03/09/2021 09:43
Alfredo Lopes (*)
Em sânscrito, a cruz suástica, ou cruz gamada, significa aquilo que traz felicidade, ou sorte. Com cinco mil anos de história, este símbolo está nas religiões budistas e hindus, entre os índios astecas, povos celtas e na antiga Grécia e, especialmente, nos traços da cultura marajoara, os povos mais evoluídos da Hileia. No século passado, a cruz foi demagogicamente escolhida para representar o nazismo. Se o desafio é enganar o cidadão, o que não falta é imaginação. Enfim, qual dos significados cruciais podem traduzir este momento Amazônia?
Olhando pelo retrovisor
Aliás, alguém sabe dizer quem inventou, porque o fez e o que significa o tal festejo do Dia da Amazônia? Precisamos visitar a História desta esfinge se quisermos saber como funciona a dinâmica do presente e as premissas de transformação na direção do futuro. E de quebra, talvez, descobrir que a Amazônia emprestou do Estado do Amazonas a data de sua celebração, o 5 de Setembro. Ou ainda concluir que a Amazônia, a cada ano que passa, padece de motivos para celebrar sua existência. Neste dia 5, a História registra a elevação do Amazonas - até então uma região sob o domínio central do Grão-Pará - à categoria de Província, com autonomia financeira e administrativa, no ano de 1850. Há muitas histórias contidas dessa data que precisam ser visitadas, incluindo o genocídio da Cabanagem perpetrado pela Coroa Brasileira.
Os propósitos que levam ao caos
O fato é que estamos vivendo um período longo de debates, ou bate-boca, desinformações, distorções e muita, muita destruição. O verdadeiro ensaio de fatalidade na direção do caos. Tudo já foi dito e pouco tem sido feito para justificar celebração ou para alimentar expectativas de transformação. De um momento para o outro, o que não falta é especialista em floresta, e o que mais sobra são equívocos sobre sua gestão. Com certeza, não é desta política ambiental atual que viveremos. Muito pelo contrário.
Seja feita a vossa vontade
A data, porém, recomenda que deixemos de lado, por uns instantes, este equívoco fatal, e façamos uma visita a uma sombria passagem de nossa história que recorda algumas presenças predatórias em múltiplos sentidos, ou seja, associada ao desembarque estrangeiro na Terra dos Sateré-Mawé, nação síntese no coração da Amazônia Índia. A façanha em questão descreve a saga sombria de Nelson Rockefeller, um magnata americano do petróleo, e Cameroun Towsend, um pastor protestante que trabalhava na Amazônia servindo a Deus e a Mamona, religiosamente repassada pelo tal magnata, que financiava suas peripécias perversas. Essa história foi contada pelo casal Gerald Colby e Charlott Demett nos anos 90, num livro de 1059 páginas, chamado “Seja feita a vossa vontade: a conquista da Amazônia- Nelson Rockfeller e o evangelismo na idade do petróleo”.
Aliados disfarçados
Revisitar o livro é compreender a ambiguidade e o oportunismo do olhar estrangeiro e seus reflexos entre os atores locais, muitos deles transformados em aliados disfarçados. Em qualquer dos polos, a Amazônia tem sido secularmente uma moeda de troca, mercadoria destratada, a serviço do imediatismo nefasto e sob o olhar cúmplice do gestor de plantão. Não ha Ciência nas investidas truculentas dos aventureiros procedentes do Tio Sam. Henry Ford e Rockfeller pouco se diferenciaram de Daniel Ludwig, outro bilionário que sonhou transformar a floresta Amazônica na maior produção mundial de celulose. A lógica gananciosa da devastação a todo custo. Todos foram movidos pelo sonho equivocado do Eldorado. Essa lógica da devastação e da destruição que os caracterizou permanece atualíssima e nada indica que cederá lugar a outras escolhas. Assim será enquanto perdurarem líderes incautos, sem propósito nem compreensão deste universo fantástico chamado Amazônia. O último jardim do mundo que a civilização dos estúpidos está destruindo.
Combate ao esquerdismo
Voltando a Rockfeller, e seu parceiro pastor, ou impostor(?), é importante destacar que além de petróleo e bancos, ideias fixas do emblemático cidadão, sua presença na Amazônia estava relacionada a compromissos com o governo americano para evitar que o regime de Fidel Castro se estendesse para região. Vivíamos os anos 60, e na Amazônia era muito aquecida a tal da Guerra Fria. O que restou do esquerdismo, é bom rever a história, foi um país mais capitalista que o capitalismo universal.
A expectativa da inovação
É engraçado que essa paranoia também perdure até nossos dias e em nome dela, tudo que é blasfêmia pode ser proclamada. Existem outras, que abominam a ideia de uma gestão brasileira competente, apta a interessar-se pela inserção de vetores de inovação tecnológica para expandir as verdadeiras e perenes riquezas da Amazônia. É bem verdade que temos anotado belas iniciativas de interpretação, valorização e sistematização de saberes que a Amazônia pode oferecer a sua gente e à humanidade. Estamos acompanhando com entusiasmo essa luz que tremula em meio ao horizonte sombrio do desmatamento e das queimadas.
“Amai-vos uns aos outros?”
Voltemos ao missionário emissário da ganância. Cameroun Towsend não estava tão preocupado em disseminar a boa nova do Evangelho. Aliás, essa doutrina de “amai-vos uns aos outros” não combinava com sua missão traçada pelo magnata. Repartir o pão, como fizera o Nazareno na Santa Ceia, não estava entre seus propósitos. Sua tarefa, regiamente remunerada, era repassar para o rei do petróleo aonde estavam as perfurações do ouro negro na Amazônia. Além disso, deveria informar eventuais movimentações populares com influência comunista. Este é um dos mais escabrosos relatos da política imperialista dos EUA da América. Esta dupla e seus conterrâneos da cobiça desvairada deixaram um rastro e um paradigma de destruição da natureza, da cultura amazônica e da esperança dos nativos de construir uma relação proveitosa no trato da Amazônia com os demônios sob a pele de cordeiros. Em breve voltaremos ao assunto.
(*) Alfredo é editor-geral do portal BrasilAmazoniaAgora e consultor do CIEAM.
Publicado em: Brasil Amazônia Agora