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“Está em nossas mãos salvar ou esvaziar a ZFM” – Entrevista com Maurício Loureiro

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26/03/2021 09:31

Fonte: Brasil Amazônia Agora

“Somos e estamos vulneráveis, como ilustra a redução das alíquotas de importação de bicicletas e a redução de 10% nas NCM’s dos eletros eletrônicos. Portanto, está em nossas mãos salvar ou esvaziar a ZFM.”

Maurício Loureiro
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Presidente do Centro da Indústria do Estado do Amazonas – CIEAM de 2000 a 2011, o empresário Maurício Loureiro conhece ao avesso os avanços, paradoxos e desafios do programa Zona Franca de Manaus . Com desenvoltura, descreve, nesse bate-papo, porque não conquistamos mais espaço na paisagem industrial do país nem diversificamos a indústria e a economia da Zona Franca de Manaus como poderíamos. “Fica mais fácil assegurar o próprio pirão – na ótica da ganância, a farinha sempre é pouca – do que atuar no parâmetro coletivo para garantir os direitos constitucionais dos investidores e trabalhadores”. Confira!

Entrevista com o empresário Maurício Loureiro – Follow-up

Follow Up – Durante sua existência de 42 anos, o CIEAM investiu numa postura arrojada de desconstruir a maledicência generalizada contra a economia do Amazonas de alguns setores da mídia nacional. O último exemplo foram os estudos da ZFM, seus impactos, efetividade e oportunidades feitos pela FGV. Na sua avaliação, o que mudou em nossa imagem diante a opinião pública e do contribuinte? E por que?

Maurício Loureiro – Penso que há por parte da sociedade brasileira, no geral, um distanciamento de conhecimento da nossa cultura, da nossa base econômica e dos nossos valores, como sociedade multicultural. Enfrentamos idealismos/intervenções/intromissões, alguns nefastos, que conduzem a lugar algum, a não ser ampliar o vácuo social que nos separa, agravando as desigualdades entre Norte e Sul do Brasil. Parte eloquente deste vácuo social são os IDHs dos municípios na Amazônia. No Amazonas não é diferente, mas poderia sê-lo, não fosse a miopia encrustada na falta de visão/compreensão/gestão de Estado. Isto, desde os idos de 1967, quando se constitui a ZFM. Tivemos oportunidades impares de progredir e avançar fortemente por caminhos auspiciosos. Entretanto, as pedras tão comuns aos caminhos de uma região remota não foram removidas. As pedras, foram virando pedregulhos e hoje são montanhas de burocracia, falta de visão de futuro, falta de educação formal, técnica/profissional e de qualidade. Tivemos muitas oportunidades em nossas mãos, mas não soubemos aproveitá-las, em parte pela ganância de alguns e pela indiferença de outros, fatores que influenciaram o que vivenciamos hoje. Uma desestruturação brutal, onde há fortes interesses e interessados em demolir o que ai está como ZFM, seus impactos positivos e oportunidades.

Acredito que o trabalho consistente executado pela FGV, com forte apoio dos atores locais, possa sim ser um divisor de águas, entre os que pensam ser a Zona Franca de Manaus, mesmo à distancia, e o que realmente ela é. A grande realidade, a meu ver, é que o Brasil não tem politica industrial definida. Vivemos numa economia de grande potencial, mas que não sabemos fazer disso oportunidades e prosperidade social. utilizar. Somos ricos, porém pobres, pois não sabemos como utilizar as riquezas naturais, transformando-as em riqueza social (emprego e renda). Há claramente uma demonização em se tratando de Zona Franca de Manaus. Entretanto, os demônios que a demonizam, não sabem, ou não querem reconhecer suas potencialidades, pois temem a competitividade e a hipótese de serem flagrados em seus equívocos.

FUP – Você tem insistido em chamar de quebra de contrato por parte da União essas medidas que deformam o Marco Regulatório que trouxe os investidores para a ZFM. A União é exclusivamente responsável ou essa quebra contratual é compartilhada com os atores da economia local?
Alfredo Lopes é filósofo, consultor do CIEAM e editor-geral do portal BrasilAmazoniaAgora

M.L. – Na realidade a quebra de contrato se dá por praticamente todos os atores deste teatro politico que se tem no Brasil. E que ocorre de dentro para fora. Ou seja, na própria Zona Franca de Manaus, as diversas encenações nos trouxeram prejuízos frequentes. EX.: Mudança de politicas estaduais de desenvolvimento subordinada aos caprichos do poder de plantão. Quando isso ocorre diante de nossa passividade, permitimos que o governo federal também o faça. Deixamos se instalar o critério de Mãe Joana, uma casa onde todos metem a colher. Na gestão FHC, fomos tungados com a redução 25 pontos percentuais do Imposto de Renda sobre o Lucro da Exploração, nome depreciativo dado ao resultado de nossa capacidade de gerar e repartir riqueza. Nenhuma planta industrial do país compartilha tantos recursos para o governo como a ZFM. Ou seja, tínhamos 100% passamos a ter 75%. E o Amazonas passou a ser um dos 5 estados que mais recolhe recursos para a Viúva. O que fizemos quanto a essa ilegalidade? Nada. Mesmo sabendo do direito por prazo certo, assegurado pelo Art. 40 do ADCT, da Constituição de 1988. Depois disto, várias e várias ações de redução de incentivos foram tentadas e ainda estão em curso, pois na medida que não reagimos com desenvoltura jurídica, ficamos mais vulneráveis a ataques, oriundo de interesses dos mais diversos, de outros Estados da Federação, do Congresso Nacional, Governos Federal e por aí vai e foi. Não há segurança jurídica alguma para quem quer investir mais e saber que seus investimentos terão garantia até 2073. Somos e estamos vulneráveis, como ilustra a redução das alíquotas de importação de bicicletas e a redução de 10% do imposto de importação nas NCM’s dos eletros eletrônicos. Está, portanto, em nossas mãos salvar ou esvaziar a ZFM.

FUP – É a mesma história do PPB, da BR-319, do contingenciamento ou desvio das finalidades dos recursos para pesquisa e interiorização do desenvolvimento recolhidos pelas empresas do Polo Industrial de Manaus. Por que compactuamos com essa distorção perversa na relação com a União que frustra tantos benefícios sociais e de qualificação de recursos humanos?

M.L. – Porque somos submissos como sociedade aos pesos e medidas distintos com que somos tratados. Ora, se nós utilizamos apenas 8% dos chamados gastos fiscais do Brasil, por sermos pobres e morarmos longe, por que não questionamos judicialmente os 92% dos gastos que não prestam contas como nos nem geram tantos benefícios para a região e para o país? Fica mais fácil assegurar o próprio pirão – na ótica da ganância, a farinha é pouca – do que atuar no parâmetro coletivo para resguardar os direitos constitucionais de investidores e colaboradores. É mais ou menos assim: não vou comprar nenhuma “briga” porque ela poderá me prejudicar. É melhor, então, aceitar e ser submisso e resguardar meus interesses. A sociedade, bem a sociedade, que se vire, ou que reivindique! Vejamos alguns exemplos:

PPB : Uma aberração burocrática, quando há uma Lei que diz que se tem até 120 dias para decidir. E leva-se até 5 anos para uma decisão. Por que? O que fizemos até agora contra esse status quo e desacato constitucional?

BR-319 – Uma solução que não virá no curto prazo, pelos diversos interesses que a fazem ficar como está. Ninguém topa recuperar o trecho do Meio, 400kms, bombardeado, segundo testemunhas identificadas pela Rede Amazônica, para complicar a reconstrução.

Contingenciamento ou desvio de finalidade: Um sarcasmo, um deboche com quem construiu, arrecadou e não recebe de volta aquilo que gerou como benefício. Os recursos devem obrigatoriamente ser aplicados ao que foi destinado originalmente, segundo a Lei.

Maurício Loureiro é empresário e conselheiro do Centro da Indústria do Estado do Amazonas
FUP – Todos querem meter a colher neste programa de desenvolvimento regional com indicadores robustos de acertos chamado ZFM e, ao mesmo tempo, de perda de oportunidades para a região. São os interesseiros e interessados em tudo menos no interesse público?

M.L. – Com certeza que sim. Sempre há aqueles que entendem “profundamente” de tudo. A grande questão é que permitimos ao longo do tempo que estes metessem a colher e destemperassem o nosso feijão com arroz! A Zona Franca de Manaus, o Estado do Amazonas e os demais que a integram, tem potencial excepcional de desenvolvimento, seja por suas riquezas naturais, seja por suas riquezas de subsolo, seja por sua exuberância para admiração. Temos tudo, mas não temos quase nada, se não fosse o projeto Zona Franca de Manaus, não teríamos nada! Mesmo com os nossos erros e acertos, diria aos leitores, que acertamos mais do que erramos como investidores, temos vários bons exemplos de investimentos na ZFM, poderíamos ter avançado muito mais, mas a falta de visão e a ganância em avançar nos recursos públicos, nos trouxeram até aqui a passos de cágados. Com o Século 21 em andamento, precisaremos mudar a velha lógica que nos trouxe até aqui. Precisaremos enxergar com clareza e vontade de mudar, pois o meio ambiente e a lógica crescente do ESG (Meio ambiente – Social – Gestão) no mundo, será a grande oportunidade para o Brasil por ter uma área como a nossa Amazônia e um Amazonas que, preservando sua rica natureza, poderá ter definitivamente sua vez e lugar ao sol. Isso, se tivermos coragem, juízo e sabedoria de seguir em frente!

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