09/02/2018
Notícia publicada pelo site Valor Econômico
O governo pretende anunciar, na
primeira quinzena de março, um plano
que buscará acelerar a migração de
empresas ao modelo de "indústria 4.0"
no país. A intenção é disseminar o uso de
tecnologias avançadas como inteligência
artificial, impressões 3D, computação em
nuvem e internet das coisas (chips
embarcados em produtos) no chão de
fábrica.
Pelo menos cinco setores devem ser contemplados inicialmente:
agronegócios, automotivo, têxtil, defesa e saúde (equipamentos médicos).
Novas linhas de financiamento estão sendo estudadas pelo governo com
bancos públicos para estimular mudanças nos processos produtivos.
"Em um primeiro momento, teremos que priorizar. E a prioridade serão os
setores em que o Brasil já demonstra capacidade de liderança global", afirma
o presidente da Agência Brasileira de Desenvolvimento Industrial (ABDI),
Guto Ferreira, um dos responsáveis pela estruturação do plano. Ele faz uma
ressalva: a definição dos setores ainda não está completamente fechada e
caberá ao Ministério da Indústria, Comércio Exterior e Serviços (Mdic).
Ferreira antecipa que haverá requisitos claros às empresas interessadas em
obter crédito para implantar conceitos da indústria 4.0. Elas deverão ser
submetidas a "testes de maturidade" apontando o grau de desenvolvimento
tecnológico em que se encontram atualmente. A realização dos testes ficará
por conta das próprias companhias, mas uma parte delas poderá ser bancada
pela ABDI. A agência, alimentada por recursos do Sistema S, pretende alocar
R$ 5 milhões para isso e publicará editais de seleção.
Estudos preliminares conduzidos pelo governo para a elaboração do novo
plano indicam que entre 2% e 5% das fábricas brasileiras adotam conceitos
da indústria 4.0. Eliminando erros humanos e aumentando a produtividade,
podese obter uma economia de R$ 73 bilhões ao ano no setor apenas com
eficiência energética, segundo projeções. "É uma transformação completa
nos processos produtivos", afirma Ferreira.
O plano deve ser lançada durante a edição latinoamericana do Fórum
Econômico Mundial, que ocorre nos dias 13 a 15 de março, em São Paulo.
Não foi uma escolha aleatória. Em seus encontros anuais, na cidadezinha
alpina de Davos, o fórum tem sido um dos principais catalisadores de
discussões sobre as mudanças trazidas pela chegada da quarta revolução
industrial e o suíço Klaus Schwab fundador da organização converteuse
em um dos grandes pensadores internacionais sobre o tema.
Os alertas são preocupantes para quem não estiver devidamente preparado.
No período de cinco anos compreendido entre 2016 e 2020, o fórum prevê
uma perda líquida de cinco milhões de empregos no planeta com a
automação gerada pela indústria 4.0. O Brasil figura ao lado de África do Sul,
da Itália e do Sudeste Asiático na lista de países e regiões em que se projeta
um impacto predominantemente negativo no mercado de trabalho
O retrato atual já desperta inquietações. Uma pesquisa da consultoria
Deloitte, que ouviu 1.603 executivos no mundo e 102 especificamente no
Brasil, sugere que essas inovações ainda podem estar distantes. Em uma das
perguntas feitas, apenas 29% dos líderes empresariais brasileiros dizem estar
utilizando "tecnologias de ponta" para possibilitar que seus funcionários
sejam mais eficientes. A média global é de 47%.
Outras respostas do questionário mostram uma discrepância entre a
percepção dos executivos no Brasil e no exterior. Por aqui, 49% acreditam
que as habilidades exigidas de seus profissionais vão evoluir muito mais
rapidamente. Lá fora, são 56%.
Em contrapartida, 98% dos brasileiros avaliam que estão fazendo tudo
possível para adequar sua força de trabalho às necessidades da quarta
revolução industrial. A média global é 86%.
Para Ronaldo Fragoso, sóciolíder na Deloitte, há um "descolamento" das
percepções sobre indústria 4.0 no Brasil e nos demais países. Muitos, por
exemplo, devem se convencer de já estarem no caminho adequado por
desconhecimento de todas as oportunidades dessas novas tecnologias.
Em meio ao temor de desemprego e de instabilidade com essas mudanças,
Fragoso destaca o fato de 93% dos entrevistados brasileiros manifestam
otimismo e veem impactos positivos.
Na avaliação dele, a indústria brasileira vinha tendo poucas chances de
pensar sobre incorporação das novas tecnologias e modernização dos
processos por causa das dificuldades econômicas. "Era difícil fazer
investimentos para acelerar essa transição [à indústria 4.0] com dois ou três
anos de recessão. Agora, com a melhoria do ambiente econômico, isso volta à
pauta das empresas", observa.
A melhor contribuição do governo, diz Fragoso, é se empenhar na oferta de
infraestrutura adequada (como telecomunicações de qualidade e terminais
portuários e aeroportuários).