29/01/2025 08:08
André Ricardo Costa
Doutor em Administração pela USP e professor da Ufam
A ciência pode ser uma mina de ouro a quem dela se põe a usufruir. Literalmente, quem descobre uma mina não sai falando por aí. Mas a necessidade de validação por pares faz com que os achados científicos, em regra, sejam trabalhados em sentido contrário, o da intensa divulgação. Lembra de relato de financistas pesquisadores Gur Huberman e Tomer Regev, publicado em 2002 no The Journal of Finance, de uma empresa de biotecnologia que publicou na literatura especializada suas descobertas para tratamento de câncer, mas somente cinco meses depois os investidores se tocaram, quando o New York Times gritou a novidade em reportagem de capa, e as ações quadruplicaram em um dia.
Qualquer que seja a mina de ouro na economia amazonense, vários gritos têm sido necessários para que sejam transpostos os obstáculos à geração de valor na nossa região, principalmente os derivados das últimas secas. Assim foi para a contratação emergencial da dragagem em 2023. Em 2024, estabelecimento das estruturas provisórias em Itacoatiara e a contatação, por quase R$ 100 milhões, da dragagem capaz de manter o calado a 12,80m.
Com a surpresa de 2023, o custo adicional direto foi de R$ 1,4 bilhões. Em 2024 as estruturas provisórias permitiram que o custo fosse quase o mesmo, de R$ 1,5 bilhões, despeito o dólar mais caro e, principalmente, o tempo de estiagem ter sido quase o dobro. Não fossem essas soluções, o custo teria sido de R$ 2,9 bilhões. Isso à parte do custo financeiro de aproximadamente R$ 800 milhões por antecipação da compra de insumos.
Este ano, no mínimo, o acréscimo de estocagem deve se repetir. Os demais gastos somente não ocorreriam na hipótese remota de uma cheia relevante, que desse segurança do calado mínimo ao longo da estiagem. Hipótese ainda mais remota é que a dragagem traga segurança de dispensar as soluções portuárias em Itacoatiara. E para os demais anos? O novo normal implicará na repetição desses gastos ad aeternum, em prejuízo à competitividade da nossa economia, ou será providenciada uma solução definitiva?
A solução definitiva só virá se o país perceber e interpretar adequadamente a economia da Amazônia Ocidental como uma fonte de ouro pela qual vale a pena lutar e lapidar. É preciso deixar claro que a Zona Franca de Manaus nunca se pretendeu suficiente para anular as assimetrias entre a Amazônia Ocidental e o restante do Brasil. O mínimo necessário é otimizar o ambiente regulatório e logístico da ZFM. Os R$ 25 bilhões anuais que o Amazonas arrecada em tributos federais poderiam ser bem maiores não fossem gargalos que aguardam soluções do governo federal.
Segundo o climatologista Renato Senna, do INPA, provavelmente nossa bacia sofre pelo ápice do ciclo de aquecimento do Atlântico Tropical Norte, que costuma durar 50 anos, faltando mais cerca de 30 anos para acabar. Não é algo pontual que permita a inação, nem algo eterno que nada dê jeito.
Se quiser uma solução definitiva para usufruir ao máximo do valor da Amazônia resolvendo o gargalo que nos aflige durante a Seca, o governo federal precisará ouvir os cientistas locais. Eles são valiosos, abundantes e diversos, com contribuições na meteorologia, climatologia, hidrologia, geologia, engenharia etc. Estão em permanente prontidão para prestar as informações, construir novas, e trabalhar em cooperação pelas melhores soluções.
Fonte: Capital Amazônico