01/07/2016 12:28
A indignação generalizada contra os propósitos tributários da poligonal desmesurada da Companhia Docas do Maranhão – Codomar, “em nome da Lei”, como argumentaram seus enviados, na audiência do último dia 22, retrata uma revolta que seria preciso transformar-se num movimento organizado para identificar o que diz a Lei e a Justiça a respeito da discussão. Essa atitude indignada se baseia na célebre equação entre custo x benefício. O custo de generosos impostos e a contrapartida de benefícios tímidos, rigorosamente pífios. Para quem tem o estigma de paraíso fiscal, a economia da ZFM recolheu em 2009 54,42% da riqueza produzida, e antes ou depois desta data, o percentual não difere substantivamente. A Codomar, credenciada por convênio de 2008, tem por atribuição legal “...descentralizar os serviços de infraestrutura portuária e hidroviária prestados pelo DNIT nas hidrovias da Amazônia Ocidental (AHIMOC), da Amazônia Oriental (AHIMOR), do Nordeste (AHINOR), do Tocantins e Araguaia (AHITAR), do São Francisco (AHSFRA), do Paraná (AHRANA), do Paraguai (AHIPAR) e do Sul (AHSUL), bem como nos portos fluviais que as integram, em conformidade com as condições estabelecidas no Plano de Trabalho descrito no Convênio”. Entre os compromissos, estão, há duas décadas, para dar exemplo de demanda decisiva, o balizamento das hidrovias do Rio Madeira e do Rio Purus, duas referências históricas de cabotagem no ciclo da borracha, que o Brasil insiste em ignorar desde então. Nada aconteceu depois do tal convênio. Nem antes. No Estado, com o direito de quem recolhe para a União três vezes mais do que recebe, a Codomar se misturou e se confundiu com DNIT, seu contratante, para realizar um compromisso de 2005, do então ministro dos Transportes, de construir um porto em cada município ribeirinho, 59 no total. Dessa mesma época, curiosamente, foi anunciada a recuperação da BR 319. Promessas atreladas a temporadas eleitorais. Foram iniciadas e/ou concluídas a construção de 14, sendo que os 6 primeiros foram a pique, por erros de engenharia.
Alegoria Logísticas
Vale lembrar que a única ação federal efetiva na área de transportes, vital para a economia, foi um armazém de cargas no aeroporto de Manaus, na gestão Lula. O Amazonas acendeu as próprias esperanças com a presença de um parlamentar na relatoria da nova Lei dos Portos. Esperava-se o desembaraço legal ou a contrapartida de infraestrutura para a generosa arrecadação fiscal deste Estado. Em 2008, assim como em 2012, foram anunciados com pompas e circunstâncias bilhões de investimentos para o Brasil em geral e para o Norte do país em particular, a região mais desguarnecida em infraestrutura. À parte o investimento do agronegócio no programa ArcoNorte, para desentupir os portos do Sudeste travados na safra dos grãos, uma ponte de prioridade questionável que, junto com um estádio sem eventos para justificar o investimento, nada foi feito em favor da Logísticas dos transportes. É eloquente e contundente a sensação do abandono para o setor, sugerindo um vento discreto de que a competitividade não pode avançar.
Salve-se quem puder!
O Brasil segue na última colocação em estrutura rodoviária, ferroviária, quilometragem de dutos e polidutos e, a despeito da imensidade dos rios amazônicos, o item hidrovias é uma tragédia. A Bélgica, com um portfólio de 700 anos em navegação fluvial, balizamento, estabilização e recuperação de hidrovias, tem cutucado o Brasil para nossa vocação logística florestal/fluvial, a cabotagem. Nunca é demais recordar que, além da descoberta do processo de vulcanização que permitiu industrializar o látex, a navegação de cabotagem, infraestrutura coerente com a vocação logística da economia regional, viabilizou o Ciclo da Borracha há 100 anos. Os ingleses investiram pesado na construção de barcos e portos, para agregar 60% de crescimento na própria economia na virada do século 19, e na modernização agrícola de cultivo da seringueira. O agronegócio do Centro-Oeste investiu pesado – com o peso parlamentar de sua bancada – para assegurar as rotas de exportação de grãos a partir da Amazônia. No modal rodoviário, são 4 milhões/km de rodovias asfaltadas nos EUA, 1,5 milhão na China e 196 mil no Brasil, no modal ferroviário EUA despontam com 226 mil quilômetros, os chineses, com 74 mil, e os canadenses, com 48 mil, e na comparação com as brasileiras, anotamos apenas 29 mil. O contraste é mais espantoso, quando se trata do transporte hidroviário. Apesar de sua invejável malha fluvial, o Brasil tem apenas 7 mil quilômetros de hidrovias, enquanto os Estados Unidos têm 41 mil, a China, 124 mil, e a Rússia, 102 mil. O balizamento do rio Madeira, uma promessa de investimento que já está prestes a completar duas décadas, continua debaixo d’água.
À margem da Lei
A mesma União, desarticulada em sua atuação na Amazônia, compulsiva por novos impostos, insiste em vetar a presença de novas indústrias no Polo Industrial de Manaus, vetando a liberação de novos PPB’s, os processos produtivos básicos de implantação e diversificação de novos produtos. Um desgaste que se perpetua e proíbe o reflorescer da economia local implodida pela crise. A Lei prevê o máximo de 120 dias para liberação. Os projetos tramitam entre a Suframa e Brasília, causando danos de toda ordem, às vezes por dois, três, cinco anos de burocratização e veto indireto, sob alegação do "desequilíbrio regional que isso pode causar", uma alegação fantasiosa para um estado que detém uma das menores taxas de estabelecimentos produtivos. O próprio MCTI fez um levantamento junto a Confederação Nacional da Indústria, mostrando que o Brasil possui 519.624 Indústrias. O estado do Amazonas é o 22º do ranking com apenas 3.302 (0,64%). Está a frente apenas de SE, TO, AC, AP, RR. Apesar de ser o 4º em nível escolaridade (RR, SP, BA, AM). O estado Pará é o 14º - com 6.847. Já o Sudeste, a região mais rica do Brasil, que usufrui mais de 50% da renúncia fiscal do país, concentra 243.730. Pesos e medidas, custos e benefícios, ignorância ou má-fé... A Constituição recomenda a adoção de incentivos fiscais justamente para reduzir as desigualdades regionais. E é exatamente o mandamento constitucional que exclui apenas 5 itens que não podem receber incentivos: armas e munições, fumo, bebidas alcoólicas, automóveis de passageiros e produtos de perfumaria ou de toucador, preparados e preparações cosméticas. Portanto, a restrição consolidada na invenção do PPB é absolutamente inconstitucional. À sombra nebulosa da lei e no exercício da ganância fiscal, aqui desembarca, como uma assombração da competitividade, a Companhia Docas do Maranhão, a Codomar... Não dá para encarar!
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Esta Coluna é publicada às quartas, quintas e sextas-feiras, de responsabilidade do CIEAM. Editor responsável: Alfredo MR Lopes. cieam@cieam.com.br
Publicado no Jornal do Commercio do dia 01.07.2016