02/04/2015 12:07
Conhecer para defender
Qual a importância do modelo ZFM, a partir da região onde se insere, para a redução das desigualdades de um país cuja economia está concentrada em mais de 50% nas regiões Sul e Sudeste? Há dois anos, num dos ensaios de Reforma Fiscal, os atores diretamente relacionados ao modelo e a sua sobrevivência se mobilizaram para elaboração de uma Nota Técnica, com o objetivo de apresentar o perfil, o papel e a responsabilidade da ZFM no contexto das iniciativas marcadas pela renúncia fiscal. Ali ficou explicitado – na linha da defesa que costumamos adotar quando ameaçados – o alcance dos benefícios que são devolvidos à nação por conta dos incentivos fiscais recebidos, incluindo a geração de milhões de empregos, não sabemos exatamente quantos, criados ao longo de toda a cadeia. Ter clareza de dados, promover estudos, amiudar a agenda de debates, fundados em informações consolidadas é o mínimo que se espera dos atores ligados à economia da ZFM, sua defesa, ampliação e integração ao resto do país. Poder dizer por exemplo que, a despeito das acusações de maquiagem, este modelo agrega 1,5% a mais de inovação à indústria de transformação local em relação às demais plantas industriais do Brasil. E para integrar-se ao sumário da política industrial brasileira que o país precisa urgentemente formular, a indústria da ZFM tem um potencial único de expansão na direção de novas matrizes econômicas, coerentes e promissoras como em nenhum outro bioma nacional, incluindo a Mata Atlântica e o Pantanal Mato-Grossense.
As novas matrizes econômicas
Com a prorrogação, na opinião do cientista Niro Higuchi, do INPA, o modelo ZFM volta a correr o grave risco da acomodação, sobretudo da classe politica e, em parte, de alguns empresários. Por isso é preciso definir um novo modelo, que agregue, diversifique e utilize o portifolio de experiências consolidadas e, principalmente, a destinação dos recursos aqui produzidos para consolidar um modelo alternativo. Todo o repertório de pesquisas, que resultou num inventário monumental de saberes amazônicos, incluindo a pesquisa acadêmica de 63 anos do INPA, está à disposição. Este instituto, é bom lembrar, foi criado pela gestão Getúlio Vargas, no pós-Guerra, no enfrentamento com a ONU e governo Americano que aqui queriam impor o Instituto da Hileia Amazônica como forma de ocupação e mando. Antes, porém, já existia o Museu Botânico Emílio Goeldi, em Belém, com a mesma preocupação. Por causa da riqueza da floresta, para cá acorreram, desde a descoberta, viajantes ingleses, alemães, franceses, italianos, americanos e russos. E foi esse o motivo da primeira tentativa, em 1861, de criar, em Belém, um museu de história natural: servir como apoio às expedições, formar cientistas e iniciar coleções que pudessem ser preservadas no próprio país. Muitas indústrias proliferaram ao redor do mundo com a extração das riquezas naturais da Amazônia. É hora de fundar, com toda essa bagagem de informação nos escaninhos, uma nova indústria, a indústria do conhecimento. Algo similar ao Vale do Silício, cuja matéria prima gerou aquela experiência de êxitos. “Nossa matéria prima, além das madeiras, dos genomas e dos minérios, é a do conhecimento do processo evolutivo de milhões de anos na biodiversidade”, diz o cientista. Entender esse processo, acompanhar e partilhar as operações ocorridas no bioma amazônico, é extrair a chave de milhares de enigmas no cotidiano da humanidade. O projeto Genoma, do qual cientistas do Brasil participaram, é um exemplo singular do que estamos falando. Assim como no Vale do Silício, a premissa é colocar gente talentosa, e inteligente para produzir soluções, exportar conhecimento, a partir dos talentos e da bagagem de mais de 20 mil anos de relacionamento entre o homem e a floresta. O vale da Biotecnologia, da bioengenharia genética, para equacionar os enigmas que atormentam a espécie humana é nossa maior vocação de negócios.
Turismo e interiorização
Focar na indústria do conhecimento e nas multiplicidades de desdobramentos supõe garimpar talentos, incentivar o design – tropical, mineral e biótico – a partir da arquitetura da floresta e na modelagem de seus parâmetros de sustentabilidade holística. Essa proposta/atitude de voltar-se para a floresta para compreender seu papel e importância – permitiria resgatar o conceito de unidade na diversidade, de respiração partilhada, de compreensão dos entrelaçamentos de saber, relacionar, fazer. E de quebra isso atrairia razões objetivas para o turismo do conhecimento, o mesmo que atraiu os viajantes à procura do paraíso perdido ou das diversas formas de tesouros do Eldorado. Novas matrizes econômicas são o turismo do mistério e das soluções que a floresta guarda sob as chaves da pesquisa, um turismo de aventuras, de gastronomia, lazer, o naturismo, entre outras vocações sem similar no planeta. Quanto as empresas do polo industrial de Manaus recolhem nos fundos estaduais de investimento no turismo e na interiorização do desenvolvimento? Algo em torno de R$ 800 milhões/ano. Como apostar parte desses recursos em fitoterápicos da andiroba, copaíba, na cosmética do mulateiro, na indústria das fibras, celuloses e nanoceluloses, resinas..? Para isso, porém, é preciso estimular talentos e novas pesquisas. É passada a hora de frequentar as utopias, namorar seus encantos à luz da definição de Lamartine, segundo a qual as utopias nada mais são que verdades prematuras. “É imperioso perceber os tempos de mudança hodiernos e viver/agir a cada dia os ares propositivos do presente e do futuro! Igual bom feijão, panela de pressão!”, como diz Luiz Augusto Rocha, associado do CIEAM, para ilustrar o convite à transformação .
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Esta Coluna é publicada às quartas, quintas e sextas-feiras, de responsabilidade do CIEAM. Editor responsável: Alfredo MR Lopes. cieam@cieam.com.br
Publicado no Jornal do Commercio do dia 02.04.2015