28/12/2023 05:03
Parlamentar brilhante na defesa da Amazônia e da ZFM, de 2006 a 2015, Rebecca Garcia vem de uma família empreendedora, com relevantes serviços prestados ao desenvolvimento regional em diversos setores da economia. Titular da Suframa de 2015 a 2017, Rebecca conseguiu avançar na autonomia financeira e administrativa da autarquia, e incentivar ações, programas e projetos em economia verde por toda a Amazônia Ocidental, mais o Amapá. Com larga vivência em Brasília, reconhece que o Brasil federal permanece de costas para a Amazônia, onde estão os ativos que podem empinar o desenvolvimento nacional.
No retorno ao setor privado, na área de equipamentos e componentes eletrônicos, a GBR da Amazônia, resolveu conhecer, planejar e empreender em Bioeconomia. Ou seja, além de direcionar as verbas de P&D de sua empresa para o PPBio (Programa Prioritário de Bioeconomia) da Suframa, gerenciados pelo IDESAM, implantou uma empresa fincada na biodiversidade amazônica. Confira a entrevista exclusiva.
Por Alfredo Lopes
BrasilAmazoniaAgora – Sob sua governança à frente da Suframa (2015-17) foram priorizados e enfrentados alguns dos principais objetivos e expectativas da sociedade em relação à ZFM. Um desses objetivos foi o de priorizar a Bioeconomia como instrumento de diversificação, adensamento e regionalização da economia. Isso significa que é possível a aproximação sustentável entre economia e proteção florestal da Amazônia? Quais os instrumentos?
Rebecca Garcia – Mais do que nunca a humanidade precisa conciliar economia e ecologia. E isso é possível com certeza, além de ser nossa mais urgente obrigação. Enquanto brasileiros e, sobretudo, amazônidas, temos que construir as condições para nosso modelo econômico de desenvolvimento seja pautado na biodiversidade amazônica a partir de seu conhecimento, de instrumentos tecnológicos e inovadores, mantendo a floresta em pé. Em 1967, a ZFM nasce com o propósito de desenvolver a região e interiorizar o seu desenvolvimento, entretanto, falhamos no segundo propósito. Apesar de nossas imensas potencialidades naturais, temos bolsões de pobreza em toda a Amazônia.
Contudo, temos tudo a oferecer em termos de nutrientes funcionais, dermocosméticos e fitoterápicos da medicina alternativa. E a boa notícia é que vivemos um momento na economia global onde o consumo sustentável levando em conta a origem sustentável dos produtos, a rastreabilidade da cadeia produtiva e o comércio justo. Isso tem ganhado bastante força e nenhuma outra região do planeta tem tanto a oferecer quanto a nossa. A chave nós já temos para fazer prosperar a Bioeconomia: a união da Indústria, a Academia e Comunidades criam um ambiente propício para fomentação dessa nova matriz econômica, a Bioeconomia.
BAA – Tendo em vista a repercussão da Zona Franca Verde, impulsionada em sua gestão, especialmente entre os demais Estados alcançados pela Suframa, qual avaliação você faz dos acertos, gargalos e demandas para consolidação da economia baseada na diversidade biológica?
R.G. O impulso dado à Bioeconomia em minha passagem pela Suframa, com incentivos específicos para a Zona Franca Verde, está ligado a um antigo apelo da Amazônia Ocidental, mais o Amapá, para fortalecer a geração de empregos e oportunidades de expansão da economia regional. E a população atendeu ao recado. A menos de uma semana da entrada em vigor da legislação, do Amapá recebemos solicitação para uma fábrica de sorvetes com frutas regionais. E na Amazônia, as frutas têm sabor e doçura extraordinários.
O Programa Prioritário de Bioeconomia veio exatamente para empinar essa vocação empreendedora tipicamente amazônica. Infelizmente, o interior da Amazônia, especialmente do Amazonas, ainda vive um apagão no que diz respeito à geração de energia, comunicação, logística e infraestrutura para escoamento da produção, itens fundamentais para se dar escala a qualquer produção na área de bioeconomia. E aí enxergo alguns dos principais gargalos que precisaremos vencer para transformar o modelo da bioeconomia em um programa vitorioso de desenvolvimento regional. Nossas instituições precisam desenvolver soluções de infraestrutura ajustadas às peculiaridades regionais.
BAA – Enfim, o CBA, ora chamado de Centro de Bionegócios da Amazônia, definiu seu modelo de gestão. Foram duas décadas de protelação e inegável descaso. Por que Brasília tem tantas dificuldades para gerenciar a economia da Amazônia e seu desenvolvimento sustentável?
R.G. – O fato do CBA ter sido criado – mesmo com todas as dificuldades em torno da sua personalidade jurídica – já significa, naquele momento de sua implantação, no início do Século – um entendimento do potencial da nossa bioeconomia. Por isso, logo vejo como um acerto e, apesar de suas dificuldades, uma antevisão do futuro. Valeu aguardar. Pior seria não termos um CBA, não estaríamos falando dele agora, nem planejando sua melhor aplicação. Quanto a Brasília, expresso aqui uma visão pessoal, não pautada em teses, mas na vivência parlamentar.
Vejo um Brasil de costas para a Amazônia e seu desenvolvimento econômico. Muito usada em discursos simpáticos, empolgados e descompromissados. E no que diz respeito ao meio ambiente, muita desinformação. Uma narrativa pouco pensada e planejada para resolver os problemas das pessoas, dos amazônidas . Essa não é uma afirmação política, mas uma constatação de Brasil durante a sua história de soberania da indiferença.
BAA - Atualmente, depois da experiência bem sucedida na carreira política, você assumiu seu DNA de empreendedora. Que conselhos você daria às lideranças políticas para que os recursos gerados pelo setor privado – 75% repassados ao poder público – fossem aplicados no desenvolvimento sustentável da Amazônia?
R.G. – Além de priorizar o equacionamento dos gargalos de infraestrutura, historicamente adiados em seu enfrentamento, é preciso criar soluções arrojadas. Uma delas é rever as tarifas de transporte, comunicação e energia, unificadas nacionalmente, como se fôssemos um país com as mesmas condições de competitividade. Não somos. A melhor maneira de reduzir distâncias é rever os custos de infraestrutura. Longe é a Ásia e de lá eles entregam seus produtos de forma competitiva. O mesmo se aplica à energia e comunicação.
Hoje, as iniciativas do PPBio, o Programa Prioritário de Bioeconomia da Suframa, a melhor maneira das empresas se conectarem ao processo de diversificação da economia, precisam ser apoiadas. Já temos um cardápio substantivo de produtos da Amazônia gerenciados pelo IDESAM. Adensar e interiorizar o desenvolvimento estão em nossas mãos. Só precisamos da qualificação tecnológica e inovadora, e novos CBAs espalhados por toda a Amazônia.
BAA – Há pouco tempo, num debate virtual sobre Bioeconomia com Denis Minev, da Bemol e Mariano Cenamo, do IDESAM, constatei que você, além de propor a diversificação do Polo Industrial na direção da Bioeconomia, você resolveu empreender nos bioativos da Amazônia. Por onde anda Rebecca Garcia?
R. G. – No momento estou de volta à iniciativa privada, na GBR, onde temos feito investimentos na área de bioeconomia com resultados positivos e produtos no mercado. O nosso principal negócio ainda é a indústria de componentes e produtos eletroeletrônicos, mas sonhamos em transformar/aplicar nossos investimentos na área de bioeconomia, como nosso principal negócio.
E isso devemos a todos os parceiros que fazem parte dessa rede que vão desde os colaboradores da nossa empresa até o programa prioritário como o IDESAM, startups e comunidades fornecedoras de matéria-prima, e aí são tantas as parcerias que é impossível nomear a todas. O IDESAM faz um excelente trabalho e já consolidou um caminho de uma estrada sem fim, promissora, sustentável, justa e viável.
Esta Coluna follow-up é publicada as quartas, quintas e sextas-feiras no Jornal do Commercio do Amazonas, sob a responsabilidade do Centro da Indústria do Estado do Amazonas, com a coordenação editorial de Alfredo Lopes, consultor da entidade e editor do portal BrasilAmazoniaAgora
Rebecca Garcia é economista, empresária no setor eletroeletrônico, ex-superintendente da Suframa e conselheira do Centro da Indústria do Estado do Amazonas (CIEAM).