09/01/2024 09:08
André Ricardo Costa
Professor da Ufam
O desprezo à pesquisa é uma tradição do Brasil. No Amazonas, não precisa continuar sendo. Em entrevista recente, um jovem empresário local entusiasta da ciência como fonte de valor relatou procurar continuamente as instituições nacionais e grupos de pesquisa mais produtivos em temas amazônicos, para contribuir financeiramente. Só os encontra na região Sudeste.
Cito, do passado e do presente, exemplos do Brasil como um todo e do Amazonas em particular. Uma notável descoberta para a economia brasileira foi a celulose de fibra curta, em pesquisa financiada pela Suzano na Universidade da Flórida na década de 1950. Esta pesquisa permitiu à Suzano e ao Brasil serem a maior empresa e o maior país em produção de celulose. O conhecimento se espalhou e várias outras empresas produtoras de celulose surgiram no Brasil.
Hoje, atenta ao futuro da metalurgia, a Gerdau patrocina pesquisas com nióbio e seu famoso derivado, o grafeno, na Universidade de Manchester. Com sua propriedade de aumento da condutividade elétrica, é desnecessário dizer o quanto esse material é demandado para os carros elétricos. Desnecessário também é recordar que o Amazonas é, neste planeta, o santuário do nióbio, com as autorizações que pulularam para pesquisa em São Gabriel da Cachoeira, fazendo deste município uma das principais fontes das parcas exportações do Amazonas.
Com as devidas salvaguardas ambientais na produção em São Gabriel, o Amazonas pode ser, por meio do nióbio, uma das fontes da descarbonização da economia mundial. O risco é que sejamos meros exportadores de mais esta commodity. Vamos lá, Ufam, UEA e demais institutos, fazer o Amazonas ser líder em beneficiamento e aplicação do nióbio e derivados?
Devido à Lei de Informática, o Amazonas sedia dezenas de institutos de pesquisa. Contudo, o nosso chamado “ecossistema de inovação” tem se limitado a inovações de processos. Ou menos que isso, tem se limitado a preparar as fábricas a serem prontas usuárias dos artefatos industriais mais modernos. Estes artefatos, reunidos pela alcunha “Indústria 4.0”, proferida pelo governo alemão, costumam ser absorvidos pelas indústrias locais em trilhas de maturidade, projetos financiados por recursos da Lei de Informática para garantir que as estruturas locais estejam permanentemente prontas para adotar as tecnologias mais recentes.
Ou seja, nosso ecossistema ainda está longe de produzir a inovação propriamente dita, que é aquela descrita e proposta há décadas por autores como Joseph Schumpeter e Zvi Griliches como a que muda estruturas de mercado, eleva produtividade e leva as pessoas a dedicarem menos salários-hora para satisfazerem suas necessidades. Qual projeto de P&D aprovado pelo Capda mudou o mercado de transportes ou de comunicações?
A raiz deste problema está na omissão da Lei de Informática e seus regulamentos em tratar das estruturas de governança das empresas. Proponho como solução não uma nova lei, mas uma nova estratégia. O que é feito nas fábricas locais quanto à maturidade para aplicar a Indústria 4.0 pode ser replicado para avaliar a maturidade dos nossos institutos de pesquisa, para que eles sejam aptos a praticar a verdadeira inovação. O que falta para que nossos institutos sejam capazes de mudar mercados, seja na área de informática, transporte, alimentos, vestuário, bioeconomia e materiais, entre eles o nióbio?
Com essa nova abordagem, nossos institutos se mostrariam aptos a receber patrocínio de investidores fãs da ciência, e ajudariam nossas empresas a desenhar novos produtos e mudar estruturas de mercado, no Brasil e no mundo.