09/07/2024 08:28
Por Eduardo Cucolo
SÃO PAULO - A Zona Franca de Manaus e cerca de dez cidades da região Norte classificadas como áreas de livre comércio vão se tornar os únicos locais do país com incentivos regionais para os impostos alterados pela reforma tributária a partir de 2033, quando serão extintos os benefícios existentes hoje para os demais estados e municípios.
Um debate que ocorre atualmente no Congresso Nacional vai definir o tamanho desse benefício, o que pode acelerar a migração de empresas de outros estados para o polo de Manaus ou tornar a região menos atrativa do ponto de vista tributário.
Entre os benefícios para compensar o custo mais elevado de se produzir na região estão subsídios às empresas locais, na forma de créditos dos novos tributos, e a manutenção do IPI (Imposto sobre Produtos Industrializados) para produtos fabricados em outras regiões e que concorrem com os da área incentivada, como celulares, aparelhos de ar-condicionado e bicicletas.
Nos dois casos, algumas regras já estão definidas no projeto de lei que regulamenta a reforma, enviado ao Congresso pelo governo em abril, mas as empresas da região avaliam que não há garantia de manutenção dos benefícios nos níveis atuais.
Um dos pontos em aberto é o tamanho do crédito tributário do IBS (Imposto sobre Bens e Serviços), tributo destinado a estados e municípios.
O projeto do governo prevê que o percentual será definido pelo Comitê Gestor desse tributo, formado por representantes de governadores e prefeitos, no caso do valor referente às vendas para o restante do país.
O Cieam (Centro da Indústria do Estado do Amazonas) defende manter o mesmo benefício que já existe no ICMS, um crédito de 55% a 90% a depender do segmento industrial.
"É necessário que se mantenha esse escalonamento", afirma o conselheiro do Cieam e advogado tributarista J. Portela. "Uma norma em branco deixa os investidores da região com uma posição de insegurança jurídica grande."
Um estudo da consultoria da área fiscal e contábil Infis, feito para um cliente do setor de embalagens plásticas, mostra que um crédito no valor de 50% do imposto reduz a vantagem tributária da Zona Franca em relação a São Paulo, estado que não tem hoje incentivo fiscal relevante para esse tipo de empresa.
Se for mantido o subsídio atual de 90% do ICMS para essa companhia, não haverá mudança relevante em relação à situação atual.
Nos dois casos (crédito de 50% ou 90%), haverá aumento da atratividade de Manaus em relação a regiões que hoje oferecem benefícios de ICMS que vão acabar, como é o caso do incentivo de Santa Catarina para esse cliente e vários de seus concorrentes.
"O que a gente está demonstrando é que o componente fiscal passa a ser algo muito mais gritante com a possibilidade de a Zona Franca de Manaus ser o único benefício remanescente [a partir de 2033]", afirma Bruno Menezes, sócio da Infis Consultoria.
Eduardo Pontes, que também é sócio da Infis, afirma que muitas empresas escolhem entre duas opções: estar nos grandes polos industriais, como São Paulo, ou em locais com incentivos fiscais, mas não tão distantes quanto Manaus —que não possui ligação rodoviária com o resto do país.
Com o fim dos benefícios de ICMS, muitos estados devem perder atratividade. Nem mesmo o benefício da Sudene, que prevê redução de Imposto de Renda para áreas do Nordeste, seria suficiente para manter a competitividade.
"Após a transição da reforma, todas as empresas vão olhar para a Zona Franca de Manaus como a opção B", afirma Pontes.
A reforma também prevê um fundo de desenvolvimento para compensar o fim da guerra fiscal, que será bancado com dinheiro da União.
IPI ZERO PARA 95% DO QUE É TRIBUTADO HOJE
Outro benefício para o polo de Manaus está ligado ao IPI, que será zerado a partir de 2027 para todos os bens que não tinham produção na Zona Franca no ano de 2023.
Bens fabricados nessa área na época, mas com alíquota inferior a 6,5%, também terão IPI zero em todo o país. Nesse caso, o governo federal vai dar um crédito de 6% para a empresa instalada em Manaus referente à CBS, a nova contribuição federal sobre bens e serviços, que vai substituir o PIS/Cofins.
Os produtos que possuíam industrialização na Zona Franca e tinham alíquota acima de 6,5% continuam com IPI quando fabricados fora da região. Nesse caso, ainda haverá um crédito de CBS de 2% para as empresas da área incentivada.
Segundo o governo, o IPI será zerado para 95% dos bens tributados atualmente.
As empresas da região pedem que o Congresso inclua na lista também produtos com projetos de produção já aprovados, o que inclui linhas de fabricação em implantação.
Em relação a novos produtos, a proposta do governo diz que empresas que decidirem fabricar bens sem similar nacional na região terão a garantia de que, se surgir um concorrente em outro local do país, ele será taxado com IPI de até 30% por decisão do Executivo.
As empresas pedem que o Congresso permita ao presidente da República tributar empresas que já fabricam um produto no país, se a produção for considerada, por exemplo, aquém das necessidades do mercado nacional.
"Em uma situação como essa, não seria viável, por conta dessa restrição legal que se pretendeu colocar. Isso restringe a competência do governo federal para promover política industrial", afirma Portela, do Cieam.
As demais áreas de livre comércio com benefícios mantidos são Tabatinga (AM), Guajará-Mirim (RO), Boa Vista e Bonfim (RR), Macapá e Santana (AP), Brasiléia, Epitaciolândia e Cruzeiro do Sul (AC). São locais com incentivos criados entre 1989 e 1994.
Fonte: Folha de São Paulo