16/02/2024 10:48
Marco Dassori
É repórter do Jornal do Commercio
Diante das perspectivas de uma estiagem ainda mais rigorosa em 2024, e da constatação de que as empresas estão recorrendo mais ao modal aéreo, as lideranças do PIM buscam prevenir e minimizar prejuízos. A nova linha de frente é o Aeroporto Internacional Eduardo Gomes, e a necessidade de expansão e diversificação no seu segmento de transporte de cargas. O assunto foi debatido na sede do Cieam, na semana passada, entre conselheiros da entidade, operadores logísticos e a Anac (Agência Nacional de Aviação Civil).
Números da Comissão de Logística apontam que os impactos logísticos da seca recorde de 2023 geraram custos extras de pelo menos R$ 1,40 bilhão para o PIM. A entidade ressalta, no entanto, que o valor considera apenas os custos operacionais diretos no trânsito de cargas registrados durante o período em que Manaus ficou sem receber atracamento de navios cargueiros. Não inclui custos financeiros, de eventuais linhas de produção paradas, ou outros passivos indiretos em um período mais longo de tempo.
Diante disso, a busca por alternativas logísticas para garantir o fluxo contínuo de insumos e a distribuição dos manufaturados do PIM tornou-se prioritária. Durante a reunião, foi reforçada a necessidade de ajustes governamentais para atrair mais companhias aéreas e agilizar a autorização de novos voos. O uso do aeroporto de Manaus para abastecer países vizinhos também foi proposto, assim como a criação de um centro de armazenamento e distribuição de cargas em suas dependências. Hoje, tudo o que vem da Ásia e Europa passa por Miami, Guarulhos (SP) e Curitiba (PR), antes de ser distribuído para os Estados.
O coordenador e presidente da Comissão de Logística do Cieam, e professor da Ufam, Augusto Cesar Rocha, frisou que o PIM passa por um “momento muito especial”, em que se elaboram as leis complementares da ZFM, no âmbito da reforma Tributária, e que toda questão relativa a competitividade “inquieta muito” o setor. “O aeroporto pode ser um eixo de desenvolvimento para o Estado, ou um elemento que pode frear esse processo”, alertou.
Conforme o especialista, a expectativa é que o aeroporto adote uma pauta de expansão de cargas e que isso o torne mais competitivo. “Acreditamos que Manaus pode ser um hub para o Norte do Brasil e todo o Norte da América do Sul. Defendemos essa ideia e já discutimos isso com a Infraero e a Suframa. Desde que a Vinci Airports assumiu a gestão do aeroporto, já defendíamos essa visão. A Anac poderia regular melhor para termos mais voos. Há dez anos, tínhamos muito mais do que temos hoje. Há uma redução de cerca de 50% no volume para a região Norte, o que reduz a receita deles. Isso faz com que queiram aumentar seus preços e, dessa forma, a competitividade da indústria é reduzida”, analisou.
Hub e e-commerce
O gerente da Vinci Airports, Thiago Brandão, disse que a empresa está fazendo “um trabalho importante” para trazer novas opções de movimentação de cargas para além do PIM. O aeroporto de Manaus conta com o terceiro maior terminal de cargas do Brasil, logo atrás de Guarulhos (São Paulo/SP) e Viracopos (Campinas/SP), e à frente do Galeão (Rio de Janeiro/RJ). Em 2023, movimentou 120 mil toneladas, sendo 84% de insumos importados da Ásia. Mas o volume sofreu queda de 22% inferior ao do ano anterior.
“Estamos investindo forte na padronização e na construção de uma frente de trabalho. Mas, não só como um terminal de cargas, mas também como um agente de negócios que possa desenvolver a carga em cada região onde os aeroportos estão inseridos”, afiançou. Ele dá como exemplo a possibilidade de tornar Manaus um hub para outros aeroportos administrados pela multinacional, servindo como uma “perna” para Miami (EUA). “Está havendo essa troca para identificar oportunidades para as companhias aéreas”, completou.
O diretor aéreo da Allog Group, René Genofre, disse que o aeroporto de Manaus já teve capacidade aérea de “deixar saudade”, entre 2001 e 2005. Ele concorda que o “mercado carece de voos” e observa que tal situação contribui para que as tarifas aéreas do Sudeste para Manaus igualem o custo de um trajeto São Paulo – Munique (Alemanha).
Genofre aponta que o ano desponta com incremento de 6% na capacidade área global de cargas em relação ao patamar pré-pandemia de 2019. Mas ressalva que boa parte dessa expansão passa ao largo da capital amazonense, e se dá principalmente pelas vendas online e rotas Transpacífico com destino aos EUA. “Enquanto a carga normal retraiu 7%, entre 2022 e 2023, o e-commerce cresceu 40%. E 80% desses voos saem de Shenzhen ou Hong Kong (ambos na China)”, comparou.
O diretor regional de vendas e marketing da Atlas Air para Brasil, Colômbia e Argentina, Luis Del Valle, considera que o mercado da região é promissor, mas concorda que ainda há muito a ser feito. “Temos aviões suficientes para atender ao mercado, e estamos abertos para buscar alternativas. Mas, as condições têm de ser dadas pelo Estado, tanto quanto pelo operador logístico do aeroporto e demais empresas”, sintetizou.
“Menos burocracia”
O gerente de Acompanhamento de Mercado da Anac, Marco Antonio Lopes Porto, ressalta que, entre 2003 e 2022, o modal aéreo aumentou sua participação no transporte estadual de passageiros, de 23% para 73%, em todo o país. Do lado do transporte de cargas, houve acréscimo de 3,4% para o Amazonas, entre 2019 e 2022, seguindo a tendência de outras regiões. Mas, em 2023, foi registrada uma queda de 7,4% no fluxo.
Ele lembra que os parâmetros do mercado mudaram nos últimos 20 anos, após a criação da agência reguladora, com o relaxamento do controle estatal sobre o setor. E conta que a Anac busca atrair novos players criando um “ambiente de negócios favorável”, com liberdade tarifária e de rotas, menos burocracia, regras uniformes, responsabilidade e segurança jurídica. Com isso, espera atrair novas empresas e incentivar a criação de novas rotas, com mais concorrência, qualidade, inovação, passageiros e ofertas.
“A decisão de para onde vai voar e quanto vai cobrar cabe à empresa. A Anac não controla esse tipo de rota e é necessário surgir a demanda. Mas, podem surgir outras formas de atrair as operações das companhias. O governo local pode tornar a operação mais atrativa e o próprio aeroporto pode ter um papel importante nisso. E também podem ser implementadas políticas públicas para incentivar essas operações”, encerrou.
Desafio nas tarifas
Um dos desafios centrais apontados para estimular o tráfego aéreo de cargas em Manaus, e também apontado como “motivo de inconformismo” na indústria, está no aumento das taxas de logística aérea, de armazenamento e capatazia. Foi apontado que as movimentações de mercadorias importadas, por exemplo, sofreram aumento de 1.040,34%, passando de R$ 0,0771 por quilograma para R$ 0,8792.
A Vinci Airports informou que está promovendo consultas públicas para esclarecer a nova formação de preços dos serviços aeroportuários de carga. Conforme o presidente da Cieam, Lúcio Flávio Morais de Oliveira, o próximo passo será a execução de ações coordenadas entre entidades públicas e privadas para consolidar o Aeroporto Internacional Eduardo Gomes como player estratégico na movimentação de cargas na América do Sul.