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Coragem para agir

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18/03/2020

Márcio Holland*

Tem sido péssima a gestão da crise de saúde pública devido ao surto do coronavírus, bem como de suas

consequências sobre a vida social e econômica. Falta coordenação entre os três poderes da República, entre os entes federados e destes com a

sociedade civil organizada, incluindo a sociedade médica. Falta liderança. Falta coordenação. Falta ação.

As autoridades econômicas do Brasil erram sucessivamente em seus diagnósticos e, por isso, apresentam medidas tímidas.

Ben Bernanke, ex-presidente do Banco Central dos Estados Unidos, o poderoso Federal Reserve, em seu

livro “Coragem para agir”, escreve, logo na sua primeira frase do livro, o seguinte: “Em todas as crises, há aqueles que agem e há aqueles que têm medo de agir”. Em situações de estresse social e econômico não se

pode adiar decisões. Mais importante de tudo é poupar vidas e sofrimentos com a doença do coronavírus, a Covid-19. Fato a destacar para essa coluna de economia é que quanto mais rapidamente limitar o contágio

do novo vírus, mais rapidamente a economia e a sociedade voltam à normalidade.

O diagnóstico é simples. A Covid-19 provocou um “choque de oferta”, ou seja, uma interrupção abrupta na cadeia de suprimentos globais, nos fluxos de comércio internacional e nos fluxos de investimentos estrangeiros. As medidas de isolamento social, tomadas por autoridades de diversos países, expõem a gravidade do que estamos enfrentando, e mexe com o humor dos mercados financeiros, com a confiança de consumidores e de empresas. Com isso, tem-se um “choque de demanda”.

Em vários setores da economia, o problema mais importante deixa de ser a falta de componentes, partes e peças, insumos intermediários, entre outros, e passa a ser de falta de consumidores.

O setor de serviços, em especial, de turismo e de transportes aéreos, são as pontas deste iceberg. Vem à deriva setores de entretenimentos (cinemas, teatros, eventos culturais diversos), bares e restaurantes, e uma cadeia de segmentos associados. Não hádúvida de que, mesmo em regiões onde não há medida de isolamento social imposta por autoridades, muitos consumidores estão postergando a compra de carros, eletrodomésticos, roupas, itens de beleza, e mesmo de imóveis.

De acordo com médicos especialistas, o isolamento coletivo é a melhor medida para a desaceleração do

contágio do novo vírus. Os primeiros países impactados pelo Covid-19 nos deram essa lição.

Dado isso, como agir no campo econômico? O que as autoridades econômicas devem fazer? Quais medidas econômicas devem ser anunciadas e adotadas?

Primeiro, dada as características nada usuais do choque, é preciso coordenação de ações entre as

autoridades de todo país, de todos os poderes e esferas públicas. Urge instituir um estado de bem-estar social. Não vimos isso, mesmo após mais de dois meses de crise mundial com a pandemia. Não há coordenação de ações. Governadores e prefeitos de grandes cidades estão perdidos. Poder executivo da União sem norte algum. O Brasil está à deriva deste choque.

Manifestações da equipe econômica destoam da realidade dos fatos. Para seus membros, seguir a agenda de reformas econômica é a melhor medida. Contudo, neste momento, e dadas as circunstâncias atípicas, não é a aprovação da reforma tributária ou administrativa, nem privatizações das estatais, nem abertura econômica, que irá reacender o ânimo do espírito animal empreendedor. Os investidores estão prostrados, sem direção. Neste contexto de caos global, sob risco de recessão global, ninguém vai investir mais aqui porque o Brasil segue sua agenda de reformas econômicas. Antes deste surto, não se sabia sequer qual era a proposta do governo para a reforma tributária. Por que agora essa seria a prioridade?

Não é hora para ideologias econômicas; não é questão de negação ao liberalismo. Nem é momento para ativarmos o voluntarismo intervencionista e jogar dinheiro de helicóptero. Mas, é tempo para agir. Não ter medo de agir. Está claro que, quanto mais rapidamente o contágio da doença Covid-19 for desacelerado, mas rapidamente voltamos à normalidade da vida econômica e social.

O Ministério da Economia anunciou, no último dia 16 de março, medidas na direção correta, mas tímidas.

Contrariando às últimas declarações do seu Presidente, o BNDES terá sim que anunciar medidas contracíclicas, assim como outros bancos públicos. Os bancos privados brasileiros devem ganhar mais dinheiro com a crise provocada pelo novo vírus, com o anúncio oportunista de adiamento de pagamento de dívidas, pagando-se, claro, as nossas exorbitantes taxas de juros. Quanto mais tempo se demora para pagar dívidas no sistema bancário brasileiro, mais cara é a conta para o cliente. Não era esperada atitude diferente deste absurdamente concentrado sistema bancário nacional.

É tempo de agir. É preciso coragem para agir. Antecipar pagamentos de benefícios sociais como o abono salarial, em regra de diferimento, reforçar o programa de seguro-desemprego - nosso autêntico “estabilizador automático -, pagar adicional debolsa-família para os beneficiários do programa comprarem medicamentos - e ampliar rapidamente o programa -, liberar parcela de recursos do FGTS, etc, são medidas emergenciais importantes, mas de curto fôlego.

É preciso apoio para as empresas não demitirem. Muitas podem anunciar férias coletivas e irão necessitar de recursos para capital de giro. Poderá ser preciso um programa para adiamento de pagamento de tributos para micro, pequenas e médias empresas, linha de crédito para capital de giro a taxa de juros zero para empresas em geral, linha de crédito a taxa de juros zero para aquisições de equipamentos hospitalares e medicamentos, além de abertura para suas importações sem qualquer tributo, etc.

Na política monetária, não há criatividade. O Copom não pode hesitar e deveria derrubar a taxa de juros Selic- meta para um intervalo entre 0% e 1,0% ao ano, temporariamente, até que o contágio da nova doença perca força. Redução gradual na taxa Selic seria para situação de choque mais suave e mais prolongado.

Tudo indica que estamos diante de um choque agudo e de curta duração, mas de impactos severos sobre vidas, economia e finanças.

Em síntese, valem as lições da Grande Depressão de 1929, ou da Grande Recessão de 2008.

Parafraseando

Ben Bernanke, estamos confrontando com um fenômeno extraordinário que exige pensar fora da caixa, negando o mainstream econômico, se necessário.


(*) Márcio Holland é professor na Escola de Economia de São Paulo da FGV e escreve artigos para o Broadcast quinzenalmente às quartas-feiras.

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