11/10/2013 14:38
A chave dos acertos
Mas nem sempre foi assim. Como Manaus na virada do século XIX, pioneira na utilização da eletricidade para fins de locomoção popular, Curitiba adotou a modernidade dos bondes elétricos para substituir as charretes ou carroças movidas a cavalo e fundou seu sistema de transporte no centro das estratégias urbanas de uso e ocupação do espaço público. Seu primeiro plano diretor é considerado pelos urbanistas como o mais democrático pelo nível de atendimento e satisfação das demandas do usuário. É importante destacar o caráter participativo de sua formulação original ocorrida em 1965 e de todas as oportunidades de atualização e ajustes que o progresso e o crescimento da cidade foram determinando historicamente. Aí, na captação de demandas, sugestões e críticas da sociedade, reside a origem e a chave de compreensão de seus acertos.
Memória e descaso
Em Manaus, estamos nos ajustes, acessos e inclusões do novo Plano Diretor. Cabe rememorar o Plano Diretor de Manaus, formulado originalmente pelo engenheiro João Miguel Ribas, em 1893, no governo de Eduardo Gonçalves Ribeiro. Um plano que só foi atualizado e ajustado com a expansão urbana da economia da Zona Franca na gestão de Jorge Teixeira, 82 anos depois, em 1975, com algumas alterações e alinhamentos substantivos de Severiano Mário Porto, no governo municipal de Artur Neto em 1989. De lá pra cá, desmandos políticos, no sentido rasteiro da expressão, e importação apressada de parâmetros e talentos estranhos às demandas avaliações nativas, com honrosas exceções, fizeram de Manaus essa falta de rumo e definições urbanas que abriga toda sorte de confusão e desmandos, oportunismos e degradação que a levarão a lugar nenhum. Para onde vai a cidade com a profusão de canetas e carimbos dos arautos de uma legalidade de plantão a serviço de forças inominadas e a escassez de entendimento, planejamento e comunhão de propósitos? Para onde pode caminhar numa cidade cuja área vital de sua economia tem sido alvo de intervenção vesga, estapafúrdia, obscura e federal, num arbítrio improcedente contra o qual a tribo não se levanta nem mais se espanta?
Estrutura singular
Manaus tem uma estrutura viária específica, planejada há mais de um século, e maltratada desde então. Diferente de Brasília, que tem sua dinâmica de mobilidade urbana planejada e ancorada no transporte individual. Essa é a razão pela qual o metrô de lá teve suas obras se arrastando há anos e o trecho em funcionamento é muito pequeno em relação às dimensões demográficas da cidade. Manaus tem sua dinâmica relacionada ao deslocamento a pé em 50%, e o restante por ônibus e por veículos individuais. Este item teve um crescimento assustador nos últimos 10 anos. São cinco mil carros novos nas ruas a cada mês, resultado do crescimento econômico e da própria realidade adversa do transporte coletivo precário na cidade. É claro que nem só de caos no trânsito e travamento do sistema viário se alimentam as demandas de planejamento urbano. É hora do fator político de ordenamento da polis, como postularam os gregos, anular a futrica estéril e sedimentar uma discussão que definirá responsabilidades e atores da elaboração do novo Plano Diretor de Manaus, que interliga e prioriza numa visão holística e proativa o Plano Viário, Plano de Transporte Coletivo, Plano de Ciclovias, Plano Diretor de Águas, de Esgotos, de Drenagem, dos Transportes Aéreos, da Orla, da Estrutura Logística- Portuária, de Saneamento de Igarapés, de Coleta e Tratamento de Resíduos Sólidos, de Acessibilidade, de Áreas Comerciais e Industriais, Uso do Solo e Código de Posturas, Comunicações (Internet, Celulares e Redes Sociais), enfim, uma visão integrada, transparente e coerente dessa gama enorme de demandas e serviços em favor do cidadão, fator essencial, sujeito, objeto e justificativa de toda gestão pública e ação política.
O doméstico e o urbano
É preciso, pois, meter o bedelho do palpite proativo no ato pouco usual desta cidade em planejar paradigmas decentes, coerentes e inteligentes de ocupação. Mais do que isso: é essencial e decisivo acompanhar cada passo da implementação do que for aprovado. Afinal, o ato de crescer - quando se trata de uma semeadura urdida - está associado ao imperativo do cuidar, assegurar ao espaço público o caráter e o zelo doméstico de quem o ocupa com as mesmas obrigações e afeto com que cuidamos do lar, onde fabricamos e vivemos o sonho da partilha familiar. Um modelo de vida em comum, na abrangência da partilha cívica, que pode subsidiar surpreendentes e gratificantes respostas para uma indagacao que nos compete formular: Quo vadis, Urbs?
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Esta Coluna é publicada às quartas, quintas e sextas-feiras, de responsabilidade do Centro da Indústria do Estado do Amazonas. Editor responsável: Alfredo MR Lopes. cieam@cieam.com.br
Publicado no Jornal do Commercio do dia 10.10.2013