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Seca na Amazônia dificulta envio de produtos da Black Friday e ameaça o ‘rô-rô caboclo’; entenda

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03/10/2023 10:41

Por Vinicius Neder

— Rio

02/10/2023 16h41 Atualizado 02/10/2023

A seca histórica na Amazônia, além de encarecer produtos que vêm de fora para algumas das áreas mais remotas do país, ameaça a logística da Zona Franca de Manaus, com destaque para o escoamento da produção de eletrodomésticos, poucas semanas antes da Black Friday, tradicional data de promoções do varejo.

Segundo a Eletros, entidade que reúne os fabricantes de eletrodomésticos, “100% da produção nacional de ar-condicionado, televisores, lavadoras de louça e microondas” vêm da Zona Franca. E algumas empresas relatam reajustes de até 50% no frete.

Operadores logísticos têm orientado seus clientes na região a anteciparem a produção para garantirem o embarque das mercadorias, já que a região depende do transporte fluvial para escoar suas mercadorias e a previsão é de que o nível dos rios no entorno de Manaus fique em situação ainda mais crítica nos próximos meses.

Segundo o Cieam, entidade que representa a indústria do Amazonas, menos de 1% da produção do polo industrial deixa o coração da Floresta Amazônica via área, ou seja, o escoamento passa pelos rios, seja via cabotagem, seja via o “rô-rô caboclo”.

A cabotagem é o transporte marítimo na costa de um mesmo país, enquanto o “rô-rô caboclo” é como se chama na Amazônia o transporte de caminhões em balsas. O nome vem do inglês roll-on/roll-off, como é chamado esse sistema de transporte rodoviário combinado com o hidroviário. Os caminhões percorrem um trecho por estradas, vão sobre balsas pelos rios nas áreas em que não há rodovias, e voltam para o transporte terrestre após desembarcar.

Segundo o Cieam, o “rô-rô caboclo” é muito usado entre Manaus (AM) e Belém (PA), cidades separadas por 1,3 mil quilômetros via aérea. Na porção oriental da Amazônia, a capital paraense tem conexão rodoviária com o Centro-Sul do país, por exemplo, via a BR-010, mais conhecida como Belém-Brasília.

O diretor-executivo da Associação Brasileira de Armadores de Cabotagem (Abac), Luís Fernando Resano, estima que o transporte marítimo para os portos da costa brasileira responda por cerca de 60% da logística do Amazonas. Tanto que o Porto de Manaus é o segundo maior do país em cabotagem, atrás apenas do Porto de Santos.

Todos os anos, o período de seca na Amazônia, entre maio e setembro, considerado o verão da região, atrapalha a logística de mercadorias na região. Sazonalmente, as águas baixam de nível na seca, obrigando as embarcações a navegarem mais leves, ou seja, com menos carga, encarecendo o frete. O problema é que, este ano, a seca está mais severa.

Tanto que a Maersk, gigante global do transporte marítimo que, no Brasil, opera cabotagem com a subsidiária Aliança, tem recomendado a seus clientes na região antecipar os embarques para o restante do país, com vistas à demanda da Black Friday, no fim de novembro.

– Estamos avisando aos clientes: se você tem carga urgente, se você tem coisa para a Black Friday, antecipa a sua produção, porque vamos ter problema em Manaus – disse Karin Schönner, presidente para a Costa Leste da América do Sul da Maersk, completando que muitos já fizeram esse transporte antecipado.

Ainda em agosto, a Aliança começou a publicar comunicados a clientes “sobre cheias e vazantes dos rios na região do Amazonas”. No fim de agosto, a empresa informou que “estamos com o menor nível de água em Manaus nos últimos 10 anos” e anunciou a introdução da “Taxa Temporária de Seca”.

Em setembro, a Aliança elevou o valor dessa taxa e comunicou aos clientes, primeiramente, uma suspensão de reservas e, em seguida, a aceitação de reservas “com restrição”.

– Vai dar B.O. (no escoamento da produção da Zona Franca), pelo que estamos vendo, porque medimos o calado dos canais nos navios – completou Karin.

Segundo Reseno, da Abac, a rapidez com que os rios estão baixando na estiagem deste ano sugere que os impactos na logística também poderão ser mais demorados, continuando até o ano que vem. Os baixos níveis de hoje remetem à seca de 2010, a última a ser tão severa, disse o executivo. O problema é que, nestes últimos 13 anos, aumentaram a movimentação de cargas e, consequentemente, o tamanho das embarcações.

Medidas para mitigar

Reseno cobra medidas para mitigar o baixo nível dos rios, como dragagens emergenciais, a cargo do governo federal, ou aumento da frequência de medições das condições dos leitos, a cargo da Marinha, são importantes. Além disso, as empresas que trabalham com cabotagem deverão também adaptar sua frota, para não interromper os serviços.

– Estamos trazendo navios menores. Se há uma alta demanda, isso não resolve o problema, mas não deixa a região desassistida – afirmou o diretor da Abac.

Segundo Reseno, os navios usados na cabotagem na Amazônia, geralmente, têm capacidade de levar de 3 mil a 4 mil contêineres. As embarcações menores carregam 1,5 mil contêineres. São tão pequenas que não vale a pena continuar o trajeto até os portos do Sudeste e do Sul – a carga costuma trocar de embarcação no Porto de Pecém, no Ceará.

Escoamento garantido por enquanto

Por enquanto, conforme o Cieam, o escoamento da Zona Franca está garantido e os preços de frete estão apenas “ligeiramente” acima do normal para os períodos de seca. Já a Eletros traça um cenário mais preocupante, com empresas “surpreendidas”, pois os fretes subiram de 40% a 50% na estiagem atual.

“Neste momento as operações funcionam normalmente, já que as empresas identificaram há alguns meses a possibilidade de uma seca mais rigorosa e fizeram um estoque ainda maior de insumos. Contudo, caso os rios continuem baixando seus volumes de água na média diária atual de cerca de 30 centímetros, por dia, em algumas semanas teremos o risco maior de limitação de navegação e ajustes nos cronogramas de logística de transporte deveriam ser realizados”, informou a Eletros, por escrito.

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Além da grande participação na fabricação de alguns tipos de eletrodomésticos, como informou a Eletros, a Zona Franca também responde por boa parte da produção de eletrônicos. Conforme a Abinee, associação da indústria do setor, em torno de 30% da produção desses segmentos vêm de lá.

As dificuldades de navegação na região amazônica poderão também atrapalhar o escoamento da produção de grãos do agronegócio. Nos últimos anos, os portos do chamado Arco Norte, tem sido uma importante rota de exportações, especialmente para os produtores do norte de Mato Grosso.

Problema pode chegar às exportações de grãos

A Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA) informou que ainda não tem registro de problemas, mas ressaltou que “a paralisação ou redução das cargas prejudicam a logística do transporte de grãos produzidos no Noroeste do Mato Grosso, que utiliza o corredor da BR-364, sentido Porto Velho e Rio Madeira e produção do Centro do Mato Grosso, que faz uso da BR-163 até Miritituba/PA e transbordo no Rio Tapajós”.

Miritituba e Santarém, no Pará, e Itaqui, no Maranhão, são alguns dos principais portos do Arco Norte, para o escoamento das exportações de grãos.

“Somente no ano passado foram transportados 11 milhões de grãos destinados aos portos do Arco Norte. A paralisação pode significar envio de produtos para os portos do Sul e Sudeste (Santos e Paranaguá) e, consequentemente aumento dos custos logísticos”, disse a CNA, em nota.

Fonte: O Globo

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