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'Não dá para crescer sem distribuir riqueza', entrevista com o economista José Alberto Machado

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04/11/2019

Fonte: Jornal Acrítica

Larissa Cavalcante

Com o avanço da agenda econômica de privatizações, reformas e o pacote de projetos que a equipe econômica do governo pretende apresentar ao Congresso, o A CRÍTICA conversou com o economista e professor José Alberto de Machado sobre as políticas econômicas liberais adotadas no Brasil, suas implicações sociais e a adoção desse modelo em países da América Latina como Argentina e Chile, que passa por uma onda de protestos e convulsão social há mais de uma semana. O neoliberalismo levou a Argentina a pedir ajuda do Fundo Monetário Internacional para tentar amenizar a crise econômica.

O governo brasileiro aposta no liberalismo econômico. Essa é uma política econômica viável?

Retirado os aspectos de natureza ideológica, o que se costuma rotular de liberalismo econômico é uma política que busca o crescimento econômico, a geração de emprego e contas governamentais equilibradas capazes de permitir que o governo tenha um papel mais ativo em induzir investimentos.

A situação da Argentina é completamente diferente do Brasil. O governo argentino assumiu e não fez as reformas que precisavam ser feitas. No meu entender, são reformas que não podem ser feitas a conta-gotas porque vai criando tensões no tecido social.

Não se vendo os efeitos imediatos é natural que a população se inquiete com isso.
O Chile já vinha com deficiências nas contas públicas e foram ajustar de maneira bastante drástica, de uma hora para outra.

O país já tinha problemas sociais graves e acabou se instalando a situação que estão vivendo hoje. O Brasil vive uma situação boa para dar uma arrancada. Ele está com a inflação baixíssima, taxa de juros a 5% ao ano e a acabou de fazer a reforma da previdência.

Quais são os riscos da implantação desse modelo econômico no Brasil?

Se essa providências que estão em curso se alinham mais ao ideário liberal ou não, é uma avaliação ideológica que não entro no mérito. Nós temos no governo brasileiro uma carteira de transferência de renda que de forma alguma se ligaria ao modelo liberal, por exemplo, o Bolsa Família e outros programas de complementação de renda.

Nós temos uma série de benefícios sociais no país que em países com veia completamente liberal não existe. As medidas em curso no País são necessárias e urgentes. É preciso um conjunto de ações por isso tivemos a reforma trabalhista e a da previdência. É um manicômio na quantidade de tributos e também na carga que isso tem sob o sistema produtivo e a vida do cidadão. A necessidade "Nós temos uma série de benefícios sociais e programas de complementação de renda que em países com veia completamente liberal não existe" "Medidas econômicas em curso no país precisam conviver com políticas que beneficiam setores e regiões".

Perfil 2 NOME: José Alberto Machado

IDADE: 66 anos

ESTUDOS: Doutorem Desenvolvimento Socio Ambiental, Mestre em Engenharia de Sistemas e Computação, Graduado em Administração de Empresas e Economista, Emérito EXPERIÊNCIA:Professor aposentado da Universidade Federal do Amazonas, leciona em programas de mestrados como convidado. Já atuou como coordenador geral de Estudos Econômicos e Empresariais da Suframa e coordenador de Pesquisas em Sociedade, Ambiente e Saúde do Inpa.

A necessidade da reforma tributária é inegável e também a administrativa. Ao final, é preciso ter uma reforma política porque também a nossa estrutura política é complicada. Nós temos a necessidade da reforma do pacto federativo. Então, esse conjunto de reformas tem que acontecer.

Implantar uma economia mais liberal não condiz com atividades econômicas no país como a Zona Franca de Manaus. Que ameaças se têm? No nosso quintal temos muito a fazer, pois benefícios fiscais não são considerados parte desse pensamento.

Setores que precisam de determinados incentivos como agronegócio, a zona franca, zona de processamento de incentivos, determinados segmentos econômicos que precisam de fortalecimento e estão em via de implantação. O conceito de liberal nos países em
que apresenta dessa forma pura não existe. Tem política de desenvolvimento regional necessária e setorial. As medidas econômicas que estão em curso no país precisam conviver com políticas que beneficiam setores e regiões.

Quais as implicações sociais e às consequências econômicas dessas reformas?

No caso da reforma da previdência, o impacto se dá por conta da diminuição do déficit das contas públicas brasileiras. Com isso, o Estado ganha um certo fôlego e não precisará fazer pressão por demanda de dinheiro no mercado bancário. No caso da reforma tributária, a
diminuição do custo e da complexidade da carga tributária cria estabilidade jurídica nas relações do setor produtivo. Cria-se expectativas mais sólidas fazendo com que o setor produtivo comece a se movimentar. No momento em que o Brasil se torna mais organizado em suas contas passa a ser um atrator da montanha de dinheiro que tem para se investir no país.

Hoje, isso só não ocorreu porque estamos com regras incertas no tributo, na previdência e em várias outras questões. Banqueiros defendem a reforma administrativa.

A medida é essencial para fazer a economia crescer rapidamente?

Não são só banqueiros. Há um coro homogêneo, de quem analisa e investe, da necessidade de termos melhorias na nossa condição de produção. Não sei se isso vai resolver, mas caminhar como estamos não é possível. O governo não tem como arcar com tantas despesas. Temos uma carga tributária alta e uma parte do PIB do país é para pagar imposto e receber serviços oferecidos por um setor público tão ruim. Quem sustenta o poder público é a sociedade.

As privatizações são a solução para quitar parte da dívida pública brasileira?

Possuem três efeitos importantes: o primeiro é de ajudar a diminuir o déficit que o governo possa ter em setores e nas próprias dívidas, retira o investimento do Estado em setores e se ocupa na sua essência com educação, saúde e segurança. Abre espaço para, efetivamente, quem sabe gerir negócios e tem mais competência para lidar com o mercado, iniciativa privada.

Com o País ainda sob efeitos de uma crise econômica seria momento de maior ou menor interferência do Estado?

Nos dias de hoje, nós temos um cenário que, no meu entendimento, falta pouca coisa para deslanchar um processo virtuoso de crescimento econômico tendo em vista os juros baixos, inflação baixa e o enorme déficit de infraestrutura no país que, normalmente, demandam volume gigantesco de grande escala de investimentos. Nós temos um mercado ávido por consumir. Portanto, essas reformas que estão em curso já vamos começar a vê os seus efeitos a partir deste ano. O nosso grande gargalo vai ser a estabilidade política, reforma política.

As crises políticas são um entrave ao desenvolvimento?

As incertezas políticas possuem um efeito muito grande na economia. Todos os dias há tensões diferentes, na política. Uma hora se critica os ambientalistas por serem militantes e em outra se tenta acalmar os ânimos da Europa porque o acordo tem cláusulas ambientais.
É um fator de incerteza, dúvida, pois não se tem segurança de qual será o desfecho das coisas. A proposta do governo em acabar com o piso da educação e saúde é criticada por parlamentares e especialistas.

Quais são as implicações dessa proposta?

Diminuir esses pisos tem bastante oposição e vejo dificuldade em conseguir. Ao pensar em diminuir os tetos, também, pela minha leitura, está abrindo facilidades para ter recurso privado atuando nestes setores através de parcerias público-privadas.

A iniciativa privada atua muito no campo da indústria e no se "Desigualdades sociais nos níveis que o Brasil têm não é mais admissível neste século" José Alberto Machado economista tor primário, mas há espaços enormes para atuação na economia brasileira.
Que recado o resultado das eleições na Bolívia e na Argentina e as convulsões sociais no Chile mandam ao Brasil? São países que têm em comum o retorno de agendas particulares.
O recado que é que não dá para crescer sem distribuir.

As desigualdades sociais nos níveis que o Brasil tem não é mais admissível no século que vivemos. Essas desigualdades não poderão mais ser toleradas é o recado a todos os países. A perda de garantias em carreiras estatais é uma tendência mundial em que medida?

O que acontece no Brasil é uma quantidade grande de carreiras com privilégios. A distância deles para a média do brasileiro é muito grande. O que se clama nos dias de hoje e deve ser o foco de políticas é a busca de diminuir as injustiças sociais ainda presentes na sociedade. Os países que conquistaram isso lutam para não diminuir e os que ainda não alcançaram é vê se avançam nessa situação.

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