27/11/2015 11:49
Câmaras Setoriais, a dispersão temerária
Há um preocupante clima de esvaziamento das Câmaras Setoriais que acompanham os desafios, gargalos, necessidades e desempenho do setor produtivo da Zona Franca de Manaus. Os dados da última pesquisa feita pelas próprias Câmaras mostram não apenas o esvaziamento nas reuniões dos diversos grupos tanto na participação dos representantes, como no nível de satisfação daqueles que acompanham esse espaço privilegiado de troca, reflexão, assessoramento e compreensão da economia local e regional e seus percalços e demandas. O fato, de certa forma, traduz o clima adverso das turbulências políticas e da incerteza da política econômica e, justamente por isso, em vez da dispersão, o momento deveria mobilizar todos os atores – o bom senso exige – na busca das soluções criativas, das iniciativas e troca de respectivas sugestões e acertos, para a superação conjunta. A publicação do Decreto 36.151 que instituiu a Comissão responsável por elaborar proposta de reforma da legislação da Política de Incentivos Fiscais do Estado é um eloquente indicador do vazio deixado pelo processo de esvaziamento das Câmaras Setoriais. Composta por três técnicos da Fazenda Estadual, um da pasta de Planejamento e outro da Casa Civil, foi atribuída a Comissão se atribui, “... entre outras finalidades, garantir mais competitividade às empresas, simplificar a concessão e o acompanhamento dos benefícios concedidos e a interiorização do desenvolvimento, de acordo com o secretário de Estado de Planejamento, Desenvolvimento, Ciência, Tecnologia e Inovação Thomaz Nogueira, na última reunião do Conselho de Desenvolvimento do Estado do Amazonas (Codam). Ora, discussão sobre a utopia – no sentido literal de um lugar que não está no presente – da competitividade, da redução da burocracia e das novas matrizes econômicas, tem sido a tônica das Câmaras Setoriais. Como criar uma Comissão a revelia dessa instância democrática, legalmente constituída e representativa ou, pior, sem a inclusão dos interessados? É temerário, pois buscar benefícios aos parceiros, aliviar seus apuros, sem saber de fato onde mesmo é que o sapato aperta. Por que não provocar as Câmaras Setoriais?
Soluções por encomenda
Fomos consultar o empresário Denis Minev, que emprestou ao Planejamento da governança estadual uma importante contribuição ao estruturar as Câmaras Setoriais em seus primórdios. Para ele, “As Câmaras Setoriais são um importante instrumento para o Governo que, infelizmente, é pouco utilizado. Em minha experiência na gestão pública, eu trabalhava, tinha como objetivo principal na relação com as câmaras setoriais era de "encomendar" soluções. Pedia que as câmaras vislumbrassem melhorias nos seus setores sob o alcance do Governo. Sempre há algumas coisas muito simples (muitas vezes ligadas à redução da burocracia) que o Governo não faz por falta de conhecimento. Acho inclusive que essa seria a encomenda que eu pediria hoje, que as câmaras buscassem formas de simplificar a atuação do governo na fiscalização e promoção de atividades econômicas; parece-me o item principal da agenda atual. Para dar certo, é preciso que as câmaras mostrem resultado, para atrair maior volume de participantes. A vantagem das câmaras, como espaço institucional e democrático, legalmente constituído, é a representatividade de suas proposições. Ninguém é iluminado isoladamente e nesse momento de solavancos, o debate na troca de experiências faz a diferença.
Densidade de proposições
Basta olhar pautas, atas e temas das Câmaras Setoriais. Viabilidade do Projeto “Interiorizando o Desenvolvimento do Polo Industrial de Manaus - PIM, onde a Federação da Agricultura do Estado do Amazonas, interessada no planejamento de seus associados, busca a manifestação da FIEAM, CIEAM e AFICAM para saber os potenciais negócios da agroindústria para serem desenvolvidos no Estado do Amazonas de possível interesse do PIM. Em seguida, um informe, seguido de debates, sobre a situação do Polo Mineral especificamente sobre a situação do Potássio no Estado, os entraves jurídicos, as expectativas do mercado, as contradições entre o formalismo legal e a viabilidade operacional das iniciativas de sua materialização, sem descuidar a distribuição do questionário para avaliação dos serviços terceirizados no PIM quanto à eficiência e qualidade dos serviços, bem como a sondagem entre os participantes sobre o nível de satisfação com os integrantes das Câmaras. Na mesma pauta, o Informe da FIEAM, simbolicamente mantido na programação como sutil e singela homenagem ao saudoso Flavio Dutra, um documento sobre avaliação do consumo de Alimentos no PIM. E para não deixar no esquecimento, as Entidades FIEAM e CIEAM, entregaram para a Secretaria da Câmara sua PROPOSTA com os Itens do PLANO DE GOVERNO ABAIXO, destacando as prioridades. Cabe destacar algumas: Aumentar, em conjunto com a SUFRAMA, os investimentos em pesquisa e desenvolvimento; Desenvolver, a partir de matérias-primas encontradas na região, produtos farmacêuticos e biocosméticos; Desenvolver o Polo Gás-Químico; Explorar novas áreas de mercado (Navipeças); Incentivar a Economia Criativa nos empresários da região; Atrair empresas que utilizem tecnológicas avançadas para a região; Articular a implantação do projeto que liga o Atlântico ao Pacífico, através das hidrovias amazônicas; Articular a integração econômica regional dos Estados e Países fronteiriços; Implantar unidade gestora de logística responsável pela articulação e questões de transportes aéreo, rodoviário e hidroviário e Desenvolver o potencial logístico de municípios estratégicos no interior.
Antecedentes históricos
A ideia das câmaras setoriais no Brasil começou a surgir no final dos anos 80, na época da hiperinflação, quando a negociação de preços e salários tinha ficado insustentável para ser resolvida ao nível exclusivo do poder executivo. O primeiro instrumento legal que institucionaliza as câmaras atribui a elas funções mais amplas do que as previstas inicialmente. O Decreto No. 96.056, de 19 de maio de 1988, que reorganizou o Conselho de Desenvolvimento Industrial (CDI), estabelece que seu presidente instituiria câmaras setoriais constituídas por representantes de órgãos governamentais e da iniciativa privada, “para elaborar propostas de políticas e de programas setoriais integrados”. O objetivo deste instrumento de consultas que antecedem medidas de governança, era de “elaborar diagnósticos de competitividade setorial, identificar as causas das distorções existentes e indicar as estratégias para seu equacionamento”. As câmaras representam, em seus antecedentes, um rompimento em relação ao corporativismo autoritário, tradicional no Brasil, fazendo emergir um novo modelo de representação de interesses centrado na busca da constituição de uma dinâmica de convergência. E outros argumentos a favor das câmaras incluem a necessidade de minimizar custos de transação e a assimetria de informações. Com base num ambiente institucional propício pode se conseguir um avanço no acesso e socialização a informações. O Estado reconhece, desta forma, que depende dos atores privados para a implementação de suas políticas, ajudando a legitimar as ações da burocracia estatal. A criação das Câmaras Setoriais teria servido, assim, para amenizar a racionalidade limitada do Estado, o que impactaria no aumento da eficácia dos interesses de ambos os setores: de um lado o público que pode tornar suas políticas mais legítimas e do outro, o privado, que consegue um ambiente institucional mais favorável às suas atividades.
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Esta Coluna é publicada às quartas, quintas e sextas-feiras, de responsabilidade do CIEAM. Editor responsável: Alfredo MR Lopes. cieam@cieam.com.br
Publicado no Jornal do Commercio do dia 27.11.2015