17/05/2019 09:29
Num brilhante artigo sobre os paradoxos de nossa economia, o professor e empresário Augusto Rocha traz ao debate as desvantagens do isolamento em que, às vezes, nos enfiamos. Temos debatido a necessidade da integração do Norte com as demais regiões do país, mas o Norte não tem conversado suficientemente com o Norte. Ou seja, basta olhar para o lado e priorizar o que nos une sem dar peteca para o que nos dispersa. Cabe lembrar de uma iniciativa não muito distante que buscou mapear as dificuldades de infraestrutura de nossa região. O nome dela era Norte Competitivo. É bem verdade que naquela ocasião havia a necessidade imperiosa de descongestionar a logística portuária do agronegócio que empanturrava de caminhões estradas e portos do Sul/Sudeste do Brasil. O Amazonas entrou de gaiato para ajudar a pagar a conta, mas não foi hábil suficiente para tirar as vantagens que a iniciativa oferecia. Pagamos a fatura que nos cabia sem usufruir da fartura que a contrapartida poderia assegurar.
Perdendo oportunidades e musculatura política
A economia do Amazonas, restrita a área de contrapartida fiscal do Polo Industrial de Manaus, passados 50 anos, não conseguiu estreitar a postura colaborativa entre os estados alcançados pela legislação e jurisdição da Suframa. É óbvio que temos muito a compartilhar com Acre, Rondônia, Roraima e Amapá. São discretas as nossa transações comerciais com esses vizinhos bons de resistência. Eles bem poderiam habilitar-se às vantagens da Lei para quem fornece insumos e produtos para Manaus. Na lógica capitalista, quem produz sob encomenda, assegurado por contratos bem desenhados, trabalha com mais segurança e certeza de retorno lucrativo. Essa premissa, por si só, já poderia ter alavancado promissores negócios com indústrias de componentes, partes e peças, e outros insumos demandados pelo Polo Industrial de Manaus. Numa avaliação rápida, podemos diagnosticar que faltou dialogia. A rigor, porém, faltou foco na compreensão daquilo que a Lei oferece. A síndrome do isolamento impediu-os de perceber que o rompimento do isolamento inibiu a formação de uma base político-parlamentar que já nos teria colocado na condição de protagonistas do desenvolvimento regional sustentável e integrado. É sobre isso, a oportuna reflexão de Augusto Rocha. Confira.
“O Amazonas não é uma ilha”
Augusto César Barreto Rocha(*)
Não compreendo por qual razão muitos de nós somos bairristas ao ponto de agir como se o Amazonas fosse uma ilha. No mundo da economia contemporânea não existem ilhas. Cada país, cada região possui seus pontos fortes e fracos. A fortaleza do Amazonas vai muito, muito, muito além das benesses fiscais. Por que não as usamos? Por que não interagimos com outros Estados do Brasil usando as nossas fortalezas?
Reformas são sempre muito bem-vindas, quando se atacam os pontos fracos da situação atual e se potencializam os pontos fortes. Por alguma razão misteriosa, não agimos desta forma. A floresta importa, a biodiversidade importa, a indústria eletroeletrônica importa, todos possuem algum sentido de grande importância. É claro que outros vão observar que importamos insumos do exterior. A questão é como poderemos adotar alianças e laços econômicos mais fortes que gerem importância para outros entes da Federação?
Como encontrar sinergias com os nossos vizinhos Roraima, Acre, Rondônia, Pará, Mato Grosso? Isso sem falar na Venezuela, Colômbia e Peru. Há tantos negócios feitos com São Paulo, mas há ainda mais oportunidades com todas estas nossas fronteiras estaduais. O Amazonas é tão diverso que pode ser desolador observar o que é feito, mas também pode ser muito animador, pois quando se tem muito pouco feito de um potencial, qualquer mudança será um grande estímulo.
Os negócios usuais daqui não são mais opções. Precisamos de novos negócios, com uso responsável da riqueza local, colocando negócios com baixa emissão de carbono como base, tirando proveito do que é uma das grandes oportunidades globais atuais: responsabilidade ambiental e operações neutras em carbono.
Como desenhar um Amazonas neutro em carbono? Convidar pesquisadores para elaborarem métodos aprovados por órgãos reguladores internacionais, para evidenciar que o Amazonas contemporâneo não só é neutro em sua pegada de carbono, como contribui abundantemente para o equilíbrio do meio ambiente global. Demarcar nossas fortalezas e explorar são chaves para um futuro próspero, para que deixemos de nos comportar como vítimas ou atacar quem não é nosso inimigo. Este hábito precisa ser removido de nossa cultura local. Não somos uma ilha, mas precisamos parar de agir como tal.
(*)Augusto Barreto Rocha é doutor em Engenharia de Transportes (COPPE/UFRJ), professor da UFAM (Universidade Federal do Amazonas), diretor adjunto da FIEAM, Coordenador da Comissão de Logística do CIEAM.
======================================================
Esta Coluna é publicada às quartas, quintas e sextas-feiras, de responsabilidade do CIEAM. Editor responsável: Alfredo MR Lopes. cieam@cieam.com.br
Publicada no Jornal do Commercio do dia 17.05.2019