05/10/2018 10:36
Há três meses publicamos a coluna abaixo, visando subir o som de nossa gritaria, enquanto entidade representante do setor produtivo, pelo respeito à lei. Vivemos há 50 anos ao arrepio dela. Chegou a hora de preparar os processos. Não buscar os direitos que dão amparo as atividades produtivas significa compactuar com o ilícito. E conivência com o ilícito tem nome. Desacatar direitos significa marginalizar pessoas, suprimir benefícios, adiar a mudança, compactuar com o sombrio e com a impunidade. Este é o apelo e a expectativa para os que se dispuseram a representar a sociedade e que partem de quem produz e de quem contribui com impostos para a máquina pesada e perdulária do serviço público. A sorte está lançada.
À porta da Justiça
Por alerta do MPF Amazonas, a Justiça Federal do
Amazonas, em atendimento a iniciativa da Superintendência da Zona Franca de Manaus,
reconheceu o Poder Municipal com competência e
responsabilidade para gerir, scalizar
e manter o
Distrito Industrial I e II. A Lei e à Justiça estão ao lado
do bom senso e o poder público local está ao lado de
quem? Isso faz 2 anos e meio. Mas a prefeitura, assim
como se portou no projeto de mobilidade urbana, não se
movimentou no compromisso de cuidar da “galinha dos
ovos de ouro”, de onde sai o ganha-pão de mais da
metade da população. Sim, mesmo com as taxas de
emprego reduzidas drasticamente com a recessão
econômica, o município não colocou em seu Plano
Verão a recuperação daquela buraqueira vexaminosa
que espanta investidores, constrange visitantes, ceifa
vidas de transeuntes e explicam o tamanho de descaso
do poder público com a Lei.
O status da calamidade
Um escândalo, nada além disso, traduz a paisagem dos
buracos nas vias de acesso ao Polo Industrial de Manaus
ilustram décadas de descaso, do desmazelo do Poder
Público. Para que pagamos tributos, para assegurar a
gastança perdulária do ente público? Buscar a Justiça,
como já foi feito pela Suframa, de que adiantou, pois a
decisão permanece nas gavetas da burocracia e da
indiferença. São R$ 150 milhões que exigiram a
reformulação de um projeto que tem a 11 anos de
caducidade. Isso não foi feito a tempo de se antecipar a
legislação eleitoral. E não se trata apenas do poder
municipal… Estado e União tem robusta participação e
responsabilidade. Quem cobra? Os entes públicos se
recusam a trabalhar em conjunto, se omitem no dever
de dar ao Distrito Industrial a importância que ele
signica
para a vida das pessoas. A União leva quase
sessenta por cento da riqueza aqui produzida, enquanto
o Estado arrecada nos três Fundos (UEA, FTI e FPMES)
quase R$ 1,5 bilhão ao ano e a prefeitura mais da
metade de suas receitas. O que deveria ser o cartão de
visita para atração de novos investidores, transformouse
num pesadelo. É insano, ilegal e deletério continuar a
fazer nada.
Cegueira crônica e perene
Após a visita de uma Comissão dos Deputados da
Assembleia Legislativa, há mais de dois anos e meio,
uma operação tapa-buraco remendou algumas poucas
vias do Distrito Industrial, que, na realidade, se traduziu
em desperdício de dinheiro público, pois fazer mal feito
é pior do que não fazer nada. Não se passaram três
meses e a temporada de chuvas celebrou a tragédia
anunciada. Num piscar de olhos, os buracos
reapareceram no esplendor de sua perversidade e na
manifestação vergonhosa da irresponsabilidade. E lá
eles se ampliaram na promessa de se transformarem em
tragédias perenes. Ruas sem manutenção significam
tráfego impraticável, a ponto de alguns taxistas e
mototaxistas se recusarem a transportar passageiros. Os
buracos já causaram acidentes com morte, a par da falta
de iluminação em algumas áreas, consequência natural
do abandono. O Distrito Industrial gera emprego e
renda, mas parece que, por aqui, sofremos de cegueira
crônica.
O caminho da lei
Por sugestão do Procurador Geral da República no
Amazonas, Edmilson Barreiros, a conquista pelos
direitos aviltados precisa ser enfrentada. A buraqueira
perece é um frontal desacato a preceitos fundamentais.
Para a jurista Gina Moraes a ilegalidade virou
psicopatologia. “Os buracos, como vemos, têm uma
extensão assustadora e, além de geológicos, são
sintomas patológicos de uma doença chamada omissão
de responsabilidades, geradora do desânimo e da
revolta dos cidadãos e das empresas.” E o que signica
um desacato a um preceito fundamental? Para a
estudiosa do assunto, “…após o lapso temporal de anos
sem solução, há a necessidade de uma reação mais
contundente da sociedade organizada, para que os entes
públicos assumam a responsabilidade de sua
competência, com a mesma força da cobrança dos
deveres dos cidadãos.”.
A solução é a ADPF?
A arguição de descumprimento de preceito
fundamental, ADPF, tem previsão no artigo 102, § 1º, da
Constituição Federal de 1988, que diz o seguinte: “a arguição de descumprimento de preceito fundamental,
decorrente desta Constituição, será apreciada pelo
Supremo Tribunal Federal, na forma da lei”. Além da
base constitucional, a ação é regida pela Lei nº
9.882/99, que tentou dar um perl
mais detalhado ao
instituto. Para que tenhamos uma ideia geral básica
sobre a chamada ADPF seguem, abaixo, alguns
comentários sobre os seus pontos principais:
1. Arguição:embora tenha um primeiro nome
distinto de outras ações de controle, trata-se
também de uma ação, que pode ser inserida, em
sua modalidade mais famosa, no âmbito do
controle concentrado, abstrato e principal de
constitucionalidade. Em outras palavras, a Lei
regulamentadora tentou detalhar uma ação muito
parecida com a ação direta de
inconstitucionalidade genérica (ADI Genérica,
regrada pela Lei nº 9.868/99), embora voltada para
um objeto mais especíco
(casos de
descumprimento a preceito fundamental, expostos
a seguir);
2. Descumprimento:o uso da palavra
“descumprimento” não foi por acaso. Segundo a
doutrina, o termo serve para tutelar quaisquer
casos de desrespeito aos preceitos fundamentais
da Constituição, abrangendo atos normativos ou
não normativos. Nesse sentido, acaba sendo mais
abrangente que o termo ‘inconstitucionalidade’,
usado na ação direta de inconstitucionalidade, e
que corresponde ao desrespeito a Constituição
praticado apenas por atos normativos (como
dispõe o artigo 102, inciso I, alínea a do Texto
Constitucional);
3. Preceito fundamental:não se pode utilizar a
ADPF para qualquer caso de desrespeito ao Texto
da Constituição. Como citado acima, deve ocorrer
o desrespeito de preceito fundamental, ou seja, do
que houver de mais importante no Texto
Constitucional, a ser demonstrado em cada caso
concreto. Importante dizer que nem a Constituição
nem a Lei nº 9.882/99 trouxeram um rol do que
seriam os preceitos fundamentais, o que
dependerá da demonstração do autor de cada ação no caso concreto, assim como do entendimento do
STF a respeito;
4. Princípio da subsidiariedade: Além das três características anteriores, também é importante mencionar como traço marcante o princípio da subsidiariedade, previsto pelo artigo 4º, § 1º, da Lei nº 9.882/99, e que determina que não será admitida a ADPF quando houver qualquer outro meio ecaz de sanar a lesividade. Como entende o Supremo, este princípio signica a impossibilidade de uso da arguição quando houver meio apto a resolver o problema de forma “ampla, geral e imediata” (STF, ADPF 33, Rel. Min. Gilmar Mendes, DJ 27.10.2006, p. 2). Em síntese: a ADPF pode ser compreendida, na sua modalidade mais conhecida, como uma ação do controle concentrado, destinada a combater o desrespeito aos conteúdos mais importantes da Constituição, praticados por atos normativos ou não normativos, quando não houver outro meio eficaz.
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Esta Coluna é publicada às quartas, quintas e sextas-feiras, de responsabilidade do CIEAM. Editor responsável: Alfredo MR Lopes. cieam@cieam.com.br
Publicada no Jornal do Commercio do dia 05.10.2018