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Coluna do CIEAM

Os buracos da municipalidade

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16/10/2014 14:29

Dada a relevância do assunto e o volume de recursos pagos pela indústria ao poder público, ainda se justifica repercutir as cobranças do prefeito de Manaus, o diplomata Arthur Neto, com relação a maior participação das empresas do Polo Industrial de Manaus, na solução dos problemas sociais enfrentados pelo município. Pelos números frios da Lei Orçamentária Anual, para 2014, foi estimado o volume de R$ 4 bilhões, o que representou 17% de incremento em relação a 2013. Do montante, mais de R$ 1,1 bilhão deveria ser arrecadado pelo Tesouro Municipal por meio de recursos próprios e outro R$ 1,3 bilhão está previsto como repasses constitucionais estaduais. Vale lembrar que Manaus, a cidade-estado, faturou R$ 85 bilhões no seu polo industrial, em 2013, e quase outro tanto foi faturado na atividade comercial, de serviços e economia do setor primário. No fim das contas, e considerando que, à parte os impostos de praxe, as indústrias recolhem quase R$ 3 bilhões/ano em contribuições e contrapartida de serviços para o poder público, federal e estadual. E é essa lógica distributiva que precisa ser revista, analisando melhor o grito de alerta do prefeito. Até porque as indústrias, nos últimos três anos, estão vendo encolher os resultados de seus investimentos. A lógica vigente explica os baixos índices de qualidade de vida em Manaus, 23º lugar entre as cidades da Amazônia, enquanto Belém ocupa a 4ª posição. Lembrado ainda que o Amazonas recolhe 54,42% de sua riqueza aqui produzida para os cofres federais e conta com a presença de 11 municípios do Amazonas entre os 50 piores em Desenvolvimento Humano. Os buracos da municipalidade, portanto, são mais amplos e complexos do que a avaliação e cobrança do alcaide possam avaliar.

Noblesse oblige


É importante recordar uma das primeiras medidas da Prefeitura de Manaus, publicada no Diário Oficial do Município, em 03.01.2013, através de Decreto, reconhecendo a responsabilidade de manter e conservar as vias do Distrito Industrial, quando autorizou a Suframa e o Governo do Estado por meio da Secretaria de Estado de Infraestrutura – SEINFRA, a celebrar convênio para realização das obras necessárias para recuperação da malha viária do Polo Industrial de Manaus. A tarefa é, legalmente, municipal e, ao transferir para o Estado e a União sugere o reconhecimento público da incapacidade financeira de assumir sistematicamente a encrenca. No quadro de prioridades municipais, com gargalos urbanos, de transportes, moradias, creches, educação fundamental etc., etc... é compreensível o imperativo de recorrer aos entes federativos mais aquinhoados. E é esse jogo de empurra que se arrasta em quase meio século de ZFM, atacada como paraíso fiscal e, de fato, um verdadeiro paraíso do Fisco. É curioso, ainda, lembrar a origem dos recursos do convênio: as verbas da Suframa, sequestradas pelo governo federal. Por isso, a insistência no debate com os candidatos principais ao governo do Estado. Diante das câmeras, todos assumiram o compromisso de resolver, de uma vez por todas, essa imoralidade administrativa. Ou não é uma imoralidade constatar na porta de empresas que recolhem taxas e contribuições das mais generosas, crateras que sinalizam o constrangimento e a inépcia do dever omitido e tudo o mais que isso representa? Afinal, a renúncia fiscal que dá anteparo ao modelo ZFM – origem de uma economia que deu certo e que gera mais de 600 mil empregos locais e muito mais de 2 milhões de postos de trabalho em território nacional - não utiliza recursos públicos para essa ousadia empreendedora. Como ninguém está aqui de favor, o bom senso recomendaria tratamento mais condigno. Noblesse oblige.

Taxas, custos e atitudes


É bem verdade que o município não recebe contribuição formal porque não concede isenção fiscal às empresas. Mas é lícito e justo que a cidade onde são operadas as ações produtivas e a geração de riqueza tenha mecanismos mais equânimes de contrapartida para assegurar melhores condições sociais e de infraestrutura para a população. E nesse contexto vale recordar as argumentações formais que deram suporte legal para a cobrança das taxas da Suframa. Há 14 anos, com a edição da Lei nº 9.960, de janeiro de 2000, publicada no Diário Oficial da União, ficou instituída a Taxa de Serviços Administrativos - TSA, em substituição ao Preço Público cobrado anteriormente. A responsabilidade pelo pagamento da TSA, devida em razão dos diversos serviços públicos prestados pela SUFRAMA e em específico na hipótese de prestação de serviços de vistoria e internamento de mercadoria nacional, cabe diretamente ao destinatário da mercadoria. Cobrada inconstitucionalmente, essa “taxa Suframa” foi criada por atos meramente administrativos, portarias ou resoluções, para cobrir custos de promoção institucional. Seus percentuais incidiam sobre o valor das mercadorias importadas sob a supervisão da Suframa, com base no artigo 24 do Decreto-lei nº 288/67, que permitia “cobrar taxa pela utilização de suas instalações e emolumentos por serviços prestados a particular”. Esse artigo, porém, contrariava, na raiz, a Emenda Constitucional nº 18, de 1965, que organizou o sistema tributário nacional. A autarquia, a rigor, exercia uma reconhecida ilegalidade, pois estava confundindo taxa com preço público, ou seja, imposto, uma informalidade explícita, tolerada por seus contribuintes em troca das vantagens circunstanciais que permitia. Por isso, a Suframa foi acionada, historicamente, por parte das empresas através de sua entidade de classe. Mesmo assim, as empresas toleravam historicamente na medida em que essas verbas fossem utilizadas para interiorizar a atividade econômica e/ou dar suporte ao melhor funcionamento da autarquia e, por exemplo, assegurar, em conjunto com a prefeitura, a responsável formal e legal da tarefa, a manutenção da estrutura viária do Distrito Industrial.

Proatividade enganosa


As verbas que foram objeto do Convênio, entre Suframa e Governo do Estado, referem-se a um projeto básico de recuperação datado de 2008, que tem cambaleado desde então, com defasagem financeira e alteração substantiva da paisagem urbana, ampliação dos problemas de drenagem, recapeamento asfáltico, sinalização e a urgência de outras ações de urbanismo e paisagismo. Quando ficar pronta, sete anos depois, a iniciativa não terá qualquer estrutura que assegure sua manutenção permanente, nem foi cogitada a ideia de atender o Distrito II, ora entregue à gestão do deus-dará. A Suframa já definiu as boas intenções de parceria com a Prefeitura Municipal de Manaus para disciplinar as atividades, mas não desfruta de amparo político junto aos ministérios para resgatar seus recursos para a tragédia viária do Distrito II. A continuar a escassez crônica de recursos orçamentários da Suframa – e a progressiva desindustrialização de setores que dão suporte ao modelo – agregadas à debilidade política da representação parlamentar, parece que iremos amargar a constrangedora buraqueira das vias do Distrito Industrial I e II por longo tempo. As empresas, que recolhem robustos impostos, para os três entes federativos, além das taxas para a Suframa, não dispõem da manutenção de que precisam para ir e vir na rotina produtiva. A buraqueira mais inquietante, que dá anteparo à reclamatória da prefeitura de Manaus, seus gargalos e flagelos urbanos, é a institucional. A desarticulação entre os atores públicos, que removeu da ZFM seu poder de fogo para decidir e operacionalizar a tarefa legal de estruturação do modelo. Esses anos de aparente afinidade e cumplicidade política entre o Estado e União não foram laços fortes o suficiente para acessar os recursos recolhidos pela Suframa junto às empresas. Foi mais de R$1,4 bilhão nos últimos anos, o que daria perfeitamente para a recuperação da paisagem, a urbanização de suas ruas e praças, manutenção constante de suas vias, transformando o Distrito Industrial em fator de vaidade da população que aqui trabalha, um lugar digno e atraente para ser mostrado aos visitantes. De quebra, a autarquia poderia reduzir sua burocracia e reinvestir em ações coerentes com a diversificação, interiorização e regionalização do modelo para as próximas décadas. Simples assim...
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Esta Coluna é publicada às quartas, quintas e sextas-feiras, de responsabilidade do CIEAM. Editor responsável: Alfredo MR Lopes. cieam@cieam.com.br

Publicado no Jornal do Commercio do dia 16.10.2014

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