01/04/2022 10:51
Chegamos ao cúmulo de constatar a oficialização e legalização desta tragédia, representada pelo Dia do Fogo, em agosto de 2019. Foi uma combinação sinistra feita por fazendeiros da BR163, no Pará, ocorrida no município de Novo Progresso (sic!) e transformado num mote amazônico de destruição.
Por Alfredo Lopes (*)
Antes tarde do que nunca, a justiça brasileira põe em pauta o desmonte da estrutura de proteção ambiental do país posta em prática pelo governo federal. Começou nesta quarta-feira, 30 de março, um debate no colegiado da Corte Suprema de extrema urgência e emergência para o futuro do país e de sua contribuição efetiva para o combate ou agravamento da mudança climática em curso. São sete itens de temas, problemas, ações e omissões referentes à gestão federal do atual governo, suas premissas, equívocos e riscos de comprometimento, encaminhadas por diversas organizações, instituições e agremiações políticas. O Brasil e o mundo estarão acompanhando este debate do qual se espera um basta para os estragos socioambientais, alguns irreversíveis, de inestimáveis prejuízos.
O Brasil, nos últimos anos, desarticulou o Plano de Ação para Prevenção e Controle do Desmatamento na Amazônia, e congelou os recursos do Fundo Amazônia, destinado exatamente para este fim, entre outros. O plano foi desenhado em três eixos principais: ordenamento fundiário e territorial; monitoramento e controle ambiental; fomento às atividades produtivas sustentáveis. Recorde e mais recordes de desmatamento a cada relatório, desmantelamento dos órgãos de fiscalização e anistia ampla, geral e irrestrita para os desmatadores e demais criminosos que atuam na Amazônia. Este Plano, entre 2004 e 2012, reduziu a taxa de desmatamento de 27 mil km² em 2004 — segunda maior da história do país — para 4,5 mil km², em 2012, — a mais baixa já contabilizada até hoje. Ou seja, é possível cumprir o Acordo do Clima, assinado pelo Brasil e reassumido pelo governo federal, em outubro de 2021, na Escócia, onde prometemos zerar o desmatamento da Amazônia até 2030. Cabe à Suprema Corte, neste momento, baseada na Carta Magna, exigir as medidas práticas e instrumentais para o cumprimento deste compromisso. Imediatamente.
Este compromisso da redução do desmatamento, assumido em Glasgow, num discurso presidencial e através da presidência do IBAMA, ou do que restou da instituição, Joaquim Leite, havia sido entregue ao vice-presidente da República, General Hamilton Mourão, sem os recursos ou habilidades para fazê-lo. Foi gasto muito mais recurso do que o orçamento destinava aos organismos constituídos de fiscalização e monitoramento, com resultados pífios. As Forças Armadas, envolvidas na Operação Verde, fracassaram porque apagar incêndio na floresta, sobretudo feito por profissionais, nunca fez parte da formação básica dos militares do Brasil. Chegamos ao cúmulo de constatar a oficialização e legalização desta tragédia, representada pelo Dia do Fogo, em agosto de 2019. Foi uma combinação sinistra feita por fazendeiros da BR163, no Pará, ocorrida no município de Novo Progresso (sic!) e transformado num mote amazônico de destruição.
E, em que medida isso repercute na economia do Amazonas, o que ganha e o que perde o Estado com essa discussão? A Zona Franca de Manaus, estruturada no coração da maior floresta tropical do planeta, é uma economia pujante e, estrategicamente instalada numa região remota, que utiliza como compensação fiscal 7,6% do bolo fiscal do Brasil. Essa economia assentada no Polo industrial de Manaus, se afirmou historicamente como matriz econômica ajustada às condições ambientais. Daí sua performance de contribuição para manter a cobertura vegetal original com mais de 90% de seu acervo protegido. Com o desmonte do controle e proteção da floresta, o Sul do Amazonas passou a integrar o Arco do Desmatamento, no sul do Estado. Ironicamente, a política ambiental do governo liberal – explicitamente contrário ao programa ZFM, encarregou-se de promover a remoção de nosso maior triunfo - além dos 500 mil empregos gerados e patrocínio integral da UEA. Universidade do estado do Amazonas – de compensação dos tímidos percentuais de incentivos fiscais. Resta-nos torcer pela reafirmação da lucidez, firmeza e equilíbrio do Supremo Tribunal Federal, zelador da Lei e tradicional instituição de acolhimento dos direitos constitucionais do programa Zona Franca de Manaus, o maior acerto de contrapartida fiscal para redução das desigualdades regionais.
(*) Alfredo é consultor do CIEAM e editor do portal BrasilAmazoniaAgora