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De cócoras para a Amazônia – parte I

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17/08/2022 08:57

E pensar que, depois de 15 mil anos de presença na Amazônia, os indígenas criaram soluções farmacológicas para quase tudo. Que tesouro inesgotável. Por que não investigar o poder dessas propriedades? Aqui só não temos remédio para cegueira atávica, ou surdez conveniente.

Por Alfredo Lopes – Coluna Follow-up

Temos insistido na afirmação de que o Brasil segue historicamente de cócoras para a Amazônia. Trata-se de uma posição de observação e relaxamento, muito comum ao postural dos diversos grupos indígenas do Vale Amazônico. Os fisioterapeutas descobriram que esta posição recupera a mobilidade perdida e tem o poder de equilibrar a musculatura lombar. Ficar de cócoras é recomendado para alívio do nervo ciático e das dores da região lombar. Mas também é traduzido popularmente como o ato de estar defecando em detrimento de alguém. Ou para traduzir a importância que este alguém representa. E em qual sentido dizemos que o Brasil está de cócoras em relação à Amazônia? Vamos contar uma história com agá para ilustrar.

O episódio a seguir traduz nossa insistência em definir o formato escrachado dessa relação do país com relação à Amazônia. Vamos lá: Vita Derm é uma empresa brasileira de cosméticos hipoalergênicos, muito frequentada e respeitada por sua trajetória obstinada e pela qualidade de sua entrega. Sua linha de cosméticos para a Quarta Idade deu muito o que falar.

Já esteve na Amazônia, há mais de uma década, à procura de novos negócios a partir da biodiversidade florestal. Afinal, temos o maior banco de germoplasma da Terra e – desde Charles Darwin e Alfred Russel, botânicos ingleses do século XIX que elaboraram sistemas de interpretação genética na região – a Ciência afirma que aqui habita a senha genômica da evolução e perenização da reprodução celular. Quem conquistar e patentear a reprodução incessante das células terá descoberto a fonte da eterna juventude, entre outras façanhas. A empresa, entretanto, recebeu pesadas multas por ter, publicamente, testado alguns ensaios com princípios ativos da floresta, antes de se submeter a uma burocracia feita para ninguém esmiuçar. Entediado e desencantado, juntou seus pertences e foi embora.

Há seis anos, entretanto, atendeu a provocação de usar novamente matéria-prima florestal da Amazônia – dessa vez, extraída de programa de reflorestamento da Fazenda Aruanã, de Itacoatiara-AM, que substituiu pecuária por cultivo extensivo de castanheiras. A Vita Derm, então, topou repetir alguns ensaios com óleo de castanha-do-Brasil, ou do Pará, como queiram, e os apresentou à Comissão de Agroindústria do CIESP, Centro da Indústria do Estado de São Paulo. Foram 12 protótipos de produtos à base do óleo da Bertholetia excelsa, a mais sagrada das espécies da Amazônia. Por que a burocracia federal veta o PPB de cosméticos para a Amazônia?

As mesmas biomoléculas da composição – segundo pesquisadores do CBA, Centro de Bionegócios da Amazônia, em visita à Fazenda no ano seguinte – foram encontradas nos resíduos da castanha, resultantes do beneficiamento e distribuição dos frutos. Portanto, não precisaria da abrir mão do consumo alimentar da amêndoa para empinar um programa diversificado de produtos dermocosméticos. Com tecnologia e inovação, essa empresa, ou qualquer outra com este perfil, estaria apta a diversificar a produção no polo industrial de Manaus na direção do mercado. Politicamente correto, economicamente viável, socialmente justo e ambientalmente sustentável, como dizia o amazonólogo Samuel Benchimol. E o que faltou, senão o empurrão do fomento que faz decolar bons projetos em qualquer parte do mundo? Um de seus netos, Denis Benchimol Minev, insiste em afirmar que o Brasil precisa assumir a Amazônia, no sentido da adoção e do comprometimento.

E por que isso não acontece? Ora, para autorizar uma empresa a cumprir este ritual produtivo a liturgia burocrática começa por Brasília. Aí residem os “especialistas” em Amazônia que decidem o que pode e o que não pode ser fabricado em Manaus, onde existem apenas 0,6% dos estabelecimentos industriais do país. O desafio é licenciar o PPB, o processo produtivo básico. A lista é restrita e muitas vezes decidida em desfavor da região porque outras empresas, fortemente amparadas por lobbies poderosos, não podem ser ameaçadas em seus privilégios.

Um dos maiores produtores mundiais de medicamentos sólidos/genéricos, hoje em operação em Manaus, esperou cinco anos para licenciar seu projeto industrial com o PPB. Trata-se de uma das cinco maiores e mais modernas fábricas de remédios do setor no mundo. A Novamed é a primeira e única empresa a produzir medicamentos na história do Polo Industrial da Zona Franca de Manaus. E pensar que, depois de 15 mil anos de presença na Amazônia, os indígenas tem soluções farmacológicas para quase tudo. Que tesouro inesgotável. Por que não investigar o poder dessas propriedades? Aqui só não temos remédio para cegueira atávica, ou surdez conveniente. Voltaremos…

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