto monumental de pesquisas, e interlocução com cientistas sociais respeitados como Roger Bastide e Claude Lévi-Strauss. Em 1922, para celebrar 100 anos da Independência do Brasil, na ótica amazônica, escreveu sobre a vocação agropastoril das várzeas da hidrografia regional. Ele inaugurou um conjunto de iniciativas, reflexões, debates, estudos e teses que influenciaram fortemente os grandes pensadores e empreendedores da região. Os estudos biológicos, notadamente sobre aquicultura, a potencialidade agrícola das várzeas, as pesquisas etnográficas, de geografia humana, social, econômica e cultural do imenso Vale Amazônico, foram deixados de lado pelos pesquisadores atuais. A pesquisa padece de verba e integração com o desenvolvimento e serviço a comunidade. Hoje é mais importante subir na carreira acadêmica do que provocar a opinião pública em torno dos novos caminhos, que esta região oferece para adensar, diversificar e regionalizar as matrizes econômicos e os acertos desta indústria sem chaminé da Zona Franca de Manaus. Voltaremos...
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Esta Coluna é publicada às quartas, quintas e sextas-feiras, de responsabilidade do CIEAM. Editor responsável: Alfredo MR Lopes. cieam@cieam.com.br

Publicado no Jornal do Commercio do dia 27.11.2014

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