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Amazônia - no país das águas falta previsibilidade, planejamento e gestão

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07/08/2024 07:54

“A criação de inventários, coleções e taxonomias surpreendentes, que adormecem nos escaninhos das instituições de pesquisa, pode levar ao conhecimento e ao aproveitamento sustentável dos recursos hídricos, da flora, fauna e minerais da Amazônia, promovendo um desenvolvimento que não comprometa as gerações futuras, mas comece na consideração das atuais demandas humanas e institucionais em favor de uma nova consciência e civilização”.

Anotações de Alfredo Lopes - Coluna Follow-up 06.08.2024

Dizemos com ufanismo irrelevante que dispomos na Amazônia de 20% da água doce do planeta, o recurso natural mais precioso da Natureza. Entretanto, nada temos feito para prever, planejar e administrar os fenômenos extremos da crise climática que ameaçam o acesso a esses recursos. Triste Amazônia, com seus vastos rios e afluentes, decantada como uma das maiores reservas de água doce do planeta, e negligenciada como uma esfinge que desafia a competência de seus governantes. Será, assim, tão improvável a gestão sustentável de seus recursos hídricos, sua flora, fauna e minérios? Ou não passam de narrativas as soluções vitais para a humanidade, passando pelos serviços ambientais, aproveitamento inteligente da biodiversidade, sua contribuição para o equilíbrio climático e o bem-estar das populações locais?



Imagem criada por inteligência artificial

Em 2005, o cientista Enio Candotti ficou estarrecido com a notícia da descoberta do monumental aquífero Içá-Solimões, e pasmo quando soube dos recursos pífios destinados à sua pesquisa, refletindo e repetindo o velho descaso e habitual subinvestimento em ciência e tecnologia para a Amazônia. Recentemente, a Agência Nacional de Águas e Saneamento Básico (ANA) declarou uma situação de escassez quantitativa de recursos hídricos nos rios Madeira e Purus, sem mencionar a gravidade do Alto Solimões. Há muita urgência de medidas para lidar com episódios extremos de escassez das águas. Saudoso Candotti, mais uma vez constatamos a falta de previsibilidade, planejamento e pudor no trato da Amazônia.

E qual a importância dos recursos hídricos na Amazônia? Podemos começar por seu papel na pujança da biodiversidade. Os rios amazônicos abrigam uma enorme variedade de espécies aquáticas, muitas das quais são endêmicas. A conservação desses habitats é crucial para a manutenção da biodiversidade regional. São as águas que oferecem o substrato essencial para a proteção e evolução da vida e de seu viço.

Sem água não há agricultura, pesca, ou seja, manutenção da vida. As águas da Amazônia são fundamentais para a agricultura de subsistência, familiar ou extensiva. E para a pesca, atividades essenciais para a segurança alimentar das comunidades locais e hidratação do agronegócio, dos reservatórios, da existência humana. De quebra, os rios da Amazônia desempenham um papel vital no ciclo global da água, influenciando padrões de precipitação e contribuindo para a regulação do clima. Entretanto, quando este mesmo clima mostra o reverso de sua anti-gestão, tudo fica ameaçador.

Não são discretos os desafios na gestão dos recursos hídricos. O descaso facilita o desmatamento e acelera a degradação ambiental. A destruição das florestas impacta diretamente os cursos d'água, resultando em assoreamento, mudanças no regime de chuvas e diminuição da qualidade da água. Estamos assistindo ano a ano as queimadas expandindo seu volume e duração que nos impõem inalar fuligem boa parte do ano.

Projetos de infraestrutura, como hidrelétricas e mineração, sem a devida previsibilidade e planejamento, têm causado danos significativos aos ecossistemas aquáticos, afetando tanto a fauna quanto as populações humanas. A seca nas bacias dos rios Madeira e Purus, por exemplo, está impactando a geração de energia nas hidrelétricas Jirau e Santo Antônio, além de comprometer a navegação e o abastecimento de água. A expansão das áreas urbanas e o aumento da população na região amazônica pressionam os recursos hídricos, exigindo uma gestão eficiente para garantir a gestão da qualidade e da disponibilidade da água.

Iniciativas e Soluções Sustentáveis

Impõem-se projetos de proteção de nascentes e rios. Projetos de conservação e restauração de aquíferos de superfície e reflorestamento das margens de rios são fundamentais para garantir a qualidade e a continuidade dos recursos hídricos. A adoção de sistemas agroflorestais que integram a agricultura com a conservação florestal ajuda a manter o solo e os recursos hídricos protegidos. Investimentos em infraestrutura de saneamento básico são essenciais para prevenir a poluição dos rios e garantir água potável para as comunidades.

Vazantes, a improvisação por base

Estratégico para a logística industrial e comercial de Manaus e Região Metropolitana, o rio Madeira enfrenta vazantes cada vez mais alarmantes que prejudicam a navegação, aumentando os tempos de viagem e reduzindo a carga transportada, o que eleva os custos de frete e ensaia a paralisação do tráfego. Soluções adiadas e intervenções descabidas. Similar ao Madeira, o Purus também é vital para a logística e o abastecimento das populações ribeirinhas. A redução do nível das águas compromete o transporte de mercadorias e o acesso a comunidades isoladas. A quase 1000 km de Manaus, o Solimões é crucial para o acesso a áreas remotas, aonde só se chega pelo rio ou de avião, com tarifas impraticáveis para a absoluta maioria da população. As vazantes agravam ainda mais a situação, dificultando a chegada de produtos e serviços essenciais.

Lições de um colóquio importante

Sob o tema Dragagem e Sedimentos, num colóquio recente, o professor Augusto Rocha, da Comissão CIEAM de Logística, pautou o desafio das vazantes e da urgência na gestão dos recursos hídricos, com o professor André Martinelli, alertando para a importância da pesquisa e do planejamento para resolver os desafios da Amazônia. Publicado no YouTube, [vídeo do debate]

o debate abordou como a falta de pesquisa pode esconder soluções, algumas prosaicas e outras surpreendentes, para enfrentar os grandes desafios da região.

Ao debater a questão dos sedimentos, foi mencionado que grandes quantidades de sedimentos vêm dos Andes e do deserto do Saara, chegando à Amazônia em quantidades assustadoras. E como gerenciar o problema, quanto tempo e qual o investimento necessários para entender como esses sedimentos se movem, crucial para a navegação da hidrovia que acessa Manaus. Segundo as estimativas, um modelo inicial de três anos é ideal para desenvolver uma metodologia robusta, com um projeto bem construído e transversal, que inclua hidráulica, transporte de sedimentos e climatologia.

O colóquio enfatizou a necessidade de um projeto inicial de três anos para construir uma metodologia eficaz, aproveitando os melhores equipamentos e técnicas disponíveis. Com um investimento satisfatório, seria possível montar um panorama detalhado e subsidiar decisões futuras para assegurar a construção de hidrovias. Para ilustrar com exemplos internacionais, foi utilizado o Canadá, que tem programas de monitoramento de bacias hidrográficas altamente eficientes. Soluções viáveis poderiam ser testadas em laboratório antes de serem implementadas, seguindo exemplos de outros países que otimizam a execução de projetos complexos.

E qual é o dever de casa se o assunto desembarcar na busca de soluções? A gestão sustentável dos recursos hídricos na Amazônia é uma tarefa complexa que exige a colaboração entre governos, setor privado, as comunidades locais, entidades de classe e organizações não governamentais. Somente através de ações coordenadas e inovadoras será possível garantir que a Amazônia continue sendo uma fonte vital de água doce para o mundo e um bastião da biodiversidade global em favor de sua gente e seus desafios de desenvolvimento.

Os episódios reincidentes de escassez hídrica ressaltam a necessidade de orçamentos federais específicos para aportar investimentos em pesquisa e infraestrutura. Uma aposta com garantias prévias de benefícios para a região e para o país, como destacava Enio Candotti em 2005 ao alardear a riqueza subterrânea dos aquíferos. A criação de inventários, coleções e taxonomias surpreendentes, que adormecem nos escaninhos das instituições de pesquisa, pode levar ao conhecimento e ao aproveitamento sustentável dos recursos hídricos, da flora, fauna e minerais da Amazônia, promovendo um desenvolvimento que não comprometa as gerações futuras mas comece na consideração das atuais demandas humanas e institucionais em favor de uma nova consciência e civilização.

Fonte: BrasilAmazôniaAgora

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