12/02/2014
Não bastasse essa ameaça, que pode esvaziar o discurso eleitoral de Dilma, o Palácio do Planalto já foi avisado de que, com a escassez de água nos reservatórios e os cortes constantes de luz, importantes indústrias estão desligando as máquinas e mandando os empregados para casa. No interior de São Paulo, a Rhodia, uma das maiores empresas do setor químico do país, foi obrigada a interromper atividades de uma das linhas. A fabricante de papelão MWV Rigesa, a Refinaria de Paulínia (Replan), da Petrobras, e a cervejaria Ambev também já acenderam o sinal amarelo em razão da estiagem.
A ordem no governo, por enquanto, é manter um discurso de tranquilidade, sobretudo de que não há risco de racionamento. Nos bastidores, porém, Dilma já escalou assessores para acompanhar todos os detalhes do reajuste proposto pela Aneel, que ajudará a cobrir o rombo na Conta de Desenvolvimento Energético (CDE), fundo que financia o Luz para Todos e as indenizações às geradoras e transmissoras que renovaram concessões dentro do plano de redução das tarifas desde 2013. A CDE é o principal instrumento usado pelo governo para garantir o corte no custo da energia.
Anunciada com grande entusiasmo por Dilma em rede nacional de tevê, como parte da mensagem do Sete de Setembro de 2012, a redução média de 20% nas contas de luz começou a ser aplicada em janeiro do ano passado. Para alcançar esse desconto, foi extinta, na energia, a cobrança de outros encargos, como os fundos CCC e RGR, e transferida à CDE a responsabilidade pelo financiamento de ações vinculadas a eles. Como os gastos da CDE superam a arrecadação, o Tesouro Nacional está sendo obrigado a cobrir a diferença com os impostos pagos pelos contribuintes.
Cálculos da Aneel mostram que as despesas assumidas pela CDE em 2014, estimadas em R$ 18 bilhões, vão superar em R$ 5,6 bilhões as receitas previstas para o fundo, de R$ 12,4 bilhões. Isso, depois de computado o aporte de R$ 9 bilhões pelo Tesouro previsto no Orçamento deste ano. É essa diferença que pode ser coberta pelo aumento da luz, que será submetido à consulta pública de amanhã até 16 de março. O percentual definitivo da alta só será conhecido na segunda quinzena do mês que vem.
Para não azedar de vez a relação com o Palácio do Planalto, a Aneel decidiu, também, que não incluirá na tarifa dos consumidores deste ano as despesas feitas em 2013 com uso de termelétricas e com a compra de energia no mercado de curto prazo (mais cara). A agência não descarta a possibilidade de o governo optar por esticar o prazo de pagamento ou até isentar as famílias dessa conta. No ano passado, por causa da forte seca e do baixo nível dos reservatórios das hidrelétricas, o uso de térmicas ficou acima da média dos últimos anos. O governo decidiu assumir a fatura para que as distribuidoras não tivessem que desembolsar quantias tão altas, punindo a clientela.
Rebaixamento
Com isso, as distribuidoras de energia ganharam o direito de repor os R$ 10 bilhões gastos para comprar energia das térmicas de forma parcelada, ao longo de cinco anos, conforme definição do governo. De acordo com o diretor da Aneel, André Pepitone, como ficou em aberto qual percentual dessa dívida deveria ser pago neste ano, a agência decidiu por não incluir nada agora. “Em 2014, não será devolvido nada das térmicas. Essa é a proposta da Aneel, que não haja percentual nenhum para fazer frente aquele valor”, disse.
Os analistas reconhecem, contudo, que, a despeito de os consumidores bancarem os R$ 5,6 bilhões por meio de contas de luz mais caras, o Tesouro terá de ampliar o socorro à CDE, se o governo não quiser zerar de vez a redução média de 20% nas tarifas e, por tabela, pressionar a inflação. Dentro do Ministério da Fazenda, estima-se que a fatura do Tesouro para não destruir o discurso de Dilma chegue a R$ 18 bilhões. O problema é que o Orçamento da União está apertado e há a necessidade de se fazer um superavit primário maior para acalmar os investidores e afastar a possibilidade de o Brasil ser rebaixado pelas agências de risco.
Peso na inflação
Relatório da LCA Consultoria alerta para o fato de a utilização mais intensa das térmicas trazer riscos associados à inflação e às finanças públicas. No campo fiscal, o principal deles se refere justamente ao montante necessário de aporte à CDE. Em 2013, o governo injetou quase R$ 10 bilhões, sendo R$ 7,9 bilhões pagos no ano passado e o restante até fevereiro último. Para consumidores residenciais, o custo adicional das termelétricas deverá ser sentido a partir do fim deste ano e, principalmente, em 2015. A LCA estima que a energia elétrica residencial do IPCA, índice oficial de inflação, registre alta próxima a 7% em 2014, após recuar 15,7% no ano passado.
Fonte: Correio Braziliense