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'Enfraquece geração de empregos na ZFM', diz Jaime Benchimol

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04/06/2018

Entrevista publicada pelo Em Tempo Online

Da segunda geração de uma família de empresários, o economista Jaime Benchimol, 60, é atualmente o gestor das empresas Bemol e Fogás. Em conversa com o EM TEMPO, ele falou sobre a importância de o Amazonas desenvolver uma atividade que, aos poucos, possa se transformar em uma alternativa à Zona Franca de Manaus em geração de emprego e renda.

Formado pela Universidade de Miami (EUA), o também ex-professor da Universidade do Amazonas acredita que é preciso rever o que chamou de “preservação radical do meio ambiente” no Estado, a fim de abrir espaço para o maior desenvolvimento do extrativismo, piscicultura, agricultura, mineração e turismo.

EM TEMPO – Como o senhor analisa o atual processo econômico do Amazonas? Jaime Benchimol – A Zona Franca criou um grande ciclo de prosperidade no Amazonas nos últimos 50 anos, e quase todos nós que vivíamos em Manaus tivemos muitas oportunidades para crescer. Nossa família e nossas empresas foram beneficiárias desse processo. Como amazonenses, devemos ser muito gratos ao Brasil por ter nos contemplado com as vantagens da ZFM a despeito de estarmos isolados, do ponto de vista de infraestrutura, pela falta de estradas e de instalações portuárias de qualidade. Contudo, durante cinco décadas, nos limitamos a usufruir das vantagens fiscais da Zona Franca, sem buscar novas alternativas econômicas. Pior ainda, gradualmente abandonamos outras atividades que tínhamos antes de 1967, como juta e malva, castanha, borracha, sorva, madeira, óleos essenciais, pesca e peixes ornamentais, couros e peles, e outros produtos extrativistas que eram, inclusive, beneficiados e industrializados no Amazonas. Aos poucos essas atividades foram se tornando pouco atraentes e com elevado grau de risco em razão das restrições ambientais. Gosto de citar o fato de que em 1960 cerca de 10% da população economicamente ativa trabalhava na indústria, e hoje esse número é de cerca de 7%. Embora a população atual seja 10 vezes maior que naquela época, em termos proporcionais, curiosamente havia mais empregos industriais no passado. Isso não significa dizer que estávamos melhor antes do que agora, mas evidencia que a capacidade de geração de emprego e renda da ZFM atual é limitada e está se enfraquecendo.

EM TEMPO – Foi correto sepultar o extrativismo?

JB – Penso que para que o modelo seja sustentável, devemos compreender as nossas vocações. Turismo, mineração, extrativismo, piscicultura e alguns tipos de agricultura fazem parte dessas vocações para as quais podemos ter vantagens comparativas de longo prazo. Por exemplo, ignorar o potencial de produção de madeira de qualidade e seus derivados no Amazonas parece um erro, assim como não me conformo em recebermos um número tão pequeno de turistas ou de não conseguirmos aprovar atividades de mineração, por questões ambientais. É preciso rever a nossa relação com o meio ambiente, saindo da posição de preservação radical atual para uma que contemple os interesses das futuras gerações e também da geração atual. Nenhuma das atividades mencionadas acima, isoladamente, será capaz de substituir o modelo atual do PIM, que precisa ser conservado com todas as nossas forças, tampouco podemos ignorar o imperativo de mudança e de atualização do modelo atual.

EM TEMPO – O senhor costuma dizer que a bancada do Amazonas foi “heroica”, porque conseguiu manter, a duras penas, o modelo da Zona Franca de Manaus. O senhor acha que esse modelo está desgastado?

JB – Ao contrário do que ouço com frequência, julgo que nossos políticos foram muito competentes em manter o modelo atual em funcionamento e com razoável competitividade para vender para o mercado brasileiro. Se considerarmos que temos uma das menores bancadas no congresso nacional, acho que nos saímos muito bem no cenário político, em parte porque a indústria da ZFM é uma indústria limpa e ajudou o Estado a conservar 98% da floresta intacta, um recorde mundial que está nos custando caro. Sugiro uma meta para preservar 95% da floresta, liberando assim espaço para maior aproveitamento dos recursos naturais. O nosso modelo, além de gerar empregos, tem sido pródigo em gerar impostos estaduais e federais abundantes, o que tem permitido sustentar máquinas públicas infladas e ineficientes que precisam ser revistas. O Estado tem baixa vocação para pesquisa e desenvolvimento tecnológico, pela falta de estrutura educacional e científica. Por isso, as chances do modelo industrial se transformar em um modelo de inovação e alta agregação de valor são pequenas no futuro, na minha opinião.

EM TEMPO – Com uma visível redução na oferta de empregos e na produtividade, a ZFM é aquilo que se esperava ou algo saiu errado?

JB – Essencialmente, ficamos limitados a atrair indústrias que se beneficiam das isenções do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) e do Imposto de Importação (II), deixamos de trabalhar para criar viabilidade para outras atividades industriais e de serviços. Na prática, fizemos muito pouco além do que nos foi concedido pelo Decreto Lei 288, que criou a ZFM. Todos nós, governantes, eleitores, empresários e consumidores, somos responsáveis por essa falta de ação. É imperativo mudar essa postura com urgência, ou seremos condenados a fracassar dentro de cinco a dez anos. Desperdiçamos o período de maior prosperidade econômica e de maior entusiasmo empresarial e agora teremos que fazer mudanças com muito menos recursos. Uma das consequências nefastas do modelo foi o fato de termos perdido a iniciativa de liderar para conduzir o nosso próprio destino.

EM TEMPO – O senhor costuma dizer que as maiores ameaças aos produtos do Polo Industrial de Manaus estão dentro do celular. O que isso significa?

JB – Sim, além dos desafios que mencionei anteriormente, temos o grave desafio da obsolescência tecnológica do nosso parque, com a convergência das tecnologias digitais para dentro do telefone celular. Cerca de 50% da atividade do Polo Industrial de Manaus está concentrada na produção de televisores, aparelhos de som, vídeo games, calculadoras, máquinas fotográficas, computadores, notebooks, tablets, GPS etc. Praticamente todos esses segmentos estão se tornando gradualmente obsoletos e estão migrando para dentro do smartphones. Pergunte-se, por exemplo, quando foi a sua última compra de uma máquina fotográfica ou de um notebook? Mesmo que produzíssemos todos os smartphones vendidos no Brasil (hoje produzimos pouco mais da metade), isso não seria suficiente para compensar a perda das demais indústrias, especialmente porque o valor agregado na era digital está muito mais no software, com os Apps, do que nos hardwares propriamente, e praticamente não produzimos softwares aqui.

EM TEMPO – Até hoje, volta e meia, nossos políticos têm que ir a Brasília para “salvar a Zona Franca”. Não está na hora de procurar outra saída econômica para o Estado?

JB – Penso que todas as vezes que tivermos que ir a Brasília para buscarmos uma solução para nossos problemas, há algo de errado. O que precisamos é encontrar nossas próprias soluções aqui mesmo, dentro das alternativas mencionadas e melhorando o ambiente empresarial. Entretanto, temos que continuar lutando para preservar o modelo ZFM atual, que gera vendas de mais de US$25 bilhões e não temos substitutos para ele nos próximos dez anos.

EM TEMPO – Que saídas seriam essas?

JB – Além das alternativas mencionadas, vale estudar países como Cingapura, que foi criado apenas em 1965, dois anos antes da ZFM, e que nesse período se tornou um país de primeiro mundo, partindo de uma base de poucos recursos. Nosso clima e vegetação são parecidos com o de Cingapura. Nesses pouco mais de 50 anos, eles fizeram o porto mais eficiente do mundo, criaram excelentes instituições e uma estrutura governamental eficaz, que atraiu investimentos estrangeiros, construíram um dos melhores jardins botânicos do mundo, aquário, orquidário, zoológico, parques temáticos, cassinos e outras atrações turísticas. Levaram a sério a educação bilíngue e a necessidade de uma cultura de disciplina, estudo e trabalho para obter sucesso. Estudar esse modelo, que abraçou o capitalismo e a livre iniciativa como ponto de partida, seria um bom começo para reposicionarmos estrategicamente o Amazonas.

EM TEMPO – O senhor assumiu a empresa de sua família com quatro lojas em Manaus. Hoje, são quantas e quantos colaboradores?

JB - Sou parte da segunda geração da família empresarial Bemol-Fogás, cujos fundadores, meu pai Samuel e meus tios Israel e Saul, nos deixaram um excepcional legado através de empresas com marcas bem posicionadas e valores empresariais preciosos, como integridade, respeito, energia, economia e melhoria contínua. Com a dedicação e ajuda dos nossos sócios, diretores e mais de 3.300 colaboradores conseguimos multiplicar o número de lojas e de clientes e nos posicionar como a maior arrecadadora de impostos no ramo comercial no Amazonas por 20 anos consecutivos. Na Bemol, temos 21 lojas em quatro Estados e na Fogás temos hoje mais de 1.300 revendedores em seis Estados da Amazônia. Ficamos felizes em demonstrar que mesmo em um país com tantos impostos e excesso de leis e normas, é possível prosperar; cumprindo com nossas obrigações com a sociedade.

EM TEMPO – Vez por outra o senhor é convidado para entrar na política. Que resposta vem dando a esses convites?

JB – Fico feliz por ser lembrado com alguma frequência, mas sempre agradeço ao convite e respondo que não tenho vocação para a política. Minha principal contribuição à sociedade é através da vida empresarial, com a prestação de bons serviços aos nossos clientes, o pagamento correto dos impostos, a criação de empregos de qualidade, a realização de novos investimentos na região e a busca do merecido retorno aos acionistas que, em última análise, são os que tomam o risco da atividade empresarial.

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