23/07/2025 09:10
Por Augusto Cesar Barreto Rocha
Foi anunciada a intenção de asfaltar o trecho do meio da BR-319. Ao invés de celebrar, fico me perguntando: qual será o próximo entrave?
Uma intenção de infraestrutura na Amazônia demora muito para ser transformada em prática. Vivemos um uma espécie de armadilha do tempo, onde as coisas parecem mudar, mas permanecem as mesmas ou quando avançam, logo retorna para onde estavam, sem avanços. Os discursos variam entre anúncios de intenção de execução para a decisão de parada nas obras, em diferentes graus. Ora, há discurso para fazer, ora para não fazer. O que não muda: o não fazer nada no aumento do Estoque de Infraestrutura no Amazonas e na Amazônia.
As proteções ambientais, que são uma de nossas fortalezas, são colocadas como vilões. Muito longe de serem problemas, as proteções ambientais são uma necessidade. Entender qual é realmente a restrição para cada tipo de obra pública na Amazônia brasileira seria um achado importante. A hierarquização de obras no país segue, historicamente, fatores associados com muita política e a tecnicidade é adotada para favorecer as cadeias econômicas do presente ou donos de poder econômico, ao invés de induzir transformações.
Foi anunciada a intenção de asfaltar o trecho do meio da BR-319. Ao invés de celebrar, fico me perguntando: qual será o próximo entrave? Ambiental? Orçamentário? Político? Técnico? Jurídico por uma imprecisão na conduta? Uma coisa me parece muito clara: entre a intenção e a ação haverá uma distância gigante. Os projetos que reduzem a desigualdade em qualquer questão do país, por motivos inconfessáveis, serão sempre interrompidos.
A razão deste conservadorismo nas relações de poderes é uma das grandes barreiras para a transformação da Amazônia. Já poderíamos ser um país com uma desigualdade muito menor, mas geramos armadilhas para nós mesmos. Se as pautas de desenvolvimento das chamadas “condições de fatores” fossem prioridades, ano após ano teríamos um país muito melhor. A questão é que temos um baixo investimento associado com a redução das desigualdades. Com isso, as potencialidades que são priorizadas estão sempre conectadas com o passado e cadeias extrativista, salvo pequenas exceções.
Por isso é difícil, muito difícil acreditar que conseguiremos salvar a legislação ambiental, ao mesmo tempo que parece pouco plausível que seja possível orçar e fazer todas as proteções que a BR-319 requer. Ao contrário do que pode parecer para muitos, há nos moradores da Amazônia um grande interesse pela preservação, mas as vozes mais ecoadas no país são aquelas da exploração e da retirada de recursos. Temos muita dificuldade de dialogar com as regiões remotas e com os mais pobres do país, seja diretamente ou com representantes. O protagonismo e a decisão ficam sempre com alguém de uma região rica, sem a compreensão real dos problemas e soluções.
Seguiremos assim neste novo arranjo? Difícil ter certeza. A expectativa é sempre a melhor possível, mas a realidade negativa sempre se impõe quando deliberamos sobre infraestrutura, segurança ambiental ou desenvolvimento humano na Amazônia. Quando daremos importância para a redução da desigualdade? Até aqui, não damos esta importância. A grande preocupação é como manter as estruturas de poder, de economia e de oportunidades para estrangeiros ou grandes fortunas. Ou seja, é difícil acreditar em um asfaltamento responsável da BR-319, por todas as óticas que olhamos. Tomara eu esteja errado.
Artigo publicado no Jornal GGN em 23/07/2025