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Amazonas: a síndrome do Curupira

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09/02/2023 14:40

Por que o Amazonas não consegue ajudar o Amazonas? Dito assim a pergunta parece sem nexo. Mas se recorrermos à mitologia da floresta, invocando um de seus mais populares personagens, o Curupira, ficará tudo mais fácil. O Curupira é o protetor das matas e dos seres vivos que nela habitam. Sua aparência chama a atenção por seus cabelos pintado de urucum e seus pés ao contrário – com os calcanhares para frente.

Por isso, alguém que costuma dizer que já o viu, facilmente entra em descrédito, pois ao andar pela floresta, suas pegadas conduzem ao lugar onde ele sempre não está. Uma esfinge às avessas, que precisa ser decifrada para ser compreendida e valorizada em suas atribuições. Qualquer coincidência é rigorosamente proposital.

No último Diálogos da Amazônia, apresentado pela Fundação Getúlio Vargas, dia 06.02.23, os debatedores – Jaime Benchimol e Luiz Augusto Rocha, empreendedores no segmento de energia e têxtil, respectivamente – contaram, sem usar a nomenclatura regional, porque a economia do Amazonas vive a síndrome do Curupira. Ambientalista, protetor da biodiversidade, mas atacado por todo lado, o Amazonas é incompreendido, individualista e com a pecha de privilegiado, por seus quase 8% dos incentivos dos gastos fiscais do Brasil, e sempre atormentado e às vésperas da própria remoção.

Em qualquer banzeiro fiscal, vira bode expiatório. E é este o único momento em que sai da toca, junta seus pares, põem as gravatas e, em comitiva, partem – de pires na mão para Brasília pedir a benção e comiseração.

Como tudo isso se repete há mais de meio século, e sempre resultam nos mesmos ovos, a continuidade da Zona Franca de Manaus, a galinha dos ovos de ouro do Brasil, precisa mudar sua mandinga de sobrevivência. Mudar a tática e inventar estratégias, com a consciência de que a ZFM produz muita riqueza, apesar da região ocupar o topo do ranking da pobreza nacional. Quem sabe descubramos a razão dessa proeza sinistra não ter fim…Vamos voltar aos Diálogos da FGV e reproduzir algumas das constatações e proposições dessa economia da monotonia.

Sim, a Zona Franca é do Brasil, não do Amazonas, pois o maior beneficiário é o caixa único do poder público que confisca 75% do que é apurado na economia da ZFM. A população brasileira, por sua vez, pode comprar os produtos Made in ZFM, de classe mundial e a preços acessíveis. E o povo do Amazonas, da Amazônia, como fica: ora, vive do jeito que a mídia consegue enxergar e traduzir, retratando o Curupira sem nunca se empenhar em decifrar seus enigmas.

– No último Diálogos da Amazônia, ficou demonstrado que nenhuma iniciativa no curto, médio e, se nada for feito, a longo prazo, será capaz de gerar 500 mil empregos, entre diretos e indiretos, e recolher tantos recursos para a máquina pública. A ZFM gerou US$32 bi no ano passado. Isso coloca o Amazonas entre os primeiros estados a carregar o Brasil nas costas. Quanto o Leão vai abocanhar e quanto vai sobrar para a população? E que atividade fabril/empresarial seria capaz de uma liquidez com essa envergadura?

– No âmbito estadual, a ZFM responde por 85% da movimentação da roda da economia e gera empregos e oportunidades por todo o país. Em suma, longe de ser uma Zona Franca, Manaus é o Baú da Felicidade da Receita Federal e da Fazenda Estadual, graças a capacidade instalada de seus trabalhadores e investidores para produzir dinheiro e alegrar governos.

E que vantagem o Curupira leva? É hora, pois, de voltar à pergunta inicial: Por que o Amazonas não consegue ajudar o Amazonas? Algumas perguntas aos navegantes.

– Por que os empreendedores da piscicultura sempre foram obrigados a pagar 22% de ICMS numa saca de milho que vem do Centro-Oeste, fora o frete? O INPA tem classificado em suas coleções mais de 3 mil espécies de peixe. Reproduzi-los em tanques naturais significa debelar a fome do mundo. Esse empate vesgo e obtuso se aplica à taxação das comunicações, transporte, energia, as mais caras do Brasil. Por que o custo de vida de Manaus é um 2º mais caro do país? As aberrações são muitas e contorna-las é ganha-ganha geral.

– Por que, em trajes de Curupira, não vamos a Brasília exigir o que manda a Lei Maior do país quando autoriza menos de 8% dos incentivos que o Brasil utiliza: que seja aplicada na região a riqueza produzida por esta região. Ao menos parte dela?

– Por que não balizar as hidrovias se a logística fluvial é a mais barata e mais correta ambientalmente?

– Por que a bancada parlamentar da região não vai exigir contrapartidas prosaicas, elementares e fundamentais de quem recebe tantos recursos? Restaurar as duas únicas rodovias, em total estado de abandono?

– A última rodovia construída no Amazonas é de 1998, governo FHC. Eram necessárias à época 8 horas de carro entre Manaus a Boa Vista, hoje, quando os buracos permitem, são mais de 20 horas. A penúltima rodovia a BR 319, é de 1976, governo militar. Maior parte do ano intransitável.

– Ah, mas a pressão internacional não permite estradas na floresta! Sonífero bovino. Conta outra. “O Amazonas que fique quieto, já tem a ZFM”. Além da miséria, claro. Quem vigia a BR174 são os indígenas Waimiri Atroari. E quem expulsa o garimpo ilegal não seriam as Forças Armadas, Guarda Nacional? Os grileiros também não podem ser enxotados?! Então não cola a prosopopéia ambientalista de impedir as estradas para evitar a extinção do mucuim. Proteger a floresta é sobretudo atribuir-lhe uma finalidade econômica e sustentável. Ou não?

O que, portanto, nossa generosidade pecuniária pode fazer pelo Amazonas? Tenhamos certeza, seja lá o que for, vai beneficiar também o resto do país, como temos feito historicamente. Desde o Ciclo da Borracha, quando o Brasil recebia da floresta o equivalente ao 45% de seu PIB e já rezava o Pai Nosso do jeito como sempre faz, só até a primeira estrofe. “Venha a nós o vosso Reino”, diria ao Curupira! Até quando?

Fonte: Portal Brasil Amazônia Agora

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