25/05/2016 14:12
Apesar das insinuações da mídia do Sudeste, segundo as quais a economia da Zona Franca de Manaus deve ser incluída no rombo provocado pelo PSI – Programa de Sustentação de Investimentos, temos demonstrado exaustivamente as diferenças deste arranjo fiscal que a Constituição Brasileira preconiza e o despejo de R$ 362 bilhões até 2014 em empréstimos subsidiados do BNDES para a compra de máquinas e equipamentos, e outras demandas empresariais que aqui não foram ouvidas. O governo encerrou o PSI (Programa de Sustentação de Investimentos) no final de 2015 com um passivo de, pelo menos, R$ 214 bilhões, que entrará na contabilidade da União como dívida pública. Os investimentos em obras como a Arena Amazônia e Ponte Rio Negro, longe de atender às prioridades do setor produtivo, atenderam outros apelos e beneficiaram determinados atores. Em 2009, quando foi criado, o "Bolsa Empresário", o batismo irônico do PSI, a demanda era infraestrutura, notadamente de transportes, com ênfase na questão portuária. Sabe que vantagem a ZFM levou? As indústrias seguem com até 20% na folha de custos para armazenar, desembaraçar e transportar mercadorias. O Norte Competitivo, que diagnosticou e propôs saídas e demonstrativos dos ganhos previstos para os gargalos logísticos, beneficiou o agronegócio e representou apenas ônus para as empresas do Polo Industrial de Manaus, que pagaram a conta do programa e ficaram “parados, pregados, na beira do porto”, a ver navios com fretes e custas portuárias inexequíveis.
ZFM: um bolsa às avessas
O agravamento das contas públicas não é resultado compulsório do PSI. O estrago veio dos critérios de repasse, de prioridades como as da Petrobras, que ficou só com mais de R$ 40 bilhões. Mais do que isso, a ZFM transferiu para os cofres federais desde 2006, sem contrapartida de porto público, comunicação decente e com tarifas competitivas e uma oferta desastrosa de energia. O modelo ZFM, aliás, não tem investimento público, as empresas aqui instaladas só passam a usufruir dos incentivos fiscais a partir do momento em que emitem a primeira nota fiscal de seus produtos. O PSI não deu as caras no Polo Industrial de Manaus. Diferentemente da alta performance deste modelo na geração de emprego e oportunidades no contexto da economia nacional, existe pouca relação entre os recursos liberados pelo programa PSI e a geração de emprego, renda e até o investimento dos tomadores. Como outras ações de caráter messiânico e pirotécnico, por dispensar o debate amplo e a proposição dos envolvidos, o PSI desembarcou na polícia e na justiça, sem mexer com os problemas crônicos e vitais deste arranjo fiscal bem sucedido. A ZFM, a propósito, é um benefício às avessas, pois virou bolsa robusta para o poder central, que a transformou em exportadora líquida de recursos. O Bolsa-Empresário favoreceu o agronegócio do Centro-Oeste e direcionou R$ 5 bilhões para o programa logístico-portuário do Arco-Norte, para desembaraçar o gargalo portuário do Sudeste do país. Para o Amazonas, sequer a recuperação da BR 319 foi autorizada.
Omissão, ignorância ou má-fé
A insinuação de Bolsa-Empresário aplicada a ZFM padece de conhecimento da história, sinaliza a omissão, descaso ou má-fé, para elucidar os paradoxos da relação da Amazônia com o resto do país. Com o fim do Ciclo da Borracha e a matança de 40% da população da Amazônia, sendo 60% da população masculina, o Brasil transformou a região numa Terra sem rosto, sem alma, portanto, sem necessidade de interlocução ou integração pátria. Hoje, na cabeça dos burocratas de Brasília, isto não passa de um território a ser "integrado", ocupado e desenvolvido de fora para dentro, por projetos grandiosos de colonização, mineração, agricultura ou de exploração madeireira. Por isso que o Brasil não entende a Amazônia, muito menos a necessidade e os acertos da Zona Franca de Manaus, cujo mérito é sobreviver pelos acertos que conquistou e, por conta disso, mobilizou a inteligência local em sua defesa. Não faz sentido tanta pressão por aqueles que a espiam à distância sem enxergar seus avanços, acertos, contradições e demandas.
O Brasil nas costas
Os desafetos deste modelo desconhecem a história do Brasil da Bahia pra cima, em direção ao Norte e ao Oeste. Desconhecem que na Amazônia, por exemplo, foi gerado, por trinta anos, quase a metade do PIB anual do país. No auge da produção gomífera, em 1910 – uma economia que agregou valor na geração de riquezas, no PIB da Inglaterra, na ordem de 60% nos anos subsequentes – uma tonelada de borracha valia US$ 105 mil. A Amazônia naquele ano, lembra Denis Minev, produziu 41 mil toneladas. Naquele ano, a Amazônia exportou o equivalente a US$ 2,5 bilhões. Em termos de PIB nacional, em 1910 a Amazônia respondia por 40% a 43% da arrecadação federal. Ao término do ciclo em 1932, a exportação atingiu o ponto baixo de US$ 11 milhões. Quanto aos investimentos feitos na Amazônia neste período, é notável que os grandes investimentos todos foram feitos através de dívida no exterior, como por exemplo a estrutura energética de transporte público, os bondinhos de Manaus (Manaos Tramways and Light Co. financiada em Londres), ou o saneamento em Manaus (Manaos Improvements Co.), o abatedouro (Manaus Markets and Slaughterhouse), os portos (Manaos Harbour e Port of Pará) e a ferrovia MadeiraMamorél. Os recursos gerados na Amazônia durante o período da borracha (que durou de 1870 a 1920) geraram benefícios para o desenvolvimento do Sudeste principalmente com ferrovias e infraestrutura, tanto no Império quanto na República. Ao final do império, havia 9,5 mil quilômetros de ferrovias, que chegaram a 29 mil quilômetros em 1929. Destes 29 mil quilômetros, a presença é nula no Amazonas e insignificante na Amazônia. Apenas a título de comparação, hoje o Brasil possui 30,1 mil quilômetros de ferrovias; não houve avanço na malha desde que a borracha da Amazônia parou de financiar a expansão ferroviária nacional. Voltaremos...
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