30/12/2014
Entretanto, alguns setores podem acabar beneficiados pelo cenário de real desvalorizado, ganhando competitividade também nos preços, já que os importados tendem a ficar mais caros. As perspectivas e demandas do setor industrial para 2015 foram o tema da entrevista com o economista para o DCI.
Castelo Branco é formado pela Universidade de Brasília, com doutorado pela Cornell University, de Nova York, e atua na CNI desde 1992, tendo trabalhado antes como secretário-executivo do Conselho Temático de Política Econômica e do Conselho Temático de Integração Nacional do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea).
DCI: Qual a perspectiva para a indústria em 2015?
Flávio Castelo Branco: A perspectiva para a indústria brasileira em 2015 é um pouco mais favorável do que o observado em 2014. Mas o quadro ainda é difícil, nós esperamos um crescimento de 1% no próximo ano, próximo do crescimento da indústria. Nós também esperamos um ajuste no início do próximo ano, que pode se refletir em uma melhora a partir do segundo semestre. Mas, de maneira geral, o cenário é difícil, com perspectiva de continuidade de alguns dos problemas enfrentados este ano, como a demanda fraca.
DCI: Quais setores têm mais chances de recuperação em 2015 e quais podem enfrentar dificuldades?
FCB: No próximo ano, os setores que até então sofriam com o patamar do câmbio podem ter um ano melhor. Antes, os setores cujo principal mercado era baseado na demanda doméstica tinham melhor desempenho, e no próximo ano isso deve se reverter com a demanda externa tendo melhor resultado. Assim, quem exporta pode ter melhor desempenho. No entanto, isso tudo ainda vai depender muito da capacidade de cada empresa de ser ágil na reação a essa mudança de cenário. É difícil citar um setor específico, mas os que não são muito dependentes de mão de obra intensiva e que sofriam com o patamar de câmbio, como os setores de têxtil, vestuário e calçados, podem ser mais beneficiados. Já o segmento de commodities pode ter resultados mais fracos com a queda dos preços e a desvalorização do real frente ao dólar.
DCI: Qual seria o melhor patamar da taxa de câmbio para beneficiar a indústria?
FCB: O principal para o câmbio é a consolidação de um patamar e não o nível em que ele estará, necessariamente. Se tivermos idas e vindas no câmbio, sem previsibilidade, não teremos segurança. Então é melhor consolidar o câmbio em um determinado patamar, mas eu não estou falando de câmbio fixo, o câmbio tem que flutuar e a gente sabe disso. Mas não pode ter picos de valorização e desvalorização da moeda, pois isso acaba provocando uma pressão inflacionária e aí o governo entra no mercado para intervir na cotação do dólar. Melhor ter mudanças graduais e seguras, mas, de fato, um patamar com real desvalorizado ajuda mais a indústria nacional.
DCI: Quais as principais demandas do setor industrial para o próximo ano?
FCB: O principal é a ideia de retomar para crescer. Ou seja, precisamos ter mais segurança em relação à política econômica. Um ciclo de juros o mais curto possível, porque estamos vendo um ciclo longo de aumento da taxa básica. O ajuste fiscal também tem que ser robusto. Mas aqui é preciso atenção, nós achamos que isso deve vir pelo corte de gastos e não pelo aumento da receita, que significaria aumentar a carga tributária. Nós já estamos perto do limite do que é possível para a carga tributária. Além disso, é preciso racionalizar a tributação, porque temos os chamados custos ocultos da tributação, que é o custo do empresário que não diz respeito à alíquota que ele paga, mas o quanto gasta com a estrutura para realizar esses pagamentos, como o contador, por exemplo, no caso das empresas menores.
DCI: Nós já podemos falar em uma perspectiva de melhora do cenário industrial? Se sim, essa recuperação depende de quais fatores?
FCB: Nós vemos sim uma recuperação parcial da indústria no próximo ano. Mas é preciso considerar que a indústria está praticamente estagnada nos últimos quatro anos e que vamos crescer 1% a partir de um crescimento de 0,3% este ano, o que não é de fato um avanço, mas uma recomposição. Para melhorar é preciso ter um ambiente de negócios que estimule os investimentos para romper com esse modelo de crescimento baseado em consumo. É preciso reduzir a burocracia para tornar, com essas mudanças, a atividade produtiva atrativa. Se fizermos isso, colocando o investimento como base, podemos começar um novo ciclo de crescimento efetivo a partir da segunda metade de 2015 e a partir de 2016 com mais força. No entanto, essa é uma visão otimista, considerando que essa mudança está ancorada na recuperação da confiança na economia a partir da melhora das contas públicas.
Fonte: DCI