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Coluna do CIEAM

De costas para a Amazônia

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22/09/2016 14:47

Em entrevista à Folha, o senador Roberto Saturnino, convidado pelos organizadores do III Congresso Internacional do Centro de Estudos Celso Furtado, na semana passada, pôs o dedo na ferida ao dizer que o governo federal vira as costas para a Amazônia, talvez por desconhecimento de seus gestores ou pela baixa densidade eleitoral da região, o que a torna politicamente desinteressante. Ele mencionou a campanha "O Petróleo é Nosso", nos meados do século passado, quando o país viveu o debate sobre a internacionalização da Amazônia, como alerta ao Brasil. Disse que a nação brasileira não tem olhado para a Amazônia como metade do seu território e como um potencial de riqueza. O Brasil virou as costas para a Amazônia. À propósito, mencionou, entre os embaraços, os gargalos na logística de transporte. Por isso, além da condescendência com o interesse do mundo na região, o Brasil se paralisa. Há pesquisas de várias partes do mundo sendo feitas aqui, mesmo sem o conhecimento do governo, tentando avaliar a importância da Amazônia para desenvolver uma estratégia mais eficiente de dominação. O que preocupa, conclui o parlamentar fluminense, é indiferença brasileira em relação à Amazônia. Ele fez uma incursão na História para citar alguns arroubos do país na direção da floresta. Lembrou que Getúlio Vargas tinha um projeto de integração, com a criação do fundo que gerou a SPVEA - Superintendência do Plano de Valorização Econômica da Amazônia, para estudar e gerir a região. Quando da imposição de Washington para retomar a economia gomífera, com o II Ciclo da Borracha, ele mostrou que pensava a região, ao exigir o Banco da Borracha, hoje, Basa. Negociou a criação de Volta Redonda com a entrada na guerra. Mas ele queria mais do que Volta Redonda. Queria Petrobras, Eletrobrás, BNDES, financiamento do Eximbank. Quis avançar na integração da Amazônia, levou um tranco e, por suas ousadias, foi “suicidado”.

O papel dos militares

Mesmo tendo sido preso pelo Regime Militar, Saturnino Braga defende o papel das Forças Armadas na região. A Amazônia esteve ameaçada até de ocupação e as Forças Armadas foram chamadas para defendê-la. Saturnino referiu-se, provavelmente, as pressões dos países centrais quando exigiram tombar a Reserva Ianomâmi no grito, no governo Collor, numa área superior ao território de Portugal, onde, coincidentemente, estão localizadas as maiores reservas minerais de que se tem notícia, sobretudo para os minerais estratégicos, essenciais à energia nuclear. Para ele, o Brasil simplesmente ignora as potencialidades amazônicas, sua biodiversidade, as vantagens e promessas da biotecnologia, que os países centrais já mapearam, desde o Projeto Radam, o levantamento aerofotogramétrico mais exaustivo de que se tem notícia. Ele mencionou o Sivam, mas esqueceu de destacar que a tecnologia empregada e a posse das informações estratégicas são compartilhadas com o Pentágono. Em 2005, na tribuna do Senado, o então senador Gilberto Mestrinho denunciou que a empresa responsável pela Tecnologia empregada no SIVAM, compartilhava as informações estratégicas com o Departamento de Estado americano. Nada que o ex-funcionário da CIA não tenha confirmado há dois anos, revelando o monitoramento estratégico, político e militar das nações por parte dos EUA. Mesmo as unidades de combate na selva, onde o Brasil, com o CIGS - Centro de Instrução de Guerra na Selva, é referência global, não escapam ao monitoramento. Essa presença militar, entretanto, tem gerado uma consciência não só da defesa, mas na conservação. Nas últimas gestões militares da região, generais como Heleno, Villas-Boas, Theóphilo integraram-se aos desafios da Amazônia e receberam do tecido social o reconhecimento do compromisso em defender e promover saídas para a floresta e sua gente. Mais recentemente, CMA e INPA, o comando militar e o instituto nacional de pesquisas, somaram forças para fazer pesquisa e desenvolvimento de soluções a partir da biodiversidade. “Hoje os militares são reconhecidos. Ninguém fala mal do exército aqui na Amazônia”.

Biotecnologia, economia, inovação

O Brasil deixou uma instituição como o CBA, Centro de Biotecnologia da Amazônia, entregue ao deus-dará, por 13 anos, a despeito de ser uma unanimidade local, nacional e global como instrumento de geração de riqueza, soluções médicas, cosméticas e nutracêuticas para a humanidade, à luz dos princípios ativos da região, 20% do planeta. Os benefícios adiados da biotecnologia. Uma tarefa e um dever de Estado, um projeto nacional que o Brasil mantinha engavetado e que agora, numa operação civil, institucional, fraterna e coerente começa a ficar em pé. As empresas se deslocaram para cá por causa do incentivo, mas mantiveram a administração em São Paulo, exatamente porque é no Sudeste e no Planalto Central que se discute o cotidiano da Amazônia, a política da telegestão, que administra a distância os problemas de um território em que se concentram as reservas estratégicas de segurança alimentar. As empresas pouco ou nada podem fazer a partir desta região sem rosto nem voz, cujos políticos não se insurgem contra o confisco das verbas de pesquisa, desenvolvimento e geração de oportunidades. Quase 60% da riqueza aqui produzida vai para os cofres da União. A maior floresta tropical do planeta pode ser também o último jardim do Éden. Há três anos, o economista Rodemarck Castelo Branco apresentou os itens da riqueza que aqui a natureza concentrou e recomendou sua transformação no Vale da Biotecnologia, para aproveitamento inteligente de seu banco genético, como fizeram os jovens empreendedores americanos com o "Vale do Silício". Nesta semana, uma revista americana, “Proceedings of the National Academy of Sciences", dos Estados Unidos, relatou uma proposta feita por cientistas, em base na suposição de que os 6,7 milhões de km² de floresta – sete vezes o tamanho da Alemanha –, escondem matérias-primas que devem impulsionar a quarta revolução industrial. Chamada de "terceira via", a proposta dos cientistas enxerga a Amazônia como um patrimônio biológico global, que pode impulsionar a nova revolução movida a inteligência artificial e tecnologias que "imitam" a natureza – o biomimetismo. Para o cientista e climatologista Carlos Nobre, recém-eleito membro da Academia Americana de Ciências, "Estamos dizendo que existe um valor agregado muito maior nos recursos biológicos da Amazônia que podem gerar uma economia muito robusta, de longo prazo, que sustentará um novo modelo e que é compatível com a floresta em pé”.

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Esta Coluna é publicada às quartas, quintas e sextas-feiras, de responsabilidade do CIEAM. Editor responsável: Alfredo MR Lopes. cieam@cieam.com.br


Publicada no Jornal do Commercio do dia 22/09/2016

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