18/08/2017 08:28
Entrevista
com Wilson Périco, presidente do Centro da Indústria do Estado do Amazonas
São frequentes os ataques à economia da Zona Franca de Manaus. Enquanto o país é assaltado por agentes públicos que se aliam as forças da contravenção explícita. A região mais rica do país, o Sudeste, consome bem mais da metade da renúncia fiscal, enquanto a mais pobre, o Norte, 2/3 do território brasileiro, é atacada por usufruir 13% dos incentivos. Lá existem pelo menos três Zonas Francas que tem isenções extraordinárias quando vendem insumos para o Amazonas. Não somos, portanto, o problema do Brasil, mas temos como ajudar o Brasil a construir uma nova economia, se soubermos escolher políticos que, decididamente, saibam representar os interesses da brasilidade. Estes são os alertas desta entrevista com o cidadão do Amazonas, Wilson Périco.
1. FOLLOW-UP: Na sua opinião, quais as razões dessa reincidente acusação de que a Zona Franca de Manaus é responsável, em grande parte, pelo rombo fiscal do Brasil?
Wilson Périco: isso não passa de uma grande balela, aquilo que os caipiras mineiros chamam de conversa pra boi dormir. Renúncia fiscal é um instrumento usado desde sempre para estimular crescimento regional ou setorial. No caso do Amazonas e da Amazônia, trata-se de um motor de redução das desigualdades deste país desigual. Como não reconhecer a importância dos incentivos fiscais para o florescimento da indústria automobilística e a construção de infraestrutura e a geração de empregos a partir da era JK, nos anos 50, em São Paulo?
2. FUP: Neste processo de desenvolvimento regional, além da infraestrutura o que você considera fundamental?
WP: Promover o crescimento, há séculos, supõe investimento em tecnologia e inovação. A China, que deve crescer 7% este ano, investe 2% de seu PIB, que é de US$ 11,2 trilhões, em incentivos de P&D; o Japão 3% e a Coreia do Sul 4%. O Brasil, que não vai crescer 1%, investe menos de 1%, com os cortes deste ano. O despertar dos chamados tigres asiáticos se deu a partir do conhecimento científico e inovação tecnológica. A Samsung investe bilhões em inovação, daí seu desempenho.
3. FUP: Por que em São Paulo a economia do café desembarcou em desenvolvimento e na Amazônia o Ciclo da Borracha, a despeito dos investimentos bilionários de Henry Ford desembarcou em nada?
WP: A equação tem sido esta. Incentivos fiscais e P&D, pesquisa e desenvolvimento. Assim floresceu o Vale do Silício. São Paulo despertou para isto quando soube usar os dividendos do café. Os dividendos da borracha foram confiscados pelo Brasil para sustentar o Brasil e com a derrocada do látex, os investimentos amazônicos desembarcaram em São Paulo. Esse confisco continua. Um estado como o Amazonas, que tem deficiências de infraestrutura e está distante do mercado consumidor é obrigado a recolher mais de 50% da riqueza que produz para os cofres federais. Justamente a verba que deveria reduzir a pobreza da região.
4. FUP: E por que, em vez de integrar, por que persiste essa perseguição permanente contra a ZFM?
WP: São grupos isolados que fomentam esse conflito. O governo paulista, à parte as rusgas circunstanciais, tem sido um bom parceiro. Afinal, existe uma ZFSP, uma Zona Franca em São Paulo, onde tem um parque industrial, três vezes o tamanho da ZFM, para atender o polo industrial de Manaus com insumos. É evidente que estamos diante de um desequilíbrio socioeconômico nacional com os 40% da riqueza do Brasil que São Paulo detém. Ali estão 30% dos estabelecimentos industriais enquanto o Amazonas tem apenas 0,6%. Eles consomem mais da metade da renúncia fiscal brasileira.
5. FUP: Quais os principais gargalos para o florescimento da indústria do Amazonas?
WP: Transformado em exportador líquido de recursos o Amazonas não retém o dinheiro para construir porto público, logística de transportes, comunicação de qualidade e energia barata. Nesta semana a empresa de energia foi condenada a devolver R$ 2,9 bilhões cobrados indevidamente. No nosso calcanhar moram os burocratas de Brasília alinhados com os interesses do Sul e do Sudeste que boicotam a liberação do processo produtivo básico, o PPB – uma licença inventada para autorizar ou engavetar a permissão de novos produtos do polo industrial de Manaus.
6. FUP: E o que acontece com as verbas de P&D pagas pela indústria de Informática de Manaus?
WP: Veja só: segundo a Lei 8.248/91, alterada pela Lei 10.176/01, empresas de informática que recebem incentivos fiscais deverão efetuar depósitos trimestrais no Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico – FNDCT. Nos últimos 5 anos foram depositados R$ 2,3 bilhões, que seriam distribuídos para os diversos fundos setoriais. Quem recebeu a maior parte desta grana foram os fundos CT Infra e CTinfo, os fundos de ciência e tecnologia, destinados a empresas nacionais a desenvolverem e produzirem bens e serviços de infraestrutura e de informática e automação, para atividades de pesquisas científicas e tecnológicas, fica no Sudeste, predominantemente em São Paulo. Isso está escrito no portal do MCTI/FINEP. Não vem há 5 anos um centavo para o CT AMAZÔNIA. Sem P&D ninguém agrega valor na indústria.
7. FUP: Houve um silêncio de aparente concordância com a convalidação dos incentivos. Por que só o CIEAM apontou as sequelas do problema?
WP: Nós já vínhamos apontando esse descaso com o Amazonas. Apenas o Deputado Pauderney votou contra a LC 160. Tive oportunidade de dizer ao presidente Temer, junto com o presidente Antônio Silva e outras lideranças do Amazonas, que não somos o problema do Brasil e sim parte das soluções dos problemas do país. O que não pode é seguir confiscando. Ele está pagando o FIES com os recursos da Região Norte, nossas reservas constitucionais de Segurança. Ele assinou o Acordo de Paris com a moeda Amazônia. São Paulo tem 60% de sua energia doméstica de nossas barragens e os seus reservatórios hídricos são abastecidos pela evaporação de nossos rios. Sabe que vantagem Maria leva? Essa convalidação é ampliação da insegurança jurídica. Vai reduzir mais a oferta de empregos. Não estou advogando o lado do investidor. Estou falando de desemprego e as consequências sociais, familiares, emocionais dessas medidas. Estou alertando sobre aquilo que todos nossos representantes deveriam fazer. Eles não representam a eles mesmos ou interesses político-partidários, representam o cidadão que lhes paga os salários.
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Esta Coluna é publicada às quartas, quintas e sextas-feiras, de responsabilidade do CIEAM. Editor responsável: Alfredo MR Lopes. cieam@cieam.com.br
Publicada no Jornal do Commercio do dia 18.08.2017