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Coluna do CIEAM

Além e à margem da BR-319 Parte II

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03/10/2014 10:40

Atrelada à ligação do Amazonas ao resto do país, no sentido amplo do termo, há um silêncio obsequioso, que sintetiza um jeito frequentemente omisso de ser e de enfrentar, por parte dos atores locais, os graves problemas que emergem – no contexto dos acertos do modelo ZFM – de suas contradições e disparidades econômicas e sociais. Eis, pois, um bom argumento para ilustrar a prosa sobre o sentido político das eleições deste domingo. A quem interessa mobilizar os protagonistas dessas questões para começar a enfrentá-las em conjunto a partir de 2015? É incoerente exigir a prorrogação da ZFM em nome da redução das desigualdades regionais e nos omitirmos no combate da inaceitável disparidade socioeconômica entre a capital e os índices miseráveis de sobrevivência do interior. O desafio para justificar a viabilidade econômica, social e ambiental da BR-319 é apenas mais um paradoxo e vai além – ou é historicamente anterior – ao circunstancial debate eleitoral. Ele é político em sentido amplo da decisão que confronta e põe em pauta, ou não, a autonomia deste estado em apropriar-se da gestão de seus gargalos e, através de uma liderança gerencial e parlamentar, assegurar seu equacionamento. Cabe perguntar: qual é a diferença técnica e financeira entre asfaltar a BR-319 e/ou a dragar o leito do Rio Madeira, balizar sua navegação, que é ambientalmente mais adequada e economicamente comprovável, em todos os parâmetros de estimativa e planejamento? Os ingleses são autores dos estudos mais detalhados da navegação na Amazônia, desde o Século XIX, quando perceberam este imperativo logístico de aproveitamento das riquezas, com os respectivos negócios, razão de suas injunções diplomáticas no âmbito do governo do Brasil, antes de investirem 200 milhões de libras esterlinas nos estaleiros da Escócia, na construção de embarcações adaptadas às especificidades da malha fluvial tropical. Hoje, eles comprovariam sem pestanejar o avanço substantivo na competitividade do Polo Industrial de Manaus, se planejada com a exportação de grãos pela hidrovia do Madeira, a partir do Centro-Oeste.

O modal hidroviário


Nesse contexto ganha sentido o estudo da viabilidade econômica, social e ambiental da rodovia e da hidrovia e sua eventual combinação e conjugação. Ainda argumentando o modal fluvial, temos omitido a luta por ajustes na ineficiência operacional, avaliação/revisão e mudança dos custos, na ineficiência, falta de confiabilidade e precariedade operacional dos portos, adicionados aos prejuízos com a maldita burocracia. Assim abordada, a ligação hidroviária com o resto do país, via Porto Velho, asseguradas essas premissas, seria muito mais inteligente, ambientalmente adequada, financeiramente rentável – com tarifas internacionais, o modal hídrico cairia à metade dos custos atuais – e, de quebra, seria turisticamente mais bucólica para quem quisesse desfrutar a experiência amazônica. E quem não iria querer depois de uma divulgação publicitária desse nicho turístico? Pois é..., até aqui, porém, quarenta anos depois da inauguração da BR-319, não decidimos internamente se queremos, pra valer, ou não, essa ligação com o Brasil a despeito dos custos que ela representa. É um volume robusto de recursos para asfaltar de qualquer jeito, como postulam alguns, para depois saber como é que fica. Recuperar a BR-319 é um excelente exercício de pressão política. Basta que os atores queiram sentar, conversar e arregaçar as mangas, partindo da premissa que a pavimentação da BR-319 não gerará maior agressão ao meio ambiente, uma vez que a abertura da floresta para a construção da rodovia já aconteceu no traçado original, há mais de 40 anos. Importa, pois, exigir a presença do Estado para garantir uma ocupação de forma ordenada da região.

A drenagem social


Portanto, debater a questão ou a recuperação rodoviária e resgatar a conexão com o resto do país, não se esgota na resolução de apenas asfaltar sem assegurar a drenagem social. Para evitar gastos, conflitos e desmandos posteriores, é imperativo desde já ampliar ou promover a instalação de equipamentos públicos nos municípios do traçado, para atender a demanda por serviços de saúde, educação, suporte jurídico e de segurança, para evitar o aumento de violência, do desmatamento sem plano de manejo e do esgotamento dos recursos naturais no trecho ainda em uso entre Porto Velho e Humaitá. Asfaltar é mobilizar todos os atores da economia e do parâmetro socioambiental que possam integrar desenvolvimento, prosperidade social e sustentabilidade ambiental. Para conservar o estoque natural só há um meio: dar-lhe suporte e finalidade socioeconômica, finalidade essa que no nosso entendimento se justifica pela interligação por terra de todo o território nacional. Em documento encaminhado ao Congresso Nacional em dezembro de 2013, FIEAM/CIEAM reafirmaram a importância da “pavimentação/reconstrução da BR 319, que trará resultados positivos para as empresas instaladas no Polo Industrial de Manaus. São grandes os benefícios que da BR-319 no aspecto socioeconômico, favorecendo a inclusão social e a redução das desigualdades que sofrem as populações que habitam a área de influência da rodovia. A formulação de uma política de desenvolvimento autossustentado não é incompatível com a integração econômica desta área e com a utilização racional do seu patrimônio ambiental. A recuperação da BR-319 é um anseio não só das classes empresariais, mas também, de toda a sociedade que vê nessa obra o fim do isolamento da região, por tratar-se de uma rodovia de integração nacional que irá entre outras coisas beneficiar a economia local”.

Agenda 21


As entidades propugnam “uma política de desenvolvimento autossustentado”, compreendido, no contexto da Agenda 21, como reposição dos estoques naturais e atendimento das demandas sociais. A intuição original da BR-319 era a mesma da implantação do modelo ZFM, na década anterior, anos 60, integrar o bioma amazônico ao país para não entrega-lo à cobiça estrangeira ou ao narcotráfico continental. Essa intuição ganha outros contornos no século XXI, e exige que o país integre a economia e as demandas socioambientais da Amazônia na política industrial, comercial, ambiental e de ciência, tecnologia e inovação. E aí faz sentido debater a necessidade de rever e fazer, eventualmente, em cima de projetos de curto, médio e longo prazo as premissas relevantes da integração nacional. Estas questões foram colocadas no documento entregue pela Ação Empresarial aos candidatos que disputam neste domingo a gestão do Estado. Elas também, indiretamente, se prestam a nortear a escolha da representação parlamentar do Estado, a via da defesa dos interesses da população e do suporte material e econômico provido pelo setor produtivo. É importante recordar que o último grande debate com a bancada parlamentar do Amazonas, sobre os gargalos de infraestrutura que comprometem a competitividade do modelo ZFM ocorreu em abril de 2010 na sede da Federação das Indústrias. De lá pra cá, as dificuldades permanecem e, em alguns setores, se agravaram como a energia que sobra e a distribuição que falta e a comunicação desconexa, lenta e cara que afasta o investidor. Em suma, e em clima de eleição, vale lembrar o princípio segundo o qual, para os males da Democracia só há um remédio, mais Democracia.
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Esta Coluna é publicada às quartas, quintas e sextas-feiras, de responsabilidade do CIEAM. Editor responsável: Alfredo MR Lopes. cieam@cieam.com.br

Publicado no Jornal do Commercio do dia 03.10.2014

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