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Zona Franca aposta em kombucha e açaí para interiorizar benefícios

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28/11/2022

Após disputa com governo em torno de IPI em 2022, região prevê trégua com Lula

Eduardo Cucolo

MANAUS

No início do próximo ano, 26 trabalhadores vão embarcar em uma balsa-fábrica de açaí rumo ao interior da Amazônia. O investimento de R$ 30 milhões é uma das iniciativas que buscam suprir uma lacuna: explorar potencialidades locais e levar os incentivos da Zona Franca de Manaus para outras partes da região.

Em uma viagem de até dois meses e meio, a Bertolini Amazon Treasure prevê contratar mais 20 trabalhadores temporários em cada parada. Em um ano de operação, deve desembolsar R$ 9 milhões na compra de frutos colhidos por comunidades distantes do grande polo industrial criado há mais de 50 anos.

O projeto só se tornou possível por ser financiado por uma grande empresa de logística da região.

Irradiar os incentivos da Zona Franca para outras partes da Amazônia, explorar potencialidades regionais e internacionalizar a indústria local. Esses são alguns dos objetivos traçados no documento que prorrogou até 2073 os benefícios fiscais da região.

Também no início de 2023, a Moto Honda, empresa que está há 46 anos na região, vai concluir um novo ciclo de investimento, de R$ 500 milhões, para modernização e ampliação da planta que produz mais de 5.000 motocicletas por dia.

São 7.000 funcionários e diversos robôs que transformam chapas de aço e produzem praticamente todas as peças dos veículos que saem da fábrica, o que inclui também itens plásticos e estofamento.

Para a fábrica de açaí que segue rumo ao interior, os rios da Amazônia são o único caminho para chegar à matéria-prima. Para a montadora japonesa, a navegação em balsas a oeste é a única forma de escoar a produção de quase 1 milhão de motos por ano.

Criada por um decreto de 1967, durante o governo Castello Branco, a Zona Franca surgiu como área de livre comércio e de incentivos fiscais especiais, com objetivo de gerar um centro industrial, comercial e agropecuário no interior da região amazônica.

Após mais de meio século e de bilhões em incentivos fiscais anuais, Manaus continua a ser uma ilha no meio da floresta, com 2,2 milhões de habitantes. Para que a produção de motos, televisores, celulares —três produtos que respondem por 40% do faturamento do polo— e outros bens chegue aos mercados consumidores é preciso contar com aeronaves e, principalmente, balsas que navegam até Belém (PA), onde é possível acessar portos e rodovias.

A região conta hoje com incentivos fiscais federais de R$ 25 bilhões/ano relativos a impostos de importação e exportação, IPI (produção) e PIS/Cofins, além do benefício estadual do ICMS. São esses recursos que tentam compensar o isolamento geográfico e econômico e atrair empresas de ponta e centros de pesquisa.

Estão lá empresas como Samsung, LG, BMW Motos, Yamaha, Midea Carrier e Whirlpool.

A região também abriga a única fábrica de concentrados para bebidas da Coca-Cola no Brasil e 15 empresas que formam o segundo maior polo fabricante de aparelhos de ar-condicionado no mundo, atrás da China.

A maior parte das empresas da região trabalha com a transformação de insumos, vindos do exterior ou de outros locais do país, em produtos de alta tecnologia. Os setores de bens de informática, eletroeletrônicos e duas rodas representam 62% do faturamento do Polo Industrial de Manaus, que cresceu 32% em 2021, após avançar 15% no primeiro ano da pandemia.

Para aqueles que estão na região, a Zona Franca representa um modelo de desenvolvimento econômico de sucesso, que contribuiu para garantir a integralidade do território nacional e a conservação da floresta —apesar dos custos e das dificuldades logísticas. Há inúmeros estudos sobre o tema, capazes de confirmar ou contestar a tese.

Um trabalho coordenado pelo pesquisador da FGV Márcio Holland, com apoio da indústria local, mostra que, para um benefício tributário de R$ 250 mil/ano por trabalhador, é gerado um salário de R$ 56 mil/ano. Quando se consideram também empregos indiretos e é descontada a arrecadação do polo, o custo cai para R$ 24 mil/ano por trabalhador. Nesse caso, o governo federal contribui para bancar 42% da folha de pagamento.

O estudo também estima que os investimentos no polo contribuíram para a preservação do meio ambiente na região, embora de forma bastante modesta. Para cada aumento de 1% na população ocupada na atividade industrial, há uma contração de 0,006% no desmatamento no estado do Amazonas.

Para o empresário Luiz Augusto Rocha, que está há quase 30 anos na região e preside atualmente o Conselho Superior do Cieam (Centro da Indústria do Estado do Amazonas), acabar com a Zona Franca provocaria a destruição da economia regional, levaria à saída de empresas para outro países e incentivaria a exploração de atividades ilegais. “As empresas não vão sair daqui para São Paulo. Irão para outros países”, afirma o executivo.

Superintendente da Suframa, autarquia do Ministério da Economia que administra a Zona Franca, Algacir Posin afirma que há décadas a região deixou de ser um paraíso fiscal ao qual as pessoas viajavam para comprar videocassetes e outros itens eletrônicos.

Desde os anos 90, as empresas precisam cumprir etapas fabris obrigatórias para terem acesso aos benefícios tributários, sistema conhecido como Processo Produtivo Básico. É ele que garante, por exemplo, o grau de processos e conteúdos nacionais de um produto.

Posin diz ser impossível substituir o polo de alta tecnologia por uma indústria voltada apenas para produtos da floresta ou fazer com que a Amazônia sobreviva com crédito verde. Para ele, as três coisas são complementares. Daí a busca do órgão por alternativas para a região.

Entre essas iniciativas, se destacam alguns projetos do CBA (Centro de Biotecnologia da Amazônia), ligado à Suframa. Instalada em um complexo de 12 mil metros quadrados de laboratórios, a instituição já desenvolveu projetos como uma kombucha produzida a partir da biodiversidade amazônica, embalagens com fibras locais que aumentam o tempo de conservação de produtos ou substituem o plástico e membranas fitoterápicas com propriedade anti-inflamatória e cicatrizante.

Coordenador-geral do CBA, Fábio Calderaro afirma que a instituição está hoje atrás de “empresas-âncoras”, de setores estratégicos, como alimentação, cosméticos, higiene pessoal e biocombustíveis, que possam gerar demanda para uma indústria baseada no aproveitamento da biodiversidade da região. “As empresas que estão hoje no polo, em sua maioria, não geram demanda para o interior do estado”, diz o pesquisador.


ZONA FRANCA EM NÚMEROS

41.773
Empresas cadastradas na Suframa*

18.054
Empresas cadastradas no Amazonas

430
Indústrias de grande porte em Manaus

107 mil
Empregos nessas grandes indústrias

412 mil
Empregos indiretos

2,2 milhões
População de Manaus

R$ 158 bilhões
Faturamento do polo industrial de Manaus em 2021

Fonte: Suframa. *Os benefícios foram estendidos para uma área que inclui os estados do Amazonas, Acre, Rondônia e Roraima, e as cidades de Macapá e Santana (Amapá)


Outra preocupação constante para as empresas da região é a insegurança jurídica, afirma Luiz Augusto Rocha, do Cieam.

Em 2022, a Zona Franca ganhou destaque por causa da disputa envolvendo a decisão do Ministério da Economia de reduzir o IPI de diversos produtos. Embora os benefícios fiscais da região estejam garantidos pela Constituição, esses incentivos perdem eficácia cada vez que o governo reduz tributos no restante do país.

A expectativa da indústria local é de mais harmonia com o próximo governo, mas destaca que uma reforma tributária que acabe com o IPI ou uma abertura comercial mais acelerada podem colocar em risco o parque industrial.

O repórter viajou a convite do Cieam (Centro da Indústria do Estado do Amazonas)

Fonte: Folha de S. Paulo

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