03/11/2022
Os bloqueios promovidos desde a noite deste domingo (30), por manifestantes inconformados com os resultados do segundo turno das eleições, podem trazer riscos de desabastecimento para o Amazonas, que já sofre os impactos logísticos de uma vazante atípica. Lideranças classistas do Amazonas ouvidas pela reportagem do Jornal do Commercio, entretanto, salientam que os estoques locais são de maior duração e que efeitos negativos dependeriam de uma duração prolongada das ações paradistas – que começaram a ser desmontadas nesta terça (1º).
O STF (Supremo Tribunal Federal) confirmou, ontem, a decisão do ministro Alexandre de Moraes de liberação imediata das rodovias federais. Na decisão da noite anterior, o juiz há havia ordenado à PRF (Polícia Rodoviária Federal) e às polícias militares que “tomem todas as medidas necessárias e suficientes” para a “imediata desobstrução”. No mesmo dia, em seu primeiro pronunciamento oficial após a abertura das urnas, o presidente da República, Jair Bolsonaro, disse que os “movimentos populares” são “fruto de indignação e sentimento de injustiça”, reprovando os métodos dos manifestantes.
De acordo com o presidente em exercício da Fecomercio-AM (Federação do Comércio de Bens, Serviços e Turismo do Estado do Amazonas), Aderson Frota, o modal rodo-fluvial é o segundo mais usado pelo varejo amazonense, logo depois da navegação de cabotagem. O dirigente avalia que, se as manifestações se limitarem a dois ou três dias, não há motivos para preocupação. Mas, alerta que um prolongamento da crise por duas semanas ou mais pode fazer o Estado reviver momentos semelhantes aos da greve dos caminhoneiros ocorrida em 2017.
“Diferente das empresas do Centro-Sul, que trabalham com estoques semanais, as daqui precisam atuar com estoques trimestrais, em virtude dos problemas logísticos e de toda a burocracia em uma área longínqua. O modal rodo-fluvial tem sido mais usado, porque a navegação de cabotagem se tornou mais cara. Estão cobrando frete extra de R$ 5.000 por contêiner e muitas transportadoras estão limitando as praças [espaços dentro dos navios]. Esperamos que esta situação seja resolvida o quanto antes”, comentou.
O presidente da assembleia geral da ACA (Associação Comercial do Estado do Amazonas), Ataliba David Antonio Filho, se mostrou mais preocupado. “O maior risco está nos bens não duráveis e podemos ter problemas nesse sentido. Não sei se os manifestantes estão deixando passar pelo menos os caminhões com mercadorias perecíveis. E, embora o presidente tenha se pronunciado contra essas ações, deve demorar algum tempo para que haja essa desmobilização. Estou em São Paulo e até os voos foram cancelados, pois a rodovia próxima ao Aeroporto de Guarulhos, onde estão os principais distribuidores, foi bloqueada”, ponderou.
O presidente da FCDL-AM (Federação das Câmaras de Dirigentes Lojistas do Estado do Amazonas), Ezra Azury, concorda que a situação das rodovias brasileiras inspira preocupações. “É claro que isso atrapalha. O transporte marítimo/fluvial já vem apresentando problemas em função da seca. Por isso, o transporte rodoviário tem sido ainda mais importante e muitas empresas estão optando por ele, em razão do alto custo do outro modal, em tempos de vazante. Se esses bloqueios continuarem por 20 dias, há a possibilidade de termos algum desabastecimento, no médio prazo”, avaliou.
“Iminente risco”
Em comunicado à imprensa, a CNI (Confederação Nacional da Indústria) alertou para o iminente risco de desabastecimento e falta de combustíveis, caso as rodovias não sejam “rapidamente desbloqueadas”. Segundo a entidade empresarial, as fábricas do país já sentem impactos no escoamento da produção e relatam casos de impossibilidade de deslocamento de trabalhadores. E acrescenta que 99% das empresas brasileiras usam as rodovias para transporte de sua produção
Mais comedido, o presidente da Fieam (Federação das Indústrias do Estado do Amazonas), e vice-presidente executivo da CNI, Antonio Silva, reforça que as entidades estão monitorando de perto e em conjunto a paralisação do fluxo de mercadorias pelo bloqueio generalizado das rodovias, mas se mostrou mais otimista. “Ainda é cedo para falarmos em desabastecimento. Mesmo porque, a informação que temos, é de que a Polícia Rodoviária já iniciou a reabertura de muitos pontos que estavam fechados. O risco existe, mas, por ora, acreditamos que seja reduzido”, amenizou.
Ao lembrar o peso do modal rodoviário, o vice-presidente da Fieam e presidente do Sindicato das Indústrias Metalúrgicas, Mecânicas e de Material Elétrico de Manaus, Nelson Azevedo, considerou as manifestações preocupantes. “Mesmo que o modal inicial ou final seja diferente – aéreo, marítimo, cabotagem – existe a interconexão com o rodoviário. Cada vez mais a se trabalha com estoques reduzidos, com as mercadorias entregues próximo do momento do consumo. Esperamos que esse movimento não se prolongue e que o fluxo de cargas volte à normalidade o mais breve possível. Não estou entrando no mérito dos motivos, mas o Brasil perde dessa forma”, asseverou.
O presidente da Aficam (Associação dos Fabricantes de Insumos e Componentes do Amazonas), Roberto Moreno, reforçou que bloqueios não devem acontecer em hipótese alguma, pois prejudicam o direito de ir e vir dos cidadãos. Ele alerta para um possível efeito em cascata, dependendo da duração dos bloqueios, com reflexos em toda a cadeia de suprimentos da indústria, em seus diversos segmentos. Mas observa que as fábricas estão acompanhando seus estoques e fazendo planos para minimizar todos eventuais impactos.
Indagado sobre o peso do modal rodo fluvial para o escoamento da produção do PIM, o dirigente assinalou que essa decisão passa pelo cálculo do peso de seu custo sobre as operações. “Primeiro na obtenção física do componente e, segundo, pelo menor impacto que traz aos custos industriais. Existem momentos que os atrasos por eventual parada de linha e perda da produção, acarreta mais efeitos negativos ao fabricante, do que o preço do frete aéreo. O modal rodo fluvial ainda é o mais utilizado. Mas, repito, é uma equação difícil de se resolver, em momentos de dificuldades persistentes na logística mundial”, frisou.
Seca e pontes
O presidente da Faea (Federação da Agricultura e Pecuária do Amazonas), Muni Lourenço, disse que o setor ainda não está sentindo os efeitos das interrupções do fluxo de estradas federais, pois já sofre os impactos da seca. “A atividade já sofre com isso há 20 dias. Principalmente no rio Amazonas, onde navios de transportadoras importantes tiveram de parar. A vinda de insumos e produtos para a agropecuária teve de ser redirecionada para o modal rodoviário, o que gerou impactos no custo do frete. A essa dificuldade, soma-se o desabamento das pontes das pontes da BR-319”, lamentou.
Já o presidente da Ademi-AM (Associação das Empresas do Mercado Imobiliário do Amazonas), Albano Máximo, preferiu não fazer conjecturas. “O presidente da República acabou de fazer um comunicado e pediu que os caminhoneiros não façam bloqueios nas estradas e garantam o direito de ir e vir das pessoas. Com esse pronunciamento, creio que a situação vai amenizar e não teremos problemas de abastecimento”, finalizou.
Por Marco Dassori
Fonte: JCAM