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​Sobre governança

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23/01/2024 11:06


André Ricardo Costa

Professor da Ufam

Governança é palavra da moda. Sua inicial compõe o acrônimo mais citado no debate público, em que percebo lhe ser atribuído significado com uma simplificação não muito indevida: “Quem e como manda”. Contudo, a literatura de Ciências Sociais Aplicadas oferta a este termo alguns sentidos preciosos para compreender a sociedade atual, e o contexto peculiar da nossa região.

Primeiro, Adolf Berle e Gardiner Means descreveram, em 1932, como a separação entre propriedade e controle é padrão e tendência nas empresas em crescimento. Maior impulso o tema recebeu com Michael Jensen e William Meckling, que publicaram laureado artigo em 1976, e em 1997 Andrei Shleifer e Robert Vishny realizaram um levantamento das principais conclusões das pesquisas que se puseram a analisar os dados econômicos de modo a testar as explicações e prescrições dos primeiros teóricos.

Em suma, governança são os mecanismos criados para assegurar que quem está controlando, ou administrando, um patrimônio o está fazendo conforme os interesses de seu real dono. Esses mecanismos não são triviais e nunca serão o bastante, mas são fundamentais para viabilizar quaisquer empreendimentos em que seja conveniente que o proprietário agencie um administrador. Por isso a contínua necessidade de pesquisar o tema, e os proprietários, cientes dos potenciais conflitos com os administradores, procuram estabelecer os melhores mecanismos de governança.

Os exemplos mais didáticos para compreender o tema governança remetem às histórias da colonização da América, nos séculos seguintes às grandes navegações, empreendimentos com contornos impensáveis para a sociedade atual. Quem hoje daria seu dinheiro para construir um veículo com nova tecnologia para ser manobrado por um condutor com supostas habilidades únicas em direção a um destino conhecido por suposições e lá encontrar algum item raro na terra natal que, trazido ao investidor, o enriqueceria?

Não foram raros os casos, em quase quinhentos anos de domínio europeu sobre América e África, em que os administradores agiram em desacordo com os interesses dos proprietários da colonização, por vezes com graves conflitos. Cortés no México, Nassau no Brasil, Voulet e Chanoine, na África, são alguns exemplos. O mais paradoxal de todos, pelo que recordo, é o do conflito entre o governo lusitano, por meio de seu líder o Marquês de Pombal, e os missionários jesuítas.

Quando se recorda o massacre das missões jesuíticas no Brasil é um pouco difícil de entender por que em Portugal as memórias de Pombal não são tratadas com o máximo desprezo. Ou do ponto de vista brasileiro: Como duas expressões do mesmo povo lusitano guerrearam tão gravemente por estas plagas? Penso em explicação complementar ao recorrentemente citado ateísmo de Pombal. Ele estava a atuar do modo mais diligente, conforme seu entendimento, em prol dos interesses dos então autodeclarados proprietários do Brasil, e alguns de seus compatriotas estavam atuando por interesses diversos. A riqueza das sociedades lideradas pelos jesuítas era imune à voracidade do fisco pombalino.

Pense agora na Amazônia. Quem e como manda nela? Seus recursos devem ser usados conforme os interesses de quem? Seus proprietários estão cientes da apropriação indevida de seus recursos? Quais mecanismos devem ser usados para assegurar o controle sobre seus recursos e até que ponto seus proprietários estão dispostos a arcar com os custos da governança? Que nunca seja por morticínio semelhante ao protagonizado por Pombal. Que não se permita negligência semelhante ao que permitiu a falência de Nassau.

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