15/08/2022
Os percentuais estão nos indicadores mais recentes do Polo Industrial e são referentes aos cinco primeiros meses de 2022.
Waldick Júnior
13/08/2022 às 08:50.
Atualizado em 13/08/2022 às 09:28
Considerados carros-chefe da Zona Franca de Manaus (ZFM), a produção de notebooks, televisores LCD, celulares, condicionadores de ar, microondas e outros produtos, registra quedas que ultrapassam os 90% em 2022, em comparação ao ano passado.
Economistas veem a menor produtividade com preocupação, em especial porque ocorre em meio a uma série de tentativas do governo federal de reduzir o Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) sem resguardar por completo a Zona Franca.
Os percentuais estão nos indicadores mais recentes do Polo Industrial e são referentes aos cinco primeiros meses de 2022. Na comparação com o mesmo período do ano passado, as maiores quedas são na produção de Dvd Record Player (-96,70%); rádios, MP3, Mp4 e toca disco a laser (-82,21%); condicionador de ar de janela (-89,41%); notebook desktop (-58,27%); e microcomputador portátil (-45,14%).
Os dados estão disponíveis no site oficial da Superintendência da Zona Franca de Manaus (Suframa) e foram inicialmente observados pelo economista e ex-superintendente da autarquia, Thomaz Nogueira. Em entrevista para A CRÍTICA, ele explicou por que considera os números graves.
Thomaz Nogueira (Foto: Raphael Alves/TJAM)
“Todos esses itens tiveram uma redução substancial na produção física, ou seja, olhar para o faturamento [lucro] pode iludir, mas o que importa são as unidades produzidas, e nisso houve redução”, comentou.
Ar-condicionado
Para Nogueira, o caso mais emblemático é do ar-condicionado modelo split. Segundo ele, na maioria dos produtos a redução foi “pura e simples”, mas no caso do split, houve diminuição na fabricação do aparelho (-50,07%), mas aumento dobrado na produção das partes – unidade condensadora (199,89%) e unidade evaporadora (168,63%) – que são unidas para formar o eletrodoméstico.
“Ou seja, o split recuou, mas a venda das partes separadas cresceu, então nos parece, embora não seja certeza, que o produto final está deixando de ser produzido em Manaus para ser enviado e concluído em outros estados”, alertou o economista.
Efeito cascata
O cenário de queda na produção é ainda mais preocupante, segundo Thomaz Nogueira, ao se considerar que há uma cadeia de produção na Zona Franca afetada pela redução da produtividade.
“Uso como mesmo exemplo o ar-condicionado. A redução da produção não impacta só a fábrica que produz aqui, mas em todo o setor plástico. O que se adquiria nas fornecedoras daqui vai ser comprado em outros cantos do país”, comentou.
É o que ressalta também a economista Denise Kassama, que lembra “na economia, não existe fato isolado”. Para ela, até mesmo os empregos são afetados. “Se a produção é menor, as empresas vão contratar menos. Se tem menos trabalho, há menos renda, e logo, o consumo também cai”, explicou a especialista.
Dados disponibilizados pela Suframa mostram queda na mão de obra em 2022. Em janeiro havia 107.827 empregados, mas o número foi caindo mês a mês até chegar a 103.647 em maio. Ainda assim, está na média da mão de obra observada em todo o ano passado, 103.619 trabalhadores.
(Tabela: Edivan Farias/A Crítica)
Redução do IPI
Economistas entrevistados pela reportagem destacaram que as reduções do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) promovidas pelo governo federal também podem ter impacto nos números negativos. A principal relação é o aumento da insegurança jurídica, ou seja, empresas com medo de investir na região. Mas também porque com a diminuição do tributo, ficou mais barato importar produtos de outros países.
“Minha hipótese é essa. Os produtos importados ficaram mais baratos. Além disso, ficou mais barato produzir em outros lugares, e as empresas levaram para fabricar fora daqui”, comentou Thomaz Nogueira.
O presidente da Federação das Indústrias do Amazonas (Fieam), Antônio Silva, avaliou que a redução do IPI promovida pelo governo federal teve influência na queda da produtividade. “É natural que a insegurança jurídica oriunda desde o primeiro decreto datado de fevereiro tenha reflexos sobre esse indicador”, disse.
Porém, Antônio Silva destacou ainda que há impacto da própria desaceleração econômica mundial, em razão da covid-19 e da guerra na Ucrânia. “Entendo que o impacto imediato sobre a produção decorre muito mais de uma questão mercadológica e da inconstância no fornecimento de insumos”, pontuou.
Esse fator também é citado pela economista Denise Kassama. “A insegurança jurídica impacta bastante, mas há também relação com alta da inflação. A Zona Franca é uma área de produção de bens de consumo final, e o brasileiro está gastando menos com esses itens”.
Faturamento pode ser ilusão
No dia 29 de julho, a Superintendência da Zona Franca de Manaus (Suframa) anunciou um crescimento de 10,9% no faturamento nos cinco primeiros meses de 2022, chegando a R$ 68,17 milhões. O dado foi obtido na mesma relação que mostra a redução da produção no Polo Industrial de Manaus (PIM), mas a autarquia não mencionou os números negativos ao divulgar os indicadores.
Para economistas ouvidos por A CRÍTICA, olhar apenas para o faturamento do PIM pode causar alguma ilusão, já que há expressiva queda na produção de itens carros-chefe da Zona Franca.
“O faturamento pode te iludir a alguma conclusão, mas o que importa é o que está se produzindo, as unidades. E nisso houve redução de uma série de itens”, comentou o economista e ex-superintendente da Suframa, Thomaz Nogueira.
A economista Denise Kassama explicou que o alto faturamento está muito associado à alta do dólar americano, uma das moedas pela qual o lucro da ZFM é medido.
“A Suframa tem divulgado recordes de faturamento, mas a base da Zona Franca é insumo. Importamos, fazemos o processo de produção e vendemos. Se a taxa do dólar está alta, compramos os insumos mais caros e, por consequência, vendemos nossos itens com valor mais alto. Isso aumenta o número do nosso faturamento, mas porque gastamos mais antes”, disse.
O presidente da Federação das Indústrias do Amazonas (Fieam), Antônio Silva, também credita a elevação do faturamento ao dólar em alta. “Uma parte do alto faturamento é explicada pela disparada do dólar e pelo encarecimento dos insumos, o que impacta no valor final dos produtos”, explicou.
A reportagem solicitou, na tarde de quinta-feira, nota da Suframa ou entrevista com o superintendente, general Algacir Polsin. O objetivo era entender como a autarquia explica a queda na produção. Porém, a assessoria informou que não havia tempo suficiente para atender à demanda. O espaço continua aberto para manifestações.
Fonte: Acrítica