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BR 319: ecologia e hipocrisia

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30/08/2016

Por Wilson Périco*

Comparativamente ao desempenho de 2013, quando o polo industrial de Manaus ofertava 127 mil postos de trabalho, contra os 82 mil empregos do mesmo período de julho de 2016, cabe perguntar a relação desta tragédia social com os gargalos de infraestrutura – notadamente na logística dos transportes - que comprometem a competitividade das empresas e o esvaziamento crescente deste modelo de desenvolvimento de tantos acertos. A pergunta ganha mais sentido na medida em que a Zona Franca de Manaus recolhe para a União 2,5 mais recursos que daí recebe, sendo responsável, além disso, há décadas por mais de 50% de todos os impostos federais da Região Norte. Nos últimos 18 anos, entretanto, apenas a BR 174, ligando Manaus a Boa Vista, capital do Estado de Roraima, uma rodovia sem acostamento, amenizou a logística regional dos transportes, além de uma discreta ampliação nos armazéns do aeroporto de Manaus – o terceiro maior em carga no território nacional. Este aeroporto pode entrar em colapso a qualquer momento, pois não dispõe de uma segunda pista que permitiria gerenciar risco sem maiores atropelos na movimentação de cargas. Mesmo descaso sofreu no período a Hidrovia do Madeira, orçada em R$ 24 milhões, para baratear o escoamento da ZFM e dos grãos produzidos pelo agronegócio. Cabotagem foi a melhor logística para empinar os negócios da Inglaterra no Ciclo da Borracha. Desde 2010, a ZFM é bafejada com anúncios federais de construção de um porto público. Só anúncios. Menos de 3% da arrecadação fiscal federal de 2012 a 2015, R$ 48,6 bilhões, segundo portal da Receita, paga pelo Amazonas resolveria essas questões.

Registramos debate promovido pelas entidades da indústria, com o titular do DNIT (Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes), na presença de representantes do Superintendência da Zona Franca de Manaus e do governo do Estado, entre outros atores envolvidos no assunto, sobre a novela de recuperação da rodovia BR-319, de 855 Kms, que iria recompor a conexão viária do Amazonas com o resto do país. A rodovia foi inaugurada em 1976, sob a responsabilidade do IV BEC Batalhão de Engenharia e Construção, numa área de difícil acesso, que exigiu a utilização de soluções arrojadas de engenharia, e que funcionou, em condições regulares de manutenção, por 15 anos. No início dos anos 1990, o Governo Federal deixou de investir na manutenção da estrada, causando prejuízos de toda ordem. Sua vida útil se exauriu. O trecho entre o km 250 e o km 655 ficou intrafegável. Há indícios, denunciados pela mídia, de bombardeios neste trecho para comprometer sua reconstrução. Depoimentos do DNIT confirmam a hipocrisia das restrições ambientais e da condenação de seguidos estudos de impacto ambiental oferecidos – sem obrigatoriedade legal – por instituições respeitáveis, como a Universidade Federal do Amazonas. Gralhas e símios de ocorrência regional foram promovidos à condição de ameaçados de extinção para justificar o veto da omissão e da irresponsabilidade federal. O último blefe inventou 40 grupos indígenas no traçado da rodovia, felizmente, a própria Funai corrigiu para apenas 6 comunidades que habitam às margens do Rio Madeira e do Rio Purus, 20 a 30 km de mata fechada em distância. Eles extraem no seu habitat seus recursos de sobrevivência há milênios.

Outros expedientes foram invocados, mesmo depois que o Amazonas passou a integrar o staff de primeiro escalão da República, no governo Lula, com um ministro dos Transportes. De concreto, apenas o benefício eleitoral de anunciar a BR 319, destacando os benefícios para as populações que o descaso do Governo Federal excluiu. Os estudos exigidos consumiram recursos que permitiriam recuperar e manter por anos a fio os estragos naturais do funcionamento da rodovia. É óbvio que esta estrada não é panaceia para os males crônicos da logística de transportes que sufocam as empresas do polo industrial e a população do Amazonas, que tem pago a cesta básica mais cara do país, por conta de uma estrutura duopolizada que se soma à inércia federal. Um pacto sombrio desses agentes proíbe por todos os meios a renovação e modernização dos transportes na região, a despeito do reconhecimento público dos prejuízos dessa infraestrutura precária e predatória. Um hipocrisia ambiental com graves estragos para o desenvolvimento socioeconômico e independência fiscal da Zona Franca de Manaus. Até quando?

(*) Wilson é economista, vice-presidente da Technicolor para a América Latina, e presidente do Centro da Indústria do Estado do Amazonas.

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