08/02/2023
O advogado e economista Serafim Corrêa é potencial referência quando se fala em modelo ZFM (Zona Franca de Manaus). Já foi deputado estadual, prefeito e secretário de Estado, funções nas quais construiu grandes trajetórias no Amazonas com uma atuação dinâmica, assertiva, eivada de conhecimentos sólidos e de muito conhecimento de causa.
Serafim foi o convidado do podcast ‘Jaraqui com Economia’, veiculado pela central do Jornal do Commercio, programa comandado pelo trio de economistas Michele Aracaty, Jefferson Praia e Mourão Júnior. O tema em questão foi ‘Reforma tributária e a ZFM’, bem apropriado para as mudanças que virão mais adiante a partir da tramitação de propostas no Congresso Nacional, com início provavelmente em abril deste ano.
Centrada no meio do furacão, a ZFM convive hoje com muitas apreensões sobre a possibilidade de extinção do IPI (Imposto sobre Produtos Industrializados), principal mantenedor de investimentos e para atração de novos negócios à região. Esta só é uma das vantagens que devem ser afetadas entre tantas por conta da reforma.
Para Serafim, as duas propostas que tramitarão no Congresso são prejudiciais à ZFM. E alerta que as mudanças não são tão simples como o atual governo central imagina. Por trás, existem tantos interesses envolvendo todos os Estados e municípios brasileiros que baseiam sua arrecadação no ICMS (Imposto sobre Circulação de Mercadorias) e ISS (Imposto sobre Serviços).
“É um caminho longo que custará muitas horas de discussões. E conciliar tantas reivindicações será um desafio”, avalia o ex-deputado, que acaba de deixar o mandato por não ter sido reeleito nas últimas eleições.
Hoje, existem duas propostas de reforma Tributária que serão avaliadas pelo Congresso, em breve. Uma propõe a fusão de cinco impostos (PIS, Cofins, IPI, ICMS e ISS), e outra, fundindo nove tributos. Os dois projetos dizem que não haverá incentivos fiscais. “Aí está o nó da questão”, afirma Serafim.
Segundo o ex-deputado, os dois projetos são extremamente prejudiciais à Zona Franca, não se enquadrando no contexto do regime incentivado no Amazonas, que reúne hoje pelo menos 500 empresas no Parque Industrial de Manaus.
Menos impactos
Para amenizar eventuais impactos negativos aos incentivos fiscais, ele sugere unificar nacionalmente o ICMS e o ISS. Segundo Serafim, os maiores litígios estão em torno do segundo imposto (ISS), que responde pela maior arrecadação dos 5.700 municípios brasileiros. Ele entende que a reforma é necessária porque o contribuinte já não aguenta mais pagar tantos tributos.
Outra saída seria fundir o ICMS, ISS ao IPI, PIS e Cofins, avalia o ex-deputado. “A partir daí, poderíamos pensar num segundo momento -fundir o imposto federal que surgisse da fusão desses três tributos com o ICMS, por último, e o ISS dos prefeitos”, sugere. “Agora, pensa em 5.700 prefeitos pressionando deputados e senadores. Não será uma tarefa fácil conciliar tantos interesses”, acrescenta.
Outra saída, segundo Serafim, seria criar alíquotas diferenciadas para os produtos fabricados na ZFM em relação aos outros Estados, o que daria maior competitividade à indústria da região no mercado nacional e internacional. Ou então, outra opção é pagar a mesma taxa, mas tendo devolução. “Então, isso seria nossa vantagem para eventuais mudanças por conta da reforma”, avalia.
Ao contrário do que relatam, Serafim Corrêa diz que a ZFM é um modelo próspero, bem-sucedido, contribuindo muito para o Brasil. “A Zona Franca é a galinha dos ovos de ouro, arrecadando para o Brasil mais do que recebe. Arrecada R$ 10 bilhões anualmente, mas só tem de volta R$ 10 bilhões. Precisamos mostrar ao país inteiro que a Zona Franca não é só do Amazonas, é de todo o Brasil”, ressalta o economista.
Ele afirma que essa visão distorcida sobre a economia do Amazonas vem desde o ciclo da borracha e de outras épocas. E é necessário desmistificar relatos de que o Estado só se beneficia do governo central, sem dar a contrapartida econômica.
O economista também fala da importância de se resgatar a independência da Suframa (Superintendência da Zona Franca de Manaus). Antes, a autarquia tinha voz e poder de decisão para captar novos investimentos. Porém, nos últimos anos foi perdendo forças e agora está atrelada às orientações de Brasília, não cumprindo praticamente a função para a qual foi criada.
Segundo Serafim, hoje o Brasil não está preocupado com o Amazonas e a própria Amazônia como um todo. Há um descompromisso total com os povos originários. A questão ambiental é relegada a segundo plano, abrindo precedentes para a expansão do crime organizado em uma região continental.
Ele alerta que o mundo está de olho no tratamento irresponsável com o meio ambiente e no genocídio de Yanomami em Roraima, algo que ficou mais transparente no último governo central. “Precisamos dar uma resposta positiva ao mundo. Porque corremos riscos de sofrer interferência”, adverte.
De acordo com Serafim Corrêa, o Amazonas está isolado praticamente em torno da reforma Tributária. E que hoje não existem aliados no Congresso, o inverso do que muitas lideranças imaginam.
Na contramão dos que criticam a política, Serafim ressalta, ainda, que só se pode transformar um país pela ação de políticos, mas através de representantes comprometidos realmente com a causa pública.
“Vejo que o Brasil não tem solução sem ser pela política. Espero que nossa classe política seja prestigiada. Vejo que grande parte das pessoas agride o político no momento em que ele precisa ser fortalecido”, afirma. “Não dá para eleger e no outro dia estar jogando pedra. Portanto, o nosso caminho da Amazônia e do Brasil é a boa política, não essa que tem sido disseminada, dizer que o Supremo não presta, o Congresso não presta”, contesta.