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Um país quebrado tem saídas?

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17/08/2018

Reportagem publicada pelo site Uol Notícias

Não faltam desafios para quem ganhar as eleições presidenciais deste ano e for assumir o Palácio do Planalto a partir de janeiro de 2019: combater a corrupção, recuperar a credibilidade do governo, fazer o país voltar a crescer, gerar empregos, equilibrar as contas públicas, recuperar capacidade de investimento do Estado e de atração dos investimentos privados, reforçar a saúde pública, melhorar a educação, a segurança pública, o transporte urbano, as rodovias, construir trilhos...


Mas, na prática, o que fazer, como fazer e o que fazer primeiro para tirar o país do buraco?

Para responder a esta questão, o UOL entrevistou representantes de 15 confederações e associações empresariais, entidades de classe, centrais sindicais e conselheiros de grandes empresas: o que eles precisam do novo presidente para ajudar o Brasil a sair da crise?

Algumas medidas necessárias são consenso, outras geram controvérsia e outras, ainda, opõe diametralmente grupos econômicos distintos da sociedade brasileira. Setores diferentes têm necessidades distintas, e muitas vezes essas são inconciliáveis. Não vai dar para agradar todo mundo o tempo todo. O que fazer?

Mãos às obras

Para sair da crise, o Brasil precisa de obras: infraestrutura de transportes inter-regional (ferrovias, rodovias e hidrovias), habitação, saneamento básico, metrô, trens e obras viárias urbanas, silos de armazenagem, novos e melhores portos, aeroportos.

"O Brasil é uma das poucas grandes economias do mundo onde ainda está tudo por fazer em matéria de infraestrutura", diz Bruno Batista, diretor-executivo da CNT (Confederação Nacional dos Transportes). "Na Europa, EUA, China e Japão, já está tudo construído. A fronteira da construção civil hoje é o Brasil."

Para exemplificar a situação, Batista faz uma comparação: em 2015, ele conta que a cidade de Xangai, na China, já possuía 588 quilômetros em linhas de metrô, e esse número tem subido desde então. Hoje a cidade de São Paulo, o lugar onde mais tem metrô no Brasil, conta com algo em torno dos 90 quilômetros (previsão do governo de SP para até o fim do ano).

"Trabalho a ser feito, empresas e trabalhadores não faltam", diz. "Precisamos de uma política de Estado para a infraestrutura, um planejamento para os próximos 20 anos, e não uma política de governo, que é descontinuada. Perde-se cada vez mais tempo e nossa situação é cada vez mais grave."

Emprego e qualificação

De acordo com dados do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), em 2016 o Brasil fechou 4.000 empresas de construção civil, com 429 mil postos de trabalho perdidos. Os números do setor sobre 2017 ainda não estão consolidados, mas a tendência é de nova queda nesse mercado.

Em 2015 e 2016, a retração em número de empregos no setor foi de cerca de 15% ao ano. É muita coisa, e parte expressiva do desemprego está aqui. As seis maiores empreiteiras do Brasil -- Odebrecht, Andrade Gutierrez, Camargo Corrêa, Queiroz Galvão, Mendes Júnior e Constran (da UTC), todas envolvidas na Operação Lava Jato -- tiveram suas receitas reduzidas a um quarto desde 2015. Somadas, encolheram R$ 55 bilhões em faturamento. Só nessas seis empresas, são cerca de 200 mil postos de trabalho a menos no mesmo período.

"A construção civil é o único setor que é intensivo sobre a mão de obra, capaz de contratar uma grande quantidade de pessoas rapidamente, mesmo desqualificada, e ir qualificando ao longo do serviço", afirma José Elias Hiss, presidente da Apemec (Associação de Pequenas e Médias Empresas de Construção Civil do Estado de São Paulo). "Nenhum outro setor tem capacidade de animar a economia tão rápido com tanta força."

"A empresa com contrato é a empresa que contrata. Empregado, o trabalhador por sua vez gasta com suas demandas pessoais e familiares, esse gasto movimenta o comércio, por exemplo... É isso que põe a economia para girar", afirma Hiss.

Vagner Freitas de Moraes, presidente da CUT (Central Única dos Trabalhadores), concorda. "Esse trabalhador fora do mercado de trabalho também está fora do mercado interno, não consome, não arrecada e alimenta a crise", argumenta.

De acordo com a CNT, só na área dos transportes existem 2.043 projetos de integração nacional e dentro de áreas urbanas que resolveriam o problema de transporte de passageiros e cargas no Brasil, a um custo de R$ 1 trilhão. "É um valor alto, mas ele só aumenta a cada ano que passa. É o resultado de décadas de desinvestimento em infraestrutura", afirma o presidente da CNT.

Obras paradas

Além das obras por fazer, o Brasil é pródigo em canteiros de obras parados. Segundo levantamento da CNI (Confederação Nacional da Indústria), existem hoje no país 2.796 obras públicas paradas. Destas, pelo menos 400 são de saneamento básico -- de acordo com o IBGE, mais de 60% dos brasileiros não contam com esgoto e água encanada em casa.

"Obra parada é obra cara, além de atrasada", afirma o presidente da Apemec. "É urgente terminar de fazer o que foi iniciado. Só aí nesse pacote tem trabalho para dar uma chacoalhada no desemprego e forçar uma recuperação econômica mais firme."

De onde vai sair o dinheiro para isso tudo? Essa é uma outra história, sobre a qual não há consenso (leia mais abaixo).

Na sala de aula, Brasil está ficando para trás

Entra ano sai ano, diversos indicadores internacionais e domésticos demonstram que a educação no Brasil vai mal. Tanto na esfera pública como na privada, os alunos brasileiros em média saem-se pior mesmo que estudantes de países mais pobres do que o nosso. O drama repete-se em todos os níveis. Do Ensino Fundamental ao Ensino Superior, o estudante brasileiro é mal formado.

"Nossa mão de obra é fraca e mal qualificada, em todos os níveis e em quase todos os setores", afirma José Augusto Fernandes, diretor de Políticas e Estratégia da CNI (Confederação Nacional da Indústria). "Sem educação de qualidade, o país não vai dar certo, simples assim. Essa deficiência mina nossa competitividade, o trabalhador brasileiro não rende igual o estrangeiro."

Isso fica claro nas avaliações internacionais. O Pisa -- principal instrumento usado para comparar o ensino de diversos países -- mostrou que 61% dos brasileiros não termina a primeira parte da prova aplicada na avaliação. Muito acima do índice de colombianos que não termina a primeira etapa, de 18%, por exemplo.

O Pisa de 2015, a edição mais recente, avaliou jovens de 15 e 16 anos em 70 países, abordando matemática, leitura e ciências. A média geral deixa o Brasil nas últimas posições: fica na 63ª posição em matemática, 58ª em leitura e 65ª em ciências. Organizado pela OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico), uma entidade que reúne países desenvolvidos, o exame ocorre a cada três anos e serve como referência para políticas públicas.

"Investir em Educação é investir no crescimento econômico, na competitividade e no emprego de longo prazo, além da qualidade de vida do trabalhador e da população", concorda Vagner Freitas de Moraes, presidente da CUT (Central Única dos Trabalhadores).

"Hoje é possível ter aula no melhor laboratório, com o melhor professor na melhor universidade do país à distância, para um sem número de alunos pelo computador, tablet, celular... isso é revolucionário e não estamos aproveitando", afirma José Roriz Coelho, presidente da Fiesp (Federação das Indústrias do Estado de São Paulo). "Temos de otimizar os recursos disponíveis, esse é um exemplo claro de como fazer isso."

"Falta muita eficiência. Hoje, o Estado brasileiro está cerca de 30% defasado em relação à iniciativa privada do país em termos de tecnologia e processos, boas práticas de gestão. Falta tecnologia para o governo, e na área da educação isso fica claro. O país que não investe em educação de qualidade está fadado a fracassar."

O custo da (falta) de segurança pública

Geralmente associada no noticiário às grandes regiões metropolitanas de Norte à Sul, o problema da (falta de) segurança pública no Brasil assola também cidades pequenas, o campo e as rodovias país afora. Além de ninguém estar de fato seguro, a situação custa caro, constituindo-se em mais um entrave para o crescimento econômico continuado.

Nos últimos 20 anos, o Brasil teve um prejuízo de R$ 450 bilhões devido ao elevado número de homicídios. Temos 17 cidades no ranking das 50 áreas urbanas mais violentas do mundo, mas fora das cidades -- e dos holofotes em geral -- o problema também está fora de controle causando muitas perdas, inclusive para a economia.

"Antes até da questão da infraestrutura inadequada -- o Brasil tem apenas 12,3% das suas rodovias pavimentadas -- o transportador de carga hoje precisa de segurança para trabalhar", diz Diumar Deléo da Cunha Bueno, presidente da CNTA (Confederação Nacional dos Transportadores Autônomos).

"Estamos muito carentes nesse aspecto. Ser caminhoneiro sempre foi uma profissão de risco, por causa dos acidentes, e agora é mais ainda por causa dos assaltos. No início do ano, fomos a um evento da PRF [Polícia Rodoviária Federal] em Brasília, onde apresentaram um panorama explicando que faltam pelo menos 2.000 homens nos quadros da corporação", diz o sindicalista.

De acordo com pesquisa do Instituto Brasileiro de Ética Concorrencial e do Fórum Nacional de Combate à Pirataria e à Ilegalidade, em 2017 o roubo de cargas custou R$ 1,5 bilhão em todo o país. "Não existe nenhuma ação específica para combater isso, a PRF e as PMs dividem a atenção desse problema com acidentes e todo o tipo de ocorrência nas estradas. Então eu pediria para o novo presidente focar na questão da segurança. Isso é para já", afirma Bueno.

"Não dá para morar na fazenda: é muito perigoso"

"Hoje o produtor não consegue deixar trator, equipamento, insumos e nem a produção na fazenda, tem que ficar tudo em depósito nas cidades", afirma Marcelo Vieira, presidente da SRB (Sociedade Rural Brasileira). "Hoje não dá mais nem para o produtor morar na fazenda que está muito perigoso", diz ele, que produz café no sul de Minas Gerais e já foi assaltado na propriedade rural mais de uma vez.

"Na última, invadiram pelos fundos cortando a cerca, renderam quem estava lá, entraram com um caminhão, carregaram e roubaram 150 sacas de café torrado para exportação. Eu não tinha conseguido levar toda a produção para o armazém na cidade, que já estava cheio, e perdi", diz Vieira.

"Na última, invadiram pelos fundos cortando a cerca, renderam quem estava lá, entraram com um caminhão, carregaram e roubaram 150 sacas de café torrado para exportação. Eu não tinha conseguido levar toda a produção para o armazém na cidade, que já estava cheio, e perdi", diz Vieira.

"Fizemos um encontro nacional, e depois de dois dias chegamos à conclusão que este é o pior problema, dentre tantos, que o produtor rural enfrenta hoje no Brasil", afirma o presidente da SRB.

Juros nas alturas: "Ninguém aguenta mais isso no Brasil"

No Brasil, até representantes dos setores bancário e financeiro concordam que os juros são demais, altíssimos, e um grave problema estrutural da nossa economia. Os juros são elevados tanto para as empresas que pegam emprestado para investir quanto para os consumidores que pegam emprestado para comprar as coisas. Quem já parou para comparar o preço de um mesmo carro à vista ou parcelado (na prática, um empréstimo) sabe bem do que os economistas estão falando.

Os motivos apontados pelos especialistas são vários: falta de concorrência (são poucas opções de banco no Brasil), direcionamento do crédito para setores específicos, inadimplência alta e baixa recuperação de garantias nos empréstimos tomados por empresas e cidadãos, regras rígidas demais como os depósitos compulsórios do Banco Central, taxa básica de juros da economia (chamada de Selic, hoje em 6,5%) em média elevada e inconstante, notas baixas na classificação de risco feita por agências internacionais tanto do governo quanto de empresas, dentre outras razões.

"É importante trabalhar para a redução da elevada concentração bancária", afirma Everton Pinheiro de Souza Gonçalves, superintendente da Assessoria Econômica da ABBC (Associação Brasileira de Bancos). Para ele, uma maior competição no setor é o caminho natural para a queda dos juros no Brasil.

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